Título: Brasil e Índia avançam em alternativas para salvar Doha, dizem ministros
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2008, Brasil, p. A2

Os ministros de Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e do Comércio da Índia, Kamal Nath, deixaram de lado os desentendimentos ocorridos durante as negociações na Organização Mundial de Comércio (OMC) e, em uma reunião de quase cinco horas, decidiram buscar juntos propostas para apontar até dezembro uma saída para a Rodada Doha, que busca reduzir tarifas e subsídios que distorcem o comércio mundial. Nath e Amorim defenderam também que os países em desenvolvimento apontem, juntos, propostas para enfrentar a atual crise.

"A economia global não pode continuar à mercê dos mercados financeiros dos Estados Unidos, temos de ter sistemas comuns de regulação financeira internacional", disse Nath, ao afirmar que concorda com a proposta de Amorim, que prevê a discussão do papel do Fundo Monetário Internacional (FMI) e elaboração de nova entidade financeira mundial para evitar crises como a que afeta atualmente os mercados de todo o mundo. "As grandes soluções virão do mundo em desenvolvimento", comentou Amorim. "À luz da situação global atual, é importante que Brasil e Índia mostrem liderança para os países em desenvolvimento", afirmou Nath. "Temos visões e objetivos em comum e precisamos persuadir outros países."

O ministro de Relações Exteriores reconheceu que, depois de julho, quando foram frustrados os esforços parar concluir, em Genebra, as fórmulas de redução de subsídios e tarifas, após um impasse entre Estados Unidos e Índia, houve "mal-entendidos" entre indianos e brasileiros - desentendimento que Amorim atribui a interpretações da imprensa. No último domingo, o governo brasileiro deslocou seus principais negociadores para Nova Déli para discutir com a equipe de Nath as posições de cada país na OMC.

"Com os caminhos que eu e o ministro Nath apontamos, será mais fácil o trabalho dos técnicos, mas ainda vamos precisar de muitas reuniões", admitiu Amorim. Em tom otimista, ele e o ministro indiano declararam que há fortes chances de que Índia e Brasil cheguem a um acordo sobre como tratar, na OMC, temas como a salvaguarda contra importações para pequenos agricultores de culturas de subsistência. Os dois principais sócios do grupo de países em desenvolvimento conhecido como G-20 ainda têm grandes diferenças de opinião sobre a OMC, apesar da disposição política para caminharem juntos nas negociações.

Há forte desconfiança em Genebra, porém, de que as demandas indianas por maior proteção aos produtores rurais do país têm mais a ver com as campanhas políticas internas da Índia do que com prováveis ameaças aos produtores no campo, provocadas pela abertura às importações. Nath deve se candidatar ao cargo equivalente ao de governador, em uma das províncias mais pobres da Índia, nas eleições que serão realizadas em novembro. Negociadores brasileiros comentam que nenhum avanço significativo será feito na OMC antes que seja conhecido o resultado das eleições presidenciais nos EUA.

Amorim chegou domingo à noite na Índia para conversar com Nath sobre a OMC e também para participar da reunião de cúpula do grupo formado por Índia, Brasil e África do Sul (Ibas). Os presidente dos três países devem assinar planos de trabalho para melhorar o transporte e comércio trilateral de mercadorias e acordos de cooperação em educação e cultura.

A crise financeira transformou-se, porém, no principal assunto a ser tocado no encontro. Ontem, Nath voltou a tentar tranqüilizar os indianos, preocupados com a redução no ritmo de crescimento da indústria, para apenas 1,3% no último trimestre. Ele pôs em dúvidas as estatísticas, argumentando que os sinais visíveis da produção industrial mostram vitalidade no setor privado indiano.

O repórter viajou a convite da Índia Brand Equity Foundation (IBEF)