Título: Fazenda considera nociva nova alta dos juros
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2008, Finanças, p. C2

Insistir com o aperto monetário, levando a taxa Selic além dos 13,75% ao ano, significa potencializar o efeito da forte restrição de liquidez que o mercado já está enfrentando atualmente, segundo avaliação feita pela equipe econômica do Ministério da Fazenda nas discussões com os diretores do Banco Central, revelando a permanência do conflito na equipe econômica. O vigor do mercado interno foi citado várias vezes pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, como uma das vantagens do país nessas fortes turbulências.

Para manter essa qualidade, governo e BC já tomaram algumas medidas. Parte das reservas de mais de US$ 200 bilhões poderá ser usada para irrigar a demanda por crédito agrícola e de exportadores. Na sexta-feira, Mantega defendeu "criatividade" no uso dos recursos.

Menos de 20 dias atrás, a última ata do Comitê de Política Monetária (Copom) deixou claro que o processo de elevação da taxa Selic ainda não estava concluído porque não havia nítida redução do descompasso entre a velocidade de expansão da demanda e o ritmo de crescimento da oferta. Agora, depois da "montanha-russa" vivida pelas bolsas a mensagem da ata, na avaliação do governo, perdeu importância face à brusca deterioração da crise. Além disso, no Brasil, a inflação deve ficar abaixo do teto de 6,5% para o IPCA neste ano e a cotação do dólar já está no patamar de R$ 2,00, o que significa menos estímulo às importações e alívio no balanço de pagamentos.

Na última reunião do Copom, realizada em 10 de setembro, foi elevada a meta de Taxa Selic em 0,75 ponto percentual, para 13,75% ao ano. Na próxima, em 29 de outubro, os diretores do BC terão de olhar, ao mesmo tempo, a meta de inflação e a atividade econômica.

Autoridades da equipe da Fazenda afirmam que não há pressão sobre o BC para interromper a escalada dos juros, mas "mera e rotineira discussão". Um desses auxiliares de Mantega argumenta que a situação vem mudando a cada dia e, atualmente, não seria recomendável um novo aumento de juros.

Já há quem defenda que o ideal seria o Copom cortar juros imediatamente para evitar o que se chama "importação da recessão". A opinião é do economista Yoshiaki Nakano. O sinais dessa potencial recessão foram responsáveis pela expressiva queda da Bovespa na sexta-feira.

As posições do BC e da Fazenda ainda não convergiram nas discussões sobre algumas medidas anti-crise que estão sendo avaliadas. O uso de parte das reservas para irrigar o crédito agrícola e à exportação é uma delas. Na Fazenda, a preocupação em socorrer a produção de alimentos significa evitar inflação no ano que vem. Além da liberação antecipada de R$ 5 bilhões do plano de safra 2008/2009 e do remanejamento de recursos do orçamento da União, poderiam ser usados até R$ 5 bilhões das reservas. A decisão deverá ser tomada até o final de outubro, perto da reunião do Copom.

Tambem não há consenso entre BC e Fazenda sobre o uso de pequena parte das reservas para alimentar as linhas vinculadas a Adiantamentos sobre Contratos de Câmbio (ACC).

Reforçar ainda mais a musculatura do BNDES é outro ponto de honra para o governo porque a instituição de fomento tem papel central nos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e no crédito para empresas brasileiras de classe mundial. A Fazenda quer garantir esses estratégicos recursos de longo prazo e discute como realizar mais aportes de capital em 2009.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem aumentando os contatos com as equipes da Fazenda e do BC. Mantega já passou a ele seu diagnóstico da crise e já defendeu o que considera prioritário.