Título: Lula quer mais controle sobre sua atuação em SP
Autor: Costa, Raymundo; Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 16/10/2008, Política, p. A9

Sob a ameaça perder a eleição nas capitais dos três maiores colégios eleitorais do país, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva interveio na campanha da petista Marta Suplicy, em São Paulo, para ter maior controle sobre sua participação na reta final do segundo turno. O presidente estava insatisfeito com a agenda que cumpriu no primeiro turno, em geral "pouco representativa", na sua opinião. É isso o que justifica a presença de Gilberto Carvalho, seu chefe de gabinete, no comando da campanha de Marta, cuja vitória pode equilibrar o desempenho do PT no Sudeste. Moacyr Lopes Junior/Folha Imagem Marta, em campanha, corre com crianças no Jaçanã: presidente diz na Índia ter certeza da vitória de ex-ministra

Já neste fim de semana o presidente comparecerá a eventos com mais pompa e circunstância que os do primeiro turno. Está previsto, também, um grande comício de encerramento, talvez em São Bernardo, reunindo ainda os candidatos do ABCD. O PT estima que a participação de Lula em campanhas representa algo entre 4% e 5% de votos agregados, e podem ser decisivos para Marta ganhar a eleição.

Além de não querer transformar a eleição num duelo entre Lula e José Serra (PSDB), que patrocina a campanha do prefeito Gilberto Kassab (DEM), Lula estava aborrecido com a organização da agenda preparada para ele, pouco condizente com um presidente da República no auge da popularidade. Por isso estava decidido a ter uma participação firme, mas nada muito efusivo.

Um exemplo dos problemas de agenda que desagradaram Lula ocorreu semana passada, num encontro da Marta com evangélicos. O encontro foi "turbinado" de última hora, quando o presidente confirmou presença. Antes dele chegar, Marta se envolveu num bate-boca com um dos pastores presentes, o que levou Lula, mais tarde, a ter de remediar a situação.

Terminado o primeiro turno, com Marta atrás de Kassab com menos de um ponto de diferença, o comando da campanha reclamou maior presença do presidente em São Paulo, o que poderia pesar em favor do PT (ainda não havia pesquisas dando larga vantagem a Kassab ).

Lula concordou, mas impôs a presença do chefe de gabinete do Palácio do Planalto, Gilberto Carvalho, junto ao comando da campanha. Entre outras coisas, caberá a ele organizar agendas mais "presidenciais" para Lula. Carvalho é a pessoa mais próxima do presidente, entre as que integram o governo, e pode até mesmo vir a ser indicado para presidir o PT e o comando partidário que vai escolher o candidato do partido a sucessão de Lula, em 2010.

Pesa em favor da decisão do presidente a situação dos candidatos do governo nas capitais do chamado "Triângulo das Bermudas" - São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Segundo as pesquisas atuais, os candidatos de Lula podem perder nas três, mesmo se o vencedor for um aliado do Palácio do Planalto.

Este é o caso específico do candidato do PMDB no Rio de Janeiro, Eduardo Paes, empatado tecnicamente nas pesquisas com o candidato verde-tucano Fernando Gabeira. Como deputado, Paes atuou na linha de frente da CPI do Mensalão, onde não poupou adjetivos contra o presidente e seu governo, coisas como "chefe de quadrilha".

Lula ficou sem opção: Gabeira é crítico do governo e se aliou ao PSDB, especialmente aos tucanos ligados a José Serra. Só mesmo o esforço do governador Sérgio Cabral e o fato de Paes integrar um partido da base aliada levou Lula a se manifestar a favor do candidato. O candidato do presidente no Rio era o senador Marcelo Crivella (PRB), ligado à Igreja Universal do Reino de Deus.

Em Belo Horizonte, Lula autorizou o prefeito da cidade, Fernando Pimentel, a levar adiante a aliança com o governador Aécio Neves, do PSDB. Fortalecido, o tucano poderia se tornar uma alternativa em 2010, no caso de frustração dos planos do presidente para sua sucessão. As pesquisas indicam a vitória de um candidato do PMDB, Leonardo Quintão, que é de uma sigla aliada mas não era o nome do presidente.

Resta São Paulo, onde o presidente acha que ainda é possível ganhar. O PT avalia que a eleição será decidida por uma margem entre 3% e 4% - uma diferença que pode tornar Lula uma peça decisiva de campanha.

Gilberto Carvalho chegou à campanha depois da decisão e da veiculação de ataques moralistas contra Gilberto Kassab, no programa de Marta. A decisão, segundo se conta no PT, foi comando político da campanha eleitoral de Marta, que se assustou com o súbito crescimento de Kassab do sábado para o domingo, dia da eleição, quando chegou em primeiro lugar, contrariando todas as pesquisas de opinião divulgadas.

Ontem, Lula disse que Marta vai ganhar. Para o presidente, as pesquisas que apontam sua derrota para Kassab ainda se referem ao começo da campanha pelo segundo turno. Na entrevista a jornalistas brasileiros, ao fim da reunião de cúpula Índia-Brasil-África do Sul, em Nova Déli, Lula, bem-humorado, pediu aos repórteres que lhe perguntavam sobre a campanha de São Paulo para anotar no caderno a certeza da vitória da candidata do PT.

O otimismo do presidente não contagiou a comitiva. Ontem, um dia depois de o ex-presidente do PT, Marco Aurélio Garcia, ter dito que a vitória de Marta seria dificílima, o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, foi na mesma linha. "Vai ser uma eleição muito difícil para a companheira Marta", disse Miguel Jorge, que vota em São Paulo. "Mais de 70% dos eleitores do (Geraldo) Alckmin teriam se deslocado para o Kassab. É possível um movimento de última hora, mas concordo com o Marco Aurélio. É muito difícil."

Na propaganda do horário eleitoral político, a campanha do PT retomou a estratégia do primeiro turno e adotou um linha mais propositiva. Marta Suplicy fez um aceno ao empresariado. Ivo Rosset gravou um depoimento, no qual afirma o apoio à candidata do PT e às ações de sua gestão quando prefeita da capital, entre 2001 e 2004. Ele elogiou os CEUs e disse ter doado 5 mil maiôs para os usuários de cada uma das unidades educacionais. O locutor do programa classificou o empresário como "gente de atitude", com "visão social".(Colaborou Cristiane Agostine, de São Paulo)