Título: Real tem maxidesvalorização de 29% desde pico no d
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2008, Finanças, p. C2

Em meio ao agravamento da crise de liquidez e solvência no mercado financeiro, o dólar subiu mais 7,42% ontem, para a cotação de R$ 2,1980, acumulando alta de 41% desde seu ponto mínimo no ano, quando chegou a atingir R$ 1,559 no dia 1º de agosto. É uma maxidesvalorização do real, que já caiu 29% desde seu pico em 2008. A variação de ontem foi tão forte que travou os negócios no mercado futuro na BM&FBovespa, que permite oscilação máxima de 6% em um dia desde a semana passada. Antes, permitia 5% de variação.

Segundo analistas ouvidos pelo Valor, as medidas anunciadas pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e pelo ministro das Finanças, Guido Mantega, melhoram as expectativas. Ajudam a desmontar as posições especulativas compradas dos investidores estrangeiros no mercado futuro, de US$ 6 bilhões a US$ 6,6 bilhões. Contribuem para irrigar o mercado com um dólar hoje inexistente.

Especialista considera correto que o BC ofereça crédito em dólar também no mercado externo. Se o BC oferecesse somente linhas no mercado interno - desde meados de setembro, vendeu US$ 1 bilhão -, poderia causar uma distorção entre os juros em dólar no mercado interno (o cupom cambial) e externo, devido à total paralisia no crédito em dólar no mundo offshore. Na crise eleitoral de 2002, quando faltou crédito externo à exportação para o Brasil, o BC vendeu linhas somente no mercado interno, pois o mercado interbancário de crédito em dólar estava normal - o problema era o alto risco-Brasil.

Uma calmaria mais efetiva no mercado de câmbio brasileiro só será verificada, no entanto, no caso de uma normalização no mercado internacional interbancário em dólar, o que seria sinalizado por uma queda significativa na Libor, a taxa interbancária de Londres. Ontem, a Libor para empréstimos de um dia subiu 37 pontos básicos, para 2,37% ao ano.

A maxidesvalorização do real contribui ainda mais para o aperto de liquidez no mercado interno. Não são apenas as empresas brasileiras que estão perdendo caixa com posições vendidas em dólar no mercado futuro. Os bancos e fundos que compraram os "swaps cambiais reversos" do BC, que hoje são cerca de US$ 20 bilhões, têm sangrado seus caixas em ajustes diários. Somente ontem, com a alta de 7,42%, o BC recebeu cerca de US$ 1,5 bilhão - ou enxugou R$ 3 bilhões do sistema financeiro. Nos "swaps cambiais reversos", o BC recebe a valorização do dólar mais os juros internos em dólar (o cupom cambial, que quase não se alterou ontem) e paga aos bancos os juros em reais mais a valorização da moeda brasileira.

Por isso, a venda de US$ 1,5 bilhão em "swaps cambiais" ontem, que na verdade representam o desmonte de parte dos "swaps cambiais reversos" do BC que venceriam em 3 de novembro, foi aplaudida pelos investidores. Isso significa que foi injetado US$ 1,5 bilhão no mercado futuro. Na semana passada, o BC vendeu outro US$ 1,75 bilhão no mercado futuro, ao rolar apenas US$ 250 milhões dos US$ 2 bilhões em "swaps reversos" que venciam no início de outubro.

No total, somando as linhas de crédito em dólar mais as vendas no mercado futuro o BC já vendeu US$ 4,25 bilhões no mercado de câmbio, cerca de 2% da soma das reservas cambiais de US$ 207 bilhões mais os "swaps cambiais reversos" de US$ 23 bilhões com os quais começou setembro. A crise de hipotecas americanas já vem atingindo os mercados internacionais desde meados do ano passado, mas foi depois da concordata da Lehman Brothers, no dia 15 de setembro, que os mercados de crédito em dólar deixaram de existir.

O impacto da forte valorização do dólar nas contas públicas tem animado os investidores. Os economistas do mercado já calculam que a dívida líquida do setor público caiu para níveis de 38% a 37,5% do Produto Interno Bruto por causa das posições líquidas ativas em dólar do governo.