Título: FMI avalia que perdas somarão US$ 1,4 tri
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2008, Finanças, p. C7

A desaceleração da economia mundial e a contração do crédito estão alimentando um ciclo vicioso que agravou a infecção no sistema financeiro internacional, aumentando a fragilidade de muitos bancos e indicando que a superação da crise atual será um processo bastante demorado e doloroso.

Um relatório apresentado ontem pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que os prejuízos causados pela crise serão muito maiores do que indicavam as projeções feitas no começo do ano e provocarão uma redução significativa na oferta de crédito para empresas e consumidores nos próximos meses.

"O risco de um ciclo ainda mais adverso na relação entre o sistema financeiro e o conjunto da economia representa uma ameaça séria", afirmou o diretor do departamento do Fundo que monitora os mercados de capitais, Jaime Caruana, ao divulgar o relatório ontem.

Os economistas da instituição calculam que as perdas decorrentes da crise alcançarão US$ 1,4 trilhão. É o dobro do que bancos e outras instituições financeiras sediadas nos Estados Unidos e na Europa já reconheceram, um indício de que seus próximos balanços voltarão a exibir resultados ruins. Em abril, o Fundo estimava em US$ 945 bilhões os prejuízos.

Os problemas que surgiram no mercado imobiliário americano há mais de um ano se espalharam rapidamente nos últimos meses, gerando novas fontes de instabilidade para os bancos nos países mais avançados. Os atrasos no pagamento de faturas de cartões de crédito aumentaram e apareceram problemas com empréstimos para construção de prédios comerciais e aquisição de automóveis.

Dados compilados pelo Instituto de Finanças Internacionais (IIF), associação que tem os maiores bancos do mundo como membros, mostram que o volume de empréstimos problemáticos na carteira dos grandes bancos americanos triplicou no último ano. As dificuldades são maiores para bancos regionais e instituições menores.

Isso tem levado os bancos a aumentar as exigências para a concessão de novos empréstimos e reforçar suas reservas de capital para compensar prejuízos, o que tem reduzido a oferta de crédito na economia. A desaceleração econômica tende a piorar as coisas, reduzindo a capacidade que as pessoas têm de pagar dívidas e fazendo a inadimplência crescer ainda mais.

"A desaceleração da economia global provocará uma desvalorização maior dos ativos das instituições financeiras e isso criará novas pressões sobre o capital dos bancos", disse o economista Hung Tran, um ex-funcionário do FMI que hoje é diretor do IIF.

Desde o início da crise no ano passado, grandes bancos americanos e europeus levantaram mais de US$ 439 bilhões para reforçar o capital. Mas isso foi insuficiente para cobrir o buraco aberto pelas perdas que eles sofreram e eliminar as dúvidas que os investidores têm sobre sua saúde financeira.

O relatório divulgado pelo FMI estima que os bancos dos países ricos precisarão levantar mais US$ 675 bilhões em capital novo nos próximos anos para voltar a operar em condições parecidas com a normalidade. O Fundo acredita que só será possível levantar esses recursos no setor privado se a economia melhorar, o que eles prevêem que só deverá ocorrer no fim do ano.

O tumulto nas bolsas e a desvalorização das ações têm contribuído para afastar investidores que poderiam ajudar os bancos a se manter em pé. "O pânico nos mercados impede que se enxergue direito quais bancos estão insolventes e quais têm saúde para continuar operando apesar das dificuldades atuais", disse o economista Adam Posen, do Instituto Peterson para a Economia Internacional.

O programa de socorro ao sistema financeiro que foi aprovado na semana passada pelo Congresso americano permite que o Tesouro dos EUA gaste US$ 700 bilhões para adquirir parte dos ativos problemáticos nas carteiras dos bancos, o que os ajudaria a limpar seus balanços e atrair recursos de outros investidores. Mas ainda há dúvidas sobre a maneira como o plano será executado e a eficácia que ele terá.

O FMI acredita que será preciso um esforço muito mais vigoroso para capitalizar os bancos, com ajuda de investidores privados e até mesmo injeções de recursos públicos, se os governos dos países avançados quiserem evitar a redução mais forte na oferta de crédito.

Simulações incluídas no relatório divulgado ontem sugerem que a oferta de crédito nos EUA e na Europa ficaria praticamente estagnada, com um crescimento anual de apenas 0,2%, num cenário em que os investidores continuariam retraídos e seriam gastos US$ 2 trilhões em recursos públicos para tirar de circulação os papéis que apodrecem nos livros dos bancos.