Título: Turbulência global deve afetar o México em cheio
Autor: Souza, Marcos de Moura e
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2008, Internacional, p. A17

A economia mexicana deverá ser a primeira grande vítima na América Latina da crise financeira que atinge os EUA. Com uma pauta de exportações voltada maciçamente para o mercado americano, a indústria do México tende a diminuir seu ritmo nos próximos meses e em 2009, como reflexo do desaquecimento da demanda americana.

De tudo o que o país exporta, cerca de 80% vai para os EUA. Na pauta estão bens de consumo, como computadores e monitores de TV, e itens para a indústria, como autopeças, cujas vendas vinham aumentando. Um aperto na renda do consumidor americano e um freio na indústria dos EUA atingirão em cheio o setor exportador mexicano.

"Por aí é que se deve esperar um impacto direto no nível de emprego no setor exportador mexicano e na produção", afirmou o economista Rolando Cordera, professor da Universidade Nacional Autônoma do México.

Ele lembra que a crise também deve bater no fluxo de investimento externo no México. "Os investimentos dos EUA são principalmente na atividade produtiva, ao contrário dos europeus, que são mais financeiros. Assim, podemos esperar uma redução desse fluxo, o que refletirá no nosso crescimento e na balança de pagamentos, que já é deficitária."

O governo do presidente Felipe Calderón tem dito que o setor financeiro no país está relativamente resguardado porque não tem um número significativo de títulos podres nas mãos.

Para Cordera, o impacto da crise na economia real será mais grave até do que o mergulho da Bolsa mexicana nas últimas semanas.

A expectativa é que, nos próximos dias, o governo apresente uma nova versão do Orçamento com uma previsão mais enxuta de gastos e com uma previsão de crescimento ligeiramente mais modesta do Produto Interno Bruto (PIB). Tudo por conta dos efeitos da crise de crédito americana e também da queda na cotação do petróleo. Na proposta orçamentária original, o governo falava num crescimento em 2008 de 2,4% e de 3% em 2009. Economistas falam em expansão de 2% este ano e de 1,5% ou menos em 2009.

Mas, além do contágio pela via comercial e de investimentos, o México tem pelo menos mais um flanco aberto para a crise. A remessa de dólares ao país pelos 11 milhões de mexicanos que vivem nos EUA vem caindo. Em agosto, a redução foi de 12%, o que fez as remessas encolherem para US$ 1,9 bilhão. Em agosto de 2007, o total tinha sido de US$ 2,2 bilhões. Entre janeiro e agosto, os imigrantes mexicanos nos EUA mandaram para casa US$ 15,5 bilhões, 4% a menos que no mesmo período de 2007.

Somada à desaceleração americana, a queda nos preços do petróleo é outro dado desfavorável para a economia mexicana. Cerca de 35% do Orçamento federal depende da receita com o petróleo. No Orçamento apresentado em setembro - e que está sendo revisado - o governo estimou que, no ano que vem, o barril mexicano seria vendido a US$ 80,30. Alguns analistas dizem que o valor terá de ser revisto para US$ 78 ou menos.

Compensar essa sequência de más notícias será uma tarefa difícil para o México devido ao peso dos EUA na economia do país e também ao peso da receita obtida com o petróleo, diz Rolando Cordera. "O que compensaria minimamente seria o governo aumentar os gastos do Orçamento para o setor agrícola, para infra-estrutura e políticas sociais que ajudassem a fortalecer a renda dos mexicanos."

A hipótese de explorar mais o mercado sul-americano - em particular o brasileiro - poderia ser uma alternativa, mas é difícil para um país cujo setor exportador está historicamente voltado ao vizinho do norte.