Título: Linhas para autos recuam para 36 meses
Autor: Travaglini, Fernando; Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2008, Finanças, p. C5

As pessoas começam a ter dificuldades para financiar a compra do automóvel. Entre os revendedores de usados, o sentimento é de que as linhas estão muito restritas e já embutem taxas praticamente duas vezes mais altas. Já entre os carros novos, os bancos ligados às montadoras garantem a oferta de recursos, com taxas reduzidas, até pelo compromissos com as vendas das companhias. Nos dois casos, os prazos encolheram e raramente superam 36 meses. Ricardo Benichio / Valor Montenegro, da Anef: juro não subiu como em outras épocas de crise

A primeira reação concreta dos bancos que financiam automóveis ao aperto do crédito foi a suspensão dos planos de financiamento em 72 meses. A segunda foi lançar grandes campanhas reduzindo taxas de juros à metade da média do mercado. Mas o consumidor precisa estar atento ao novo apelo de vendas: na maior parte dos casos, os juros mais baixos não valem para os carros mais vendidos.

O resultado das vendas no último fim de semana servirá como uma espécie de termômetro para fabricantes de veículos e financeiras saberem se as novas estratégias deram resultado. Volkswagen, General Motors e Ford lançaram promoções com taxas a 0,99% na véspera do fim de semana na expectativa de atrair o consumidor em dúvidas.

"De maneira geral, todos imaginam que essa crise será passageira. Por isso, é muito natural que o consumidor se retraia diante do aumento de juros. A tendência é adiar a troca do carro até que os juros baixem", afirma o supervisor de marketing e desenvolvimento de negócios do Banco Volkswagen, Marcos Ferreira. "A situação muda se ele tiver a oportunidade de comprar hoje a uma taxa mais baixa", completa o executivo.

No caso da Volks, a taxa de 0,99% só vale para planos de 24 meses e para os modelos da linha Fox, Polo e o importado Beetle. Quem quiser Kombi - um veículo que não precisa nem de propaganda - ou o novo Gol - recém-lançado e sucesso de vendas - tem que arcar com juros mais altos, em torno de 1,69%, dependendo do plano.

A Ford também lançou uma campanha de 0,99% em financiamento de 24 meses para os modelos Fiesta e EcoSport. E a mesma taxa foi lançada pela General Motors para as linhas Corsa e Astra. Tanto Ford como a GM excluíram os carros mais baratos - Ka e Celta, respectivamente - dos planos com juros mais baixos.

Essa foi uma das saídas encontradas para estimular a venda do carro zero nesse momento difícil do mercado: taxas reduzidas, com prazos encolhidos e entrada alta. Segundo Luiz Montenegro, presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef) apesar das condições, não há falta de liquidez no mercado. "As taxas evidentemente subiram e os prazos mais longos encurtaram, mas as condições podem retornar".

Em média, disse, os prazos giram em torno de 36 meses, mas ainda existem operações de 42 e 60 meses. Já as taxas variam entre 1,45% e 1,60% ao mês. "Os juros não dispararam tanto quanto em outras épocas de crise porque os fundamentos da economia são infinitamente mais sólidos".

Até agosto, o saldo dos financiamentos de veículos para pessoas físicas somava R$ 135 bilhões. A expectativa da Anef de crescimento de 25% no ano foi mantida.

O segmento que mais sofre, no entanto, é da classe de renda mais baixa, que passou a ter acesso ao crédito pelas linhas longas. "Numa situação de volatilidade como essa, o mercado tende a ser mais conservador. Há uma certa atitude de prudência combinada com menor liquidez no mercado", disse Montenegro.

George Assad Chahade, presidente da Associação dos Revendedores de Veículos Automotores no Estado de São Paulo (Assovesp) afirma que até o fim de setembro, o mercado caminhou praticamente sem efeitos da crise, mas a última semana do mês o cenário já mudou. "Conseguimos captar que setembro passou incólume, mas o mercado começa a encolher um pouco, principalmente por causa da especulação em torno dos financiamentos e da restrição do crédito bancário".

As taxas, que antes oscilavam entre 1,8% e 2,2% ao mês, hoje variam entre 2,2% e 2,5% ao mês. Para ele, o pior não são os juros mais altos, mas sim a seletividade elevada dos bancos para aprovação do crédito. As exigências ficam tão grandes que muitas vezes inviabilizam o negócio. "A ansiedade é o pior da crise, porque gera desconforto no mercado. Acredito que vamos superar sem grandes solavancos do mercado, mas o setor de usados vai se ajustar a uma nova realidade".

Até mesmo o nicho de carros de luxo já sofre com a crise, afirma Ricardo Almeida, gerente da Audi One, concessionária que representa a marca no interior paulista. "Caiu a procura por financiamento, devido aos juros mais altos". Segundo ele, as linhas passaram de 1,27% ao mês para 1,70% ao mês. Além disso, a alta do dólar pode afetar a venda de importados.