Título: Nos EUA falta crédito até para concordata
Autor: McCracken, Jeffrey; Glader, Paul
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2008, Finanças, p. C5

O crédito escasseou tanto nas últimas semanas nos Estados Unidos que empresas que precisam pedir concordata não conseguem encontrar o dinheiro necessário para passar por todo o processo.

Este nicho do mercado de crédito, que vale muitos bilhões de dólares e é conhecido como "debtor-in-possession" foi abalado pela recente decisão da General Electric Co., não revelada oficialmente, de cessar, de modo geral, de emprestar para empresas que estejam pedindo concordata ou prestes a tomar essa decisão, segundo vários advogados e consultores financeiros especializados em falências e concordatas. A GE é uma das maiores financiadores mundiais desse tipo de empréstimo para reestruturação, tendo concedido no ano passado um total de US$ 1,75 bilhão para esse fim.

O financiamento DIP é essencial para cobrir os custos com advogados, demissões e outras atividades de reestruturação necessárias para o renascimento de uma empresa. Os bancos quiseram entrar nesse mercado porque os chamados "empréstimos DIP" são os primeiros a serem pagos, e obtêm altas taxas de juros.

A GE Capital já comunicou a numerosas empresas candidatas a empréstimos DIP que não está mais concedendo esse tipo de financiamento, até pelo menos o ano que vem, dizem esses especialistas. Sem essas linhas, muitas empresas talvez não consigam reorganizar suas atividades e sejam forçadas a entrar em liquidação.

Ned Reynolds, porta-voz da GE Capital disse: "Continuamos abertos". Segundo ele, a empresa está honrando seus compromissos atuais. No mês passado os executivos da GE informaram que a demanda por financiamentos DIP pode saltar para até US$ 12 bilhões este ano. No entanto, a volatilidade nos mercados mudou tudo isso.

"Temos que ser muito seletivos neste momento", disse Reynolds. É difícil fixar o preço de uma aquisição, disse ele, pois o custo do financiamento muda desde o momento em que um negócio é proposto até o momento em que ele é fechado. "Neste momento, entre o momento de avaliar e o momento de fechar um negócio, é impossível saber com certeza" qual será o custo, disse ele.

"É uma luta, uma verdadeira luta encontrar financiamento DIP", disse Jonathan Henes, advogado especializado em concordatas da Kirkland & Ellis em Nova York. "Antigamente, por exemplo no início de 2007, os bancos faziam um modelo (...) onde os fundos de hedge e os [fundos de empréstimos] absorviam esses financiamentos, mas agora eles não têm mais capital. Estão fora do jogo. Aquele antigo modelo já se acabou. E os próprios bancos não querem emprestar mais dinheiro para uma empresa em dificuldades."

A Dealogic avalia que este ano os emprestadores entraram com US$ 24,24 bilhões em 40 negócios de reestruturação, um aumento de 38% em relação aos US$ 17,59 bilhões canalizados para 18 negócios feitos em 2007. Os grandes bancos entram com a maior parte do trabalho, enquanto a GE costuma estar entre os principais cinco ou dez financiadores todos os anos.

Os juros para o financiamento de concordata dobraram. Hoje equivalem à Libor, taxa do interbancário de Londres, mais 5% a 7%, em comparação com a Libor mais 2,5%, no ano passado, segundo Henes e outros.

"Quando eu penso na GE Capital e em qual é a especialidade dela, o DIP parece ser a melhor opção", disse Scott Davis, analista do Morgan Stanley. "Se eles recuarem do financiamento DIP será uma grande surpresa."

Várias empresas em dificuldades estão tentando captar financiamento DIP para o caso de precisarem pedir concordata, mas têm lutado para encontrar financistas interessados, dizem especialistas em concordata.

Essas pessoas dizem que uma das empresas nessa situação é a Pilgrim´s Pride Corp., sediada no Texas, a maior produtora de frango dos Estados Unidos, com vendas em torno de US$ 8,5 bilhões por ano e 50 mil funcionários. O porta-voz da Pilgrim´s Pride, Gary Rhodes, informou num e-mail que "não acreditamos que pedir concordata seja do interesse de qualquer um, certamente não para nossos credores, nem para a empresa ou nossos investidores".

A empresa não quis comentar sobre o financiamento DIP.

A incapacidade de conseguir financiamento para entrar ou sair da concordata pode apressar as vendas de ativos ou a liquidação das empresas, dizem especialistas em concordata. Isso também pode vaporizar rapidamente milhares de empregos.