Título: Custo mais alto com folha de pagamento derruba lucro da ECT
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2008, Empresas & Tecnologia, p. B6

A greve dos Correios, que paralisou seus serviços por três semanas em julho e deixou cerca de 130 milhões de entregas em atraso, derrubou o resultado da estatal. O lucro operacional, que havia alcançado R$ 329 milhões no ano passado, cairá para menos de R$ 50 milhões em 2008. Apesar de manter-se na liderança, a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) perdeu clientes corporativos que, insatisfeitos com a paralisação, fecharam contratos com concorrentes para a distribuição expressa de correspondências. Ruy Baron/Valor Custódio, da ECT, planeja entrar em marketing direto e na venda de eletrodomésticos para não ter prejuízo em 2009

Para encerrar a greve, a estatal aceitou pagar adicional de 30% de risco ao salário de 43 mil carteiros, além de um benefício de R$ 260 a 16 mil funcionários. "A folha de pagamento aumentou R$ 380 milhões, perdemos negócios e a concorrência aproveitou para fechar contratos de seis meses ou mais no mercado corporativo", lamenta o presidente da ECT, Carlos Henrique Almeida Custódio. Animados com o desfecho da paralisação em julho, os funcionários agora cobram a reposição das perdas salariais desde 1994. A estatal oferece 6,23% - equivalente à inflação dos últimos 12 meses - e as negociações se arrastam há mais de um mês.

A queda-de-braço com os sindicatos não tem sido a única dor de cabeça recente. Desde dezembro de 2006, os Correios estão sem publicidade. No ano passado, as três licitações para contratar novas agências geraram tanta polêmica que uma delas foi cancelada e a outra aguarda decisão dos tribunais, após recursos judiciais dos perdedores. Só uma das licitações foi inteiramente concluída. O contrato, de R$ 45 milhões por um ano (prorrogável por outros cinco), será assinado nos próximos 15 dias com a Artplan. A agência de Roberto Medina se encarregará da publicidade - em todas as mídias - que envolve os serviços de Sedex. Mas a propaganda institucional dos Correios continuará congelada.

Diante dos problemas imediatos e dos desafios impostos pelas constantes inovações tecnológicas que ameaçam a atividade dos Correios, não é a crise internacional que vem preocupando Custódio. Em 2008, o faturamento deve chegar a R$ 11 bilhões - com crescimento de 13% sobre o ano passado. "O ano de 2009 depende muito da estratégia que adotarmos para atacar novos nichos de mercado. Se não trouxermos novidades para enfrentar tudo o que aparece em termos de tecnologia, vamos caminhar para um prejuízo operacional", diz.

O Exporta Fácil, serviço para o envio de exportações de micro e pequenas empresas que inclui todo os procedimentos de desembaraço aduaneiro, teve o limite recém-ampliado de US$ 20 mil para US$ 50 mil. Isso abre espaço para o aumento de negócios, bem como a idéia de entrar no segmento de marketing direto: a montagem de um grande gerenciador de dados para a venda de informações a grandes empresas, que poderão usar o banco para serviços de mala-direta.

Esse plano, ainda em gestação, não requer mudança no estatuto dos Correios, diz Custódio. Mas o presidente aponta a necessidade de projetos de lei específicos para permitir a exploração de outros negócios. Um deles é a abertura de negociações com pelo menos uma grande rede varejista, no ano que vem, para a venda de eletrodomésticos por catálogo nas agências da ECT. "Temos 6 mil pontos espalhados por todo o país. Isso pode nos tornar braço-direito de uma grande rede para a venda de eletrodomésticos. Já é algo que existe em vários lugares do mundo", afirma.

Custódio também levou ao conselho de administração um plano de internacionalização. Como ocorreu recentemente com a Eletrobrás, que ganhou o direito de atuar no exterior, é preciso obter o aval do Congresso para isso. A idéia é entrar em mercados com concentração de imigrantes brasileiros - Estados Unidos, Portugal, Japão e Argentina - e oferecer serviços de encomendas expressas.

"Como as empresas estrangeiras no Brasil, queremos buscar os segmentos lucrativos", diz Custódio. Ele lembra que os Correios fazem muitas entregas de Sedex aos residentes brasileiros no exterior, mas não oferecem o caminho de volta. Para remeter algo às suas famílias no Brasil, os imigrantes recorrem a empresas locais, embora a ECT acredite que tenha tudo para ganhar a preferência dos brasileiros caso abra escritórios lá fora.

Mas convém olhar os planos com cuidado. Projetos elaborados no passado recente não foram adiante por falta de disposição política. Foi o caso da criação de uma companhia aérea de carga para dar mais agilidade às entregas e mais liberdade à ECT em relação às empresas atuais. E da renegociação do contrato com o Bradesco para o Banco Postal, contestado publicamente em 2007 pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa.

Costa ameaçou o Bradesco com a ruptura do contrato se não houvesse repactuação do acordo até o fim do ano passado. As negociações não avançaram, mas a ameaça não foi cumprida. A ECT afirma que tem retorno de R$ 15 milhões por mês com o Banco Postal, muito abaixo do potencial de negócios, e já tem estudos internos que apontam o valor mínimo de R$ 2 bilhões para uma nova licitação.