Título: Comando do fundo soberano divide oposição e governo
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2008, Política, p. A7

O deputado Pedro Eugênio (PT-PE) concluiu ontem o projeto de Fundo Soberano do Brasil (FSB) que irá à votação pelo plenário da Câmara dos Deputados, no fim deste mês. Embora tenha incorporado modificações, o substitutivo do relator preserva, na essência, a proposta apresentada em julho pelo governo, permitindo que o novo fundo invista dentro do país, em ativos em moeda nacional. O relator optou ainda por deixar o FSB na alçada do Ministério da Fazenda, em vez de vinculá-lo ao Banco Central.

A vinculação à Fazenda e a possibilidade de aplicação de recursos no Brasil - e não só no exterior - são dois dos pontos do texto original mais criticados pelos partidos de oposição, que temem uso político-eleitoral do novo instrumento, em favor do candidato do presidente Lula à sua sucessão, em 2010. Na tentativa de evitar um fundo com tais características, o Democratas até já apresentou um projeto alternativo, na forma de emenda substitutiva global.

Para o deputado Pedro Eugênio, diante da crise internacional de crédito e das expectativas de desaceleração da atividade econômica, só faz sentido criar o fundo soberano agora, se ele servir como um canal de fomento a projetos privados de investimento dentro do país.

Eugênio reconhece que o FSB foi concebido num contexto diferente do atual, de excesso de entrada de dólares e de valorização do real, em princípio para constituir ativos no exterior, para formar poupança fiscal. A atual crise e a consequente mudança de cenário econômico só mostram, na visão do relator, o quanto foi acertada a decisão do governo ao propor leque maior de possibilidades no que se refere às aplicações do fundo.

O deputado e ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci (PT-SP), concorda. Embora a maioria dos países faça diferente, ele entende que a constituição de uma poupança fiscal anticíclica também pode ser feita por intermédio da aquisição de ativos dentro do país.

O governo tem pressa de criar o FSB ainda este ano, para assegurar que o excesso de superávit primário esperado em 2008 não precise ser considerado como tal e sim como uma despesa com a constituição de uma reserva fora da contabilidade do setor público. Só assim, o recurso poderá ser usado em anos seguintes sem afetar negativamente futuros resultados fiscais da União.

Pedro Eugênio entende que não criar o novo fundo ainda em 2008 implica subaproveitar o excedente fiscal desse ano. "No máximo, o excesso de superávit primário servirá para abater a dívida", diz ele, lembrando que o cumprimento das metas pura e simplesmente, sem excesso, já assegura queda da dívida.

A intenção do governo é aportar ao FSB R$ 14,244 bilhões, montante de superávit primário que deve exceder à meta (3,8% do Produto Interno Bruto para o consolidado do setor público). Para tanto, um projeto de crédito suplementar ao orçamento de 2008, no mesmo valor, foi apresentado anteontem ao Congresso.

O ajuste da lei orçamentária à criação do FSB só foi efetivamente encaminhado pelo Poder Executivo depois de um acordo, também anteontem, em torno da pauta de votações. O governo concordou em retirar a urgência constitucional atribuída ao projeto, em troca da votação de diversas medidas provisórias, com a condição de que o FSB voltará à pauta dia 29 de outubro.

Exceto no caso de decisão contrária do plenário, a versão apresentada ontem pelo relator tem preferência sobre a do governo e a da oposição (emenda do DEM). Entre as poucas alterações promovidas por Pedro Eugênio em relação ao texto original, está a definição, já na lei, da composição do conselho deliberativo do FSB, que antes seria definida por decreto do presidente da República.

O conselho do fundo será formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento (atualmente Guido Mantega e Paulo Bernardo) e, ainda, pelo presidente do Banco Central (hoje, Henrique Meirelles). O texto do relator também explicita a possibilidade de que vários bancos federais atuem como operadores do FSB.