Título: Meirelles convence oposição a aprovar MPs anti-crise
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 09/10/2008, Política, p. A5

Uma reunião da diretoria do Banco Central com líderes políticos de oposição, ontem, abriu caminho para aceitação da recém-editada Medida Provisória 442, que amplia os poderes da autarquia para socorrer o sistema bancário, e ainda assegurou a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da Medida Provisória 435. Editada em fins de junho, esta MP mais antiga, que permite ao BC brasileiro acolher depósitos em reais de bancos centrais e câmaras de compensação de outros países, foi aprovada ontem mesmo, por acordo, e agora vai ao Senado. "Estávamos contra a 435, mas, depois dos esclarecimentos, decidimos votar pela aprovação", disse, em entrevista ao Valor, o líder do PSDB na Câmara, deputado José Aníbal (SP). O parlamentar tucano referia-se ao encontro que ele, o líder do PPS, Fernando Coruja (SC), e o líder do DEM, ACM Neto (BA), mantiveram, pela manhã, por mais de uma hora, primeiro só com os demais diretores e depois também com o presidente do BC, Henrique Meirelles.

A maior preocupação dos líderes não residia no trecho sobre relações da autarquia com outros bancos centrais e sim no fato de a MP também autorizar o Tesouro Nacional a emitir títulos diretamente para abastecer a carteira do BC. Segundo Aníbal, havia temor de que isso pudesse ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas o medo foi dissipado depois da conversa, pois os deputados saíram convencidos de que tais operações, que são sem contrapartida financeira, não representarão financiamento do BC ao Tesouro. "Essas emissões visam apenas a assegurar ao Banco Central volume de títulos suficiente para gerir a política monetária", explicou o parlamentar, referindo-se às operações diárias de compra e/ou venda de papéis federais feitas pelo BC no mercado secundário, com objetivo de regular a liquidez do sistema bancário e, com isso, o nível da taxa de juros, principal instrumento de controle da inflação. O mesmo argumento foi usado por Fernando Coruja, já na tribuna da sessão da Câmara, para defender a medida.

Resolvida a 435, no entanto, as votações na Câmara foram suspensas pelo menos até o fim dessa semana. Mesmo com outras duas medidas provisórias já trancando a pauta (436 e 438), a oposição não quis negociar outros itens. O motivo foi a recusa do governo e de suas lideranças de retirar o regime de urgência constitucional sob o qual tramita o projeto de lei que cria o Fundo Soberano do Brasil (FSB). "Vamos ver como o governo se comporta na semana que vem e depois voltamos a conversar", disse Coruja ao Valor.

Num esforço bem-sucedido do governo para unir sua base aliada, o projeto do FSB passou, ontem, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, por 33 votos a favor e dois contra, apesar da tentativa de obstrução do DEM, PPS e PSDB. Os parlamentares desses três partidos de oposição deixaram a sessão para não dar quórum. Só dois permaneceram para poder pedir verificação - o que, porém, não adiantou, já que os votos verificados foram suficientes para aprovar o projeto.

Com a decisão da CCJ e a aprovação da MP 435, sem a retirada do regime de urgência, o texto que cria o FSB -ao qual o governo pretende destinar, só esse ano, R$ 14,2 bilhões de superávit fiscal primário excedente - assumiu o terceiro lugar na fila de votações prioritárias do plenário da Câmara, atrás apenas das MPs 436 e 438 (a 437 foi retirada pelo governo).

Diante disso, a oposição ontem adotou a defesa da MP 442, editada na segunda-feira, como mais um argumento para tentar derrubar a urgência para a votação do fundo. "Temos que desobstruir a pauta para chegar o quanto antes na 442. Mas, se a urgência não cair, o projeto do fundo soberano vai atrapalhar e muito", afirmou ao Valor, o líder do PSDB.

Ele, Coruja e também ACM Neto saíram do encontro com a diretoria do BC, ontem, defendendo a necessidade de votar e aprovar o quanto antes, ainda que com aperfeiçoamentos, a medida, apelidada pelos congressistas de "Proer do governo Lula". É uma alusão ao Programa de Estímulo à Fortalecimento e Reestruturação do Sistema Financeiro Nacional (Proer), criado também por MP em 1995, pelo governo Fernando Henrique Cardoso, para socorrer depositantes de bancos quebrados (Econômico, Bamerindus e Nacional foram os exemplos mais emblemáticos).

Aníbal e Coruja entendem que, principalmente depois do agravamento da crise de liquidez internacional e seus efeitos sobre o Brasil nos últimos dias, a MP 442 é algo muito mais urgente para se discutir do que o FSB. Eles concordam que é preciso ampliar o leque de instrumentos à disposição da autoridade monetária brasileira para reagir rapidamente à crise, mesmo que, no momento, as novas linhas de redesconto viabilizadas pela medida não sejam necessárias. Aníbal lembrou que os legisladores de outros países já deram mais poderes aos seus bancos centrais diante da gravidade da crise, para minimizar os impactos sobre a economia real.

DEM, PPS e PSDB são contra a criação do FSB, por entenderem que a situação macroeconômica do Brasil ainda não recomenda, muito menos após a subida do dólar e a recente fuga capitais externos do país. Mas o principal e maior problema, segundo esses partidos, é que o desenho proposto no projeto representa um "cheque em branco na mão do governo", para fugir do controle do Congresso sobre o orçamento. Como poderá financiar projetos no Brasil e exterior, o fundo poderá inclusive servir para fins políticos-eleitorais, se o projeto passar como está, advertem.