Título: Mantega alerta Gilmar Mendes sobre o risco dos expurgos do Plano Verão
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2008, Finanças, p. C12

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, procurou pessoalmente o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, para alertá-lo do risco que os bancos correm com a possibilidade de novas concessões de benefícios a milhares de correntistas por causa da avalanche de ações cobrando os expurgos do Plano Verão, de janeiro de 1989. Ruy Baron / Valor O ministro da Fazenda, Guido Mantega, acredita que novas concessões de benefícios de ações judiciais pode ter impacto no crédito para empresas

Mantega disse a Mendes que o ambiente internacional é amplamente desfavorável e que os bancos nacionais não podem conviver com a expectativa de pagar mais de R$ 100 bilhões num momento de contenção de crédito. O encontro ocorreu em 1º de outubro. Na ocasião, assessores do ministro da Fazenda e do STF alegaram que ambos trataram de questões relativas ao Orçamento. Mas o tema da reunião foi o efeito de novas ações judiciais contra os bancos num momento de crise financeira global. Mantega mostrou-se preocupado com o impacto dessas ações sobre a concessão de crédito às empresas.

Com a crise, as empresas deverão recorrer cada vez mais aos bancos nacionais na busca por novos financiamentos. Esse movimento leva os bancos a serem mais seletivos na concessão de créditos às companhias, já que eles costumam captar recursos no exterior, onde o dinheiro está mais caro. Neste contexto, os bancos tenderiam a elevar ainda mais o custo para a concessão de créditos às empresas, caso tenham que ressarcir correntistas em mais de R$ 100 bilhões por causa de um plano econômico realizado 20 anos atrás.

Esse valor seria decorrente da diferença entre os índices utilizados para a correção da poupança em janeiro de 1989. No início daquele mês, a poupança era corrigida pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC). Mas o governo Sarney determinou a aplicação de Letras Financeiras do Tesouro (LFTs) às cadernetas de poupança por Medida Provisória. O INPC ficou em 42,72%, enquanto as LFTs registraram correção de apenas 22,36% no período. Assim, a diferença entre os índices ficou em 20,36%.

Milhares de correntistas ingressaram na Justiça para obter essa diferença de volta e os juízes dos Estados estão determinando aos bancos que façam os pagamentos com juros e correção monetária. Para piorar a situação dos bancos, nas últimas semanas houve uma verdadeira corrida ao Judiciário. Advogados estão fomentando correntistas a ingressarem com novas ações, já que o prazo para recorrer é de 20 anos e termina em dezembro próximo.

Mantega relatou a Mendes que teme os efeitos dessa enxurrada de novas ações. Elas poderiam prejudicar não apenas os bancos públicos - em especial, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil -, mas as instituições financeiras em geral e a concessão de crédito às empresas em particular. Segundo o ministro da Fazenda, essas ações seriam um fator de aperto ao financiamento da atividade empresarial no país.

Mas o grande problema para os bancos é que, no momento, o STF não pode tomar nenhuma atitude a respeito, pois não há nenhuma ação sobre o assunto no tribunal. A Advocacia-Geral da União (AGU) foi procurada pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) para ingressar com uma Arqüição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no STF. A ADPF é um tipo de ação que permite ao Supremo suspender todas as ações em curso sobre um assunto até que o tribunal tome uma decisão definitiva. O pedido da Febraban foi levado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que ele assinasse a ação. Mas Lula respondeu que não gostaria de interferir em processos individuais de correntistas. O presidente dificilmente assinará qualquer ação contra milhares de pessoas que querem a correção de seu dinheiro até a realização do segundo turno das eleições, em 26 de outubro.

A alternativa é a Febraban ingressar com uma ação no Supremo e, no âmbito dessa ação, pedir o apoio da AGU para defender o Plano Verão. A entidade ainda não decidiu se optará por essa solução. No momento, prefere aguardar nova posição do governo.