Título: Governo quer que seguro auxilie habitação
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2008, Finanças, p. C12

Apesar da grave crise financeira global, o governo está se mobilizando para discutir, com o setor privado, o que tem de ser feito para que o segmento dos seguros ajude a desenvolver o mercado imobiliário. Na visão do secretário extraordinário de Reformas Econômico-Fiscais do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, é preciso identificar se há gargalos regulatórios indutores ou repressores. Para isso e para analisar as experiências internacionais será realizado na quinta-feira, em São Paulo, um seminário para visualizar as oportunidades e saber como o seguro pode reduzir riscos e custos. "A crise financeira global não pode paralisar a agenda de aperfeiçoamento institucional. Temos de aprender com os erros e criar condições para uma recuperação econômica mais rápida", defende o secretário.

A diferença de tratamento tributário que prejudica o seguro garantia na comparação com a fiança bancária é um dos temas que deverão ser amplamente discutidos, nesta semana, por representantes do governo e do setor privado. A expectativa é do diretor da Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg), Neival Rodrigues Freitas, ao comentar que a grave crise financeira global não vai inviabilizar a agenda do desenvolvimento do mercado imobiliário. "Como o mercado brasileiro é muito regulado, os efeitos da crise serão muito menores. Não há, por aqui, bancos e seguradoras quebrando", diz.

Na opinião de Freitas, um dos avanços que o mercado brasileiro demanda é o fim da assimetria que reduz a competitividade do seguro garantia. Esse produto tem carga de 7,38% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mas esse tributo não incide sobre a principal concorrente, a fiança bancária.

Appy admite que, no país, a única modalidade mais desenvolvida de seguro imobiliário é a que cobre morte e invalidez durante o financiamento, mas essa cobertura é obrigatória. No Brasil, reconhece que a falta de desenvolvimento desse segmento tem várias causas. O monopólio do resseguro foi uma delas. Além disso, havia falta de crédito imobiliário e depressão do mercado de seguros causada pela inflação e pela falta de conhecimento desses instrumentos de mitigação de risco.

De acordo com a avaliação do secretário, o maior problema foi o longo período, mais de 20 anos, sem crescimento econômico relevante. "Um mercado deprimido fica altamente seletivo e cobra altos spreads para esses produtos, criando, praticamente, um clube fechado. Nesse ambiente, não há demanda para o desenvolvimento de financiamentos mais amplos", lamenta.

O volume de crédito imobiliário, de acordo com o governo, ainda é muito baixo e não alcança os 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Nesse ambiente, o déficit é de oito milhões de moradias. No Chile, o crédito imobiliário equivale a 15% do PIB. No México, são 13%. O setor de seguros ainda é atrofiado no Brasil. O volume de prêmios arrecadados é pouco maior que 3% do PIB. Na África do Sul, são 15%.

Na equipe de Appy, o coordenador-geral de Acompanhamento de Reformas Institucionais, Otávio Damaso, alerta para o inevitável esgotamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) que vai obrigar o mercado a construir novas fontes de financiamento. Nesse desafio, o governo quer entender como o setor de seguros pode contribuir para desenvolver o mercado imobiliário. "Como esse segmento [seguros imobiliários] é incipiente, dá para evitar mais erros e distorções", espera.

Uma das tarefas do seminário de quinta-feira será analisar as experiências internacionais. Mercados muito mais sofisticados e maduros, como o britânico e o canadense, têm uma lista de mais de trinta modalidades de seguros para as demandas da construção civil. Paulo Safady Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), defende a adoção do modelo canadense como referência porque, segundo sua opinião, é flexível, independente e mais barato depois de formado o fundo garantidor.

Simão explica que, no Canadá, os construtores criaram uma entidade auto-regulamentadora, privada, que controla a qualidade, o cumprimento dos contratos e os riscos. O mercado imobiliário mais desenvolvido e antigo é o da Grã-Bretanha e, por isso, o seminário vai ouvir o diretor do National House-Building Council (NHBC), Richard Tamayo.

"Criada a agenda, vamos ter prioridades mais nítidas, mas, sem crédito e crescimento, não vai haver agenda", reconhece Simão. Em 2008, a construção vai crescer 9% e metade disso é o segmento imobiliário, com US$ 70 bilhões.