Título: Despesas financeiras podem passar de R$ 17 bi
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2008, Investimento, p. D3

A safra de balanços das companhias abertas do terceiro trimestre deve mostrar uma profusão de prejuízos , depois de uma sequência de seis anos de lucros recordes, que coincidiu com o período de crescimento econômico e estabilidade cambial.

O avanço da moeda americana, de 20,3% no terceiro trimestre, vai ter um forte impacto sobre a despesas financeiras das empresas, à medida que as dívidas em dólar são corrigidas pela variação cambial. É considerado um "efeito contábil", já que só haverá pagamento se a dívida estiver vencendo na data.

Uma projeção feito pela empresa de informação financeira Economática, a pedido do Valor, mostra que as despesas financeiras das companhias com ações em bolsa, sem contar Petrobras, Vale e Eletrobrás, podem chegar a R$ 17 bilhões. Esse valor só encontra paralelo na desvalorização cambial de setembro de 2002, quando o dólar disparou às vésperas da eleição presidencial.

Uma despesa financeira dessa proporção, apesar de "contábil", deve levar grande parte do lucro da atividade (receita líquida de vendas menos despesas operacionais) das companhias, que chegou perto de R$ 24 bilhões no segundo trimestre. Significa que vai sobrar muito pouco para a última linha do balanço, o lucro líquido, a parte que cabe aos acionistas.

"Vamos ter uma maré vermelha nos balanços do terceiro trimestre", diz Fernando Exel, presidente da Economática. "O que vimos nos últimos anos foi um período de ouro da economia mundial", afirma, referindo-se ao período que se seguiu à desvalorização de 2002. "Mas agora a situação é diferente, com a perspectiva de desaquecimento." Ou seja, desta vez o contábil pode ser seguido por uma retração no operacional das empresas.

O cálculo na Economática foi feito com base no método de regressão linear, levando em conta a oscilação das despesas financeiras em relação à variação cambial nos últimos nove trimestres.

Basicamente, o resultado financeiro de uma empresa é composto de juros de pagamento de dívidas, das variações cambiais sobre passivos e ativos e dólar e de operações de proteção cambial ("hedge").

O que o passado mostra é uma relação muito próxima entre câmbio e resultado financeiro: dólar em alta significa maior despesa financeira. Se o perfil da dívida não mudou significativamente, essa relação deve ter se mantido no terceiro trimestre

Exel lembra, no entanto, que o estudo não leva em consideração "grandes operações estruturadas com alavancagem", como se viu recentemente com empresas como Sadia e Aracruz. Isso quer dizer que o retrato pode ser ainda muito pior.

Até ontem, cinco empresas haviam divulgado suas demonstrações trimestrais: Localiza, GVT, Brasil Telecom, Taurus e Klabin. O efeito do dólar foi mais acentuado na última, que registrou uma despesa de R$ 560,6 milhões e um prejuízo líquido de R$ 253, 1 milhões.