Título: Surra nas pequenas
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Fonte: Valor Econômico, 10/10/2008, Investimentos, p. D1

Pior do que o Índice Bovespa, que reúne as ações mais negociadas do mercado e cai 41,96% desde o início do ano, só mesmo as ações de empresas menores, ou "small caps", de menor valor (capitalização) de mercado. Só em setembro, o recém-criado índice de Small Caps da Bovespa caiu 23% para 11% do Ibovespa. E, olhando os fundos de ações especializados nesses papéis, poucos escapam. A maioria perde para o Ibovespa e alguns chegam a cair mais de 60% em 12 meses.

A perda maior das empresas menores se deve em boa parte à liquidez mais restrita desses papéis e ao fato de muitas serem novatas no mercado, nas quais os estrangeiros tinham forte presença. A estimativa é de que investidores externos ficaram com 75% do capital vendido pelas novatas nos últimos três anos. E, precisando fazer caixa, o estrangeiro vende a qualquer preço, o que causa um impacto maior por conta da baixa liquidez.

Ao mesmo tempo, alguns fundos apostaram em empresas novatas que frustraram os investidores por estratégias equivocadas ou por fortes perdas provocadas por problemas operacionais, casos de Dufry, Agra, Laep, Tenda, Abyara e Agrenco. Já outros se deram bem com as pequenas. Foi o caso do fundo da Orbe, que tinha ações da Vigor, diz o diretor da gestora, Fabio Carvalho. A empresa foi comprada pelo Frigorífico Bertin, está fechando capital e teve seus papéis valorizados.

É preciso observar, porém, que o conceito de fundos "small caps" é bastante amplo. Apesar de a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid) ter criado um critério para essas carteiras e a Bovespa um índice, cada banco ou gestor têm sua definição. Há fundos que usam diferentes valores de mercado ("market capitalization"), outros o faturamento e alguns que misturam empresas de grande porte, como Petrobras, como a própria Orbe. "Não temos o compromisso de ficar apenas com as pequenas", diz Fabio Carvalho.

Mas nem tudo sempre foi ruim para as empresas menos líquidas. No fim de 2007, havia um ambiente favorável para elas, com a perspectiva de redução dos juros e crescimento interno, lembra Jorge Ricca, gerente de renda variável BB DTVM. Em 2008, começaram as pressões inflacionárias e o cenário internacional piorou, aumentando as vendas de estrangeiros. Além disso, as grandes empresas de commodities, como Petrobras, siderúrgicas e Vale, se valorizaram com a alta dos preços das matérias-primas no exterior. "Isso fez as menos líquidas descolarem das mais líquidas", diz. Depois de maio, porém, a situação se inverteu com a queda das commodities e as "large caps" despencaram, enquanto as pequenas se tornaram um porto seguro. Só que a piora do cenário internacional em setembro atingiu em cheio as menores.

Com 25 a 30 ações em carteira, o fundo da BB DTVM teve um desempenho um pouco melhor graças à diversificação. "E aumentamos o número de setores mais recentemente, buscando os menos vulneráveis à queda da economia, como saúde e empresas de serviços, como elétricas e saneamento", diz. Ricca segue o índice de "small caps" da bolsa, que exclui as maiores empresas que representam até 85% do valor de mercado. Os 15% restantes são as "small caps" e equivalem a cerca de 80 empresas.

Para Ricca, havendo recuperação do mercado, o primeiro movimento deve ser focado nas "blue chips". Mas ele observa que alguns papéis de empresas menores no longo prazo podem ser boas oportunidades, caso haja uma melhora do crédito, o que beneficiaria a construção civil e o varejo.

O investidor deve tomar cuidado ao comparar as carteiras de pequenas empresas, pois há estratégias muito diferentes, afirma Eduardo Favrin, diretor de renda variável da HSBC Global Asset Management. No caso do HSBC, o alvo são empresas com valor de mercado até US$ 2 bilhões. Nessa classificação, o fundo escolhe 25 empresas, em sua grande maioria novatas, que sofreram com a saída dos estrangeiros. A carteira do HSBC apresenta queda de 61,66% em 360 dias encerrados dia 7, segundo o Fortuna. Houve o impacto também de apostas em Positivo Informática e Dufry. "A Dufry vendemos porque a empresa havia se comprometido a encerrar um empréstimo ao controlador e não o fez", diz. O fundo ganhou com Datasul, adquirida pela Totvs. "Mas não tivemos nenhum caso mais sério, como Laep, Agrenco ou construção", diz.

Hoje, há muitos papéis com preços aviltados, tanto entre as grandes quando entre as pequenas empresas, diz Favrin. E, com a queda da bolsa e a alta do dólar, a fatia de companhias que entra na categoria de "small caps" cresce, passando a incluir papéis mais líquidos, como Lojas Renner, Duratex ou MMX, o que permite fazer uma diversificação maior.

O que ocorreu com as ações de pequenas empresas foi uma carnificina, diz Ronaldo Patah, diretor de renda variável da Unibanco Asset Management. "Várias ações estão com valores de mercado abaixo de seu valor de caixa e do patrimônio", diz. Para ele, o principal risco das pequenas empresas é de os estrangeiros saírem vendendo a qualquer preço, o que afugenta também os locais. "E com as grandes empresas no preço que estão, ninguém quer se arriscar numa "small cap"", diz.

O fundo Unibanco Micro Cap aplica em empresas com valor de mercado até R$ 1 bilhão e o Small Caps, de até R$ 5 bilhões. Entre os papéis preferidos, estão Banrisul, Cremer, Indústrias Romi e Positivo. "Tentamos também procurar opções em setores mais blindados, como setor elétrico, e evitar os que dependem de crédito ou de empresas endividadas", diz.

No Itaú, o cenário é que o mercado como um todo vai continuar muito volátil e, em conseqüência, as "small caps" seguirão sofrendo, diz Marco Antonio Carregari, gestor dos fundos de ações do banco. As novatas, que dependem de crédito ou estavam com preços superestimados, são as que sofrem mais, diz. Mas há casos e casos. Empresas com planos de investimento sem necessidade de fonte de financiamento têm sofrido, mas menos que a média, diz.

Os fundos Seleção do Itaú usam como referência os papéis do IBrX 100 menos as 25 ações com maior peso. "Mas o cenário é difícil, aconselhamos os investidores a não se desfazerem do investimento em "small caps", mas também não aumentar", diz. Mesmo assim, há empresas baratas, observa, mas que vão depender do desenrolar da crise no exterior.

No caso da Victoire Finance Capital, o fundo de pequenas empresas se saiu melhor ao ficar longe das novatas, diz seu gestor, Werner Müller Roger. "As empresas saíram com valores muito acima de seu potencial, mas, agora, depois dessa forte queda, algumas já começam a ficar atrativas", diz. A gestora tem como princípio não comprar empresas onde não há transparência contábil. "Por isso, ficamos fora do setor de construção", diz. O fundo hoje tem 13 papéis e faz questão de seguir o índice de Small Caps da Bovespa.