Título: Preso confirma suborno
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 06/02/2010, Cidades, p. 42

Em depoimento à PF, Antônio Bento diz que o dinheiro entregue por ele a Sombra lhe foi repassado pelo assessor e sobrinho do governador

O flagrante feito pela PF na quinta-feira: R$ 200 mil em uma sacola

Carlos Moura/CB/D.A Press - 4/2/10 Geraldo Naves, que teria negociado propina, já não é mais deputado

Trechos do depoimento prestado por Antônio Bento na última quinta-feira

As declarações de Antônio Bento da Silva, preso pela Polícia Federal na manhã de quinta-feira, reforçam a versão apresentada pelo jornalista Edson Sombra sobre a suposta tentativa de suborno de que se diz vítima. Durante depoimento na Superintendência da Polícia Federal, Bento contou aos delegados que procurou Sombra a pedido de um assessor de Arruda, que falava em nome do governador. O motivo da intermediação, segundo disse, era o de propor ao jornalista que ele assinasse uma declaração admitindo que os vídeos entregues pelo ex-secretário de Relações Institucionais, Durval Barbosa, não tinham validade porque haviam sido manipulados. A sacola com R$ 200 mil apreendida no momento do flagrante da polícia na Torteria de Lorenza do Sudoeste seria o pagamento em troca da assinatura de Sombra ao documento.

No relato à Polícia Federal, Bento diz que foi procurado por um assessor de Arruda chamado Rodrigo. Trata-se de Rodrigo Arantes, sobrinho do governador que trabalha como uma espécie de secretário pessoal do político. De acordo com Bento, há aproximadamente 20 dias, ele foi contatado por Rodrigo que lhe pediu para fazer a suposta abordagem a Edson Sombra. O desfecho da negociação se deu com a prisão de Bento e a abertura de um novo inquérito que pode ser incluído no bojo do processo em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que deu origem à Operação Caixa de Pandora.

A Polícia Federal foi avisada sobre a possibilidade da tentativa de suborno em 21 de outubro passado por Sombra, desde quando começou a monitorar os passos de Antônio Bento. Mas conversas entre Sombra e supostos interlocutores de Arruda começaram algumas semanas antes do contato com a PF. No dia 9 de janeiro, o jornalista teria sido procurado pelo então distrital Geraldo Naves (DEM) em sua casa. Naves levava consigo um bilhete escrito supostamente por Arruda ¿ o bilhete está sendo periciado ¿ com as seguintes frases ¿gosto dele¿, ¿sei que tentou evitar¿, ¿quero ajuda¿, ¿sou grato¿, ¿Geraldo tá valendo¿ e ¿GDF OK¿. Segundo Sombra, a carta foi uma exigência dele para ter certeza de que era Arruda quem estava fazendo a proposta. ¿Eu precisava de uma garantia. Exigi a carta.¿

O bilhete deveria voltar com Geraldo Naves. Mas Sombra pressionou o então distrital para que deixasse a carta como uma prova da disposição de Arruda em prosseguir com as tratativas. A mensagem foi parar nas mãos do até então chefe da Agência de Comunicação do GDF, Weligton Moraes, por iniciativa de Sombra. Esse chegou a reclamar sobre o ¿amadorismo¿ de Geraldo Naves na intermediação. Tal conversa teria ocorrido no escritório de Weligton Moraes, no oitavo andar do Liberty Mall, encontro que gerou uma das imagens gravadas e entregues por Durval à PF. Na ocasião, Sombra disse a Weligton que telefonasse para o governador em sua presença. Foram várias tentativas até que o secretário conseguiu, segundo conta o autor da denúncia, o contato com o próprio Arruda. Sombra teria dito a seguinte frase ao governador: ¿O que nós fizemos juntos nos habilita a ligar um para o outro. E, a partir de agora, o interlocutor dessa negociação é o dono deste telefone¿.

Mais um interlocutor Dez dias depois do encontro com Weligton, Sombra se disse surpreso com a visita em sua casa de Antônio Bento, um velho conhecido e funcionário. Bento é gerente comercial do semanário O Distrital, controlado por Sombra. Funcionário aposentado da CEB, ele trabalhou na campanha de Arruda para governador e foi nomeado para um cargo no conselho do Metrô em 2007. Segundo Sombra, o amigo se apresentou como mais um interlocutor de Arruda na suposta negociação de propina. Em uma das conversas com Bento, essa também gravada pelo jornalista, ele teria lido os tópicos exigidos por Arruda aos quais o jornalista deveria atender para o acordo ser fechado. Na negociação, deveriam ser incluídos ¿um vídeo de Valério Neves¿, braço direito do ex-governador Joaquim Roriz (PSC), ¿mais fitas incriminando Arruda¿ e ¿informações da PF¿.

Segundo Edson Sombra, o pacote foi fechado em R$ 3 milhões. Os R$ 200 mil seriam a primeira parcela. Uma outra parte do dinheiro seria paga depois do depoimento confirmando a versão combinada com o governo e o restante, diluído nos próximos três meses.

Sombra conta que, além do dinheiro, teria sido oferecida a ele uma conta garantida na Agência 212 do BRB. O jornalista disse que chegou a ser contatado por um gerente do banco interessado em facilitar a abertura de crédito em seu nome, operação autorizada ¿por ordens superiores¿. De acordo com o jornalista, que na quinta-feira prestou depoimento à PF, os originais dos vídeos e documentos entregues aos delegados e levados aos promotores de Justiça que acompanham o caso confirmam com evidências materiais os detalhes dos encontros e conversas telefônicas mantidas nas últimas semanas.

