Título: Lula evita agir em disputa do Plano Verão
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2008, Finanças, p. C5

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não deverá assinar ação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar o pagamento de perdas na caderneta de poupança decorrentes do Plano Verão, de janeiro de 1989.

O passivo é estimado em mais de R$ 100 bilhões e seria pago pelos bancos para corrigir a diferença de 20,36% entre os índices de correção da poupança naquele mês. O problema, para o governo, é que há bancos públicos que também seriam convocados a pagar a correção, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal.

Porém, Lula sinalizou, em reunião interna no Palácio do Planalto, que não vê com bons olhos a sua interferência direta no episódio.

A medida seria amplamente impopular e poderia ser interpretada como uma intromissão direta do presidente em disputas envolvendo correntistas, de um lado, e bancos, de outro.

Com isso, resta aos bancos propor uma ação própria, que seria assinada pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) ou pela Confederação do Sistema Financeiro (Consif) junto ao Supremo Tribunal Federal.

Essa seria a única forma de eles tentarem obter liminar diretamente no STF para suspender todas as ações em tramitação no país sobre o assunto.

Em 2006, a Consif entrou com uma Argüição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no STF para se livrar de milhares de ações em que correntistas cobravam por expurgos na passagem da URV (Unidade Real de Valor) o para o real, entre julho e agosto de 1994.

Em agosto daquele ano, o então ministro do Supremo Sepúlveda Pertence concedeu liminar para suspender o andamento de todos os processos sobre o assunto no país até uma decisão final do Supremo Tribunal Federal.

Com isso, os bancos evitaram um rombo imediato em suas contas. A ADPF é uma ação que permite ao Supremo suspender o andamento de questão controversa nas instâncias inferiores do Judiciário até que ele tome decisão final sobre o assunto.

No caso dos expurgos do Plano Real, o STF ainda não tomou essa decisão. Mas a suspensão das ações tranqüilizou as instituições financeiras.

As ações referentes ao Plano Verão preocupam os bancos porque vários juízes têm concedido a correção das cadernetas de poupança que faziam aniversário entre 1º e 15 de janeiro de 1989.

Na época, a correção era feita pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que variou em 42,72% entre janeiro e fevereiro de 1989. Mas o governo determinou que as correções passariam a ser feitas pelas Letras Financeiras do Tesouro (LFTs) que variaram 22,36% no mesmo período. A determinação foi baixada pela Medida Provisória nº 32, de 15 de janeiro de 1989, que institui as LFTs como novo índice de correção. Depois, a Medida Provisória foi convertida na Lei nº 7.730, que criou o plano.

Na Justiça dos Estados, as decisões são majoritariamente a favor dos correntistas. Os juízes costumam reconhecer o direito adquirido dos cidadãos à diferença entre o IPC e a LTF. Eles também mandam os bancos efetuarem os pagamentos com juros e correção monetária, o que aumenta ainda mais os valores.

Alguns escritórios se especializaram no assunto e passaram a ingressar com centenas de ações. Num único dia, em maio de 2007, perto de 5 mil ações de correntistas foram protocoladas no Fórum de Belo Horizonte. Movimentos semelhantes ocorreram em outros Estados, como São Paulo e Rio Grande do Sul. Em todos eles, a jurisprudência tem se mostrado favorável à tese dos correntistas.

Esses movimentos cresceram bastante nas últimas semanas devido à proximidade do fim do prazo para correntistas ingressarem com novas ações, em dezembro deste ano.

Alguns escritórios de advocacia criaram páginas na internet específicas para essa causa.

"São R$ 110 bilhões que serão usados para enriquecer os bancos caso você não tome essa iniciativa", afirma um site criado para incentivar novas ações de cobrança da diferença do Plano Verão. "O tempo está se esgotando e você tem poucos dias para rever o que é seu", continua o texto de um escritório de advocacia.

Na quinta-feira da semana passada, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) enviou um manifesto ao presidente Lula pedindo para ele não assinar ação contra os correntistas.

O documento contou com o apoio de juristas renomados, como Fábio Konder Comparato e Ada Pellegrini Grinover, promotores, procuradores de Justiça, sociólogos, economistas e outras entidades de defesa do consumidor.

"O governo não pode optar pelo apoio aos bancos", afirmou, na semana passada, a assessora de relações institucionais do Idec, Marilena Lazzarini. "A caderneta de poupança é uma instituição sagrada para o povo e, na época, era a única proteção ao produto do trabalho e da economia dos brasileiros", completou.