OAB estuda afastamento de Arruda

Luisa Medeiros

Antônio Cruz/ABr Caputo e Ophir, presidentes da OAB-DF e da OAB Nacional: providências

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) poderá pedir na Justiça o afastamento de José Roberto Arruda (sem partido) do comando do Executivo local. Caso seja comprovada a tentativa do governador de atrapalhar as investigações da Operação Caixa de Pandora, a entidade entrará com uma ação civil pública para tirá-lo do cargo. O crime de obstrução de investigação é grave e, uma vez constatado, Arruda corre o risco até de ser alvo de um pedido de prisão preventiva. A possibilidade de impedi-lo de governar surgiu após denúncia do jornalista Edmilson Edson dos Santos, o Edson Sombra. Ele acusa o governador de oferecer suborno de R$ 3 milhões, por meio de emissários, para que mudasse o próprio depoimento na Polícia Federal (PF). Antônio Bento da Silva, o suposto interlocutor de Arruda, foi preso na quinta-feira após entregar a Sombra o que seria a primeira parcela do dinheiro.

Em meio à série de denúncias, os presidentes nacional da OAB, Ophir Cavalcante, e da OAB-DF, Francisco Caputo, defendem que Arruda se afaste voluntariamente do governo. ¿Se o governador Arruda e os deputados tivessem compromisso com a sociedade, eles já teriam se afastado. Num governo sério, a pessoa teria autocorreção para dizer que não pode ficar. Mas lamentavelmente, essa postura não existe. É a cultura do empurra para a frente. É a cultura de que nada vai acontecer¿, afirmou Ophir. ¿Fatos menos graves justificariam o afastamento voluntário dele. O governador faria um grande serviço a sociedade se ele se afastasse do cargo e permitisse que as investigações corressem de uma forma mais séria¿, argumentou Caputo.

O presidente da OAB-DF esclareceu, entretanto, que a Ordem ¿ em âmbitos nacional e local ¿ só vai agir quando tiver provas suficientes sobre a suposta interferência de Arruda nas investigações do Inquérito nº 650, em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O fato de o governador ser o autor do bilhete entregue à PF por Sombra, cujo conteúdo são frases curtas como ¿quero ajuda¿ e ¿Geraldo tá valendo¿, não serviria como atestado de culpa. ¿Seria prematuro agirmos só por base nisso¿, disse.

Bloqueio de bens Ainda ontem, a OAB entrou na Justiça Federal com uma ação civil pública para bloquear os bens do governador Arruda, 10 distritais da Câmara Legislativa e dos secretários do GDF citados nas denúncias reveladas por Durval Barbosa. Francisco Caputo, explicou que o ação tem o objetivo de assegurar parte do dinheiro que pode ter sido desviado dos cofres públicos para alimentar o suposto esquema de corrupção e pagamento de propina envolvendo o Executivo e o Lagislativo locais, além de empresários da capital. ¿A ação é para preservar e garantir que a sociedade seja ressarcida caso seja comprovado o desvio de dinheiro público¿, disse ele. O juiz Pablo Zuniga Dourado, da 3ª Vara da Justiça Federal de Brasília, deve analisar a matéria, que tem pedido de liminar, até a próxima semana.

Se o governador Arruda e os deputados tivessem compromisso com a sociedade, eles já teriam se afastado¿

Ophir Cavalcante,presidente nacional da OAB

Naves e Weligton saem

A denúncia de suborno da última quinta-feira provocou mais baixas no governo e na base aliada, que vêm perdendo nomes desde a deflagração da Operação Caixa de Pandora, em novembro passado. A saída às pressas do então deputado Geraldo Naves do cargo deixou o Democratas (DEM) sem líder na Câmara Legislativa. O então distrital teve de deixar o mandato depois que o jornalista Edson Sombra disse à Polícia Federal (PF) que Naves entregou a ele um bilhete comprometedor de autoria do governador José Roberto Arruda (sem partido). Também citado por Sombra, o chefe da Agência de Comunicação do GDF, Weligton Moraes, avisou que já saiu do GDF.

O então deputado distrital admitiu a entrega do papel, mas negou que o texto tratava de uma suposta tentativa de suborno. Diante do escândalo envolvendo Naves, a solução do partido foi convencer Raad Massouh (DEM) a pedir a vaga de deputado que já tinha rejeitado. Ele toma posse nesta segunda-feira. O primeiro suplente(1) deve preencher o lugar de Naves ¿ que era segundo suplente ¿ também na Comissão Parlamentar de Inquérito da (CPI) da Codeplan. Quem ganhará de bandeja duas posições estratégicas na Casa será Eliana Pedrosa (DEM). A partir da próxima semana, ela será presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e integrante da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar ¿ lugares ocupados por Naves. Ele não retornou às ligações da reportagem ontem.

O então chefe da Agência de Comunicação do GDF, Weligton Moraes, que aparece em um vídeo gravado por Sombra, também saiu do governo. Apesar de afirmar que avisou ainda em dezembro que deixaria o cargo, somente ontem divulgou que não vai mais voltar ao trabalho após as férias, coincidentemente iniciadas nesta sexta-feira. Weligton negou ao Correio que fosse um dos interlocutores de José Roberto Arruda.

¿Não existe nenhum fato que comprove minha interlocução com o governador. O suposto interlocutor é esse aí (referindo-se a Rodrigo Arantes)¿, disse. Weligton contou que no início de janeiro Sombra o procurou e, no meio da conversa, teria dito que gostaria de encontrar Arruda. ¿Ele estava tramando essa sujeira para mim. Queria me colocar nessa intriga. Mas de imediato minha reação foi negar essa interlocução¿, defendeu-se.

1 - Mandato O titular do mandato é Paulo Roriz, que se licenciou para assumir a Secretaria de Habitação do GDF.