Título: Setor rural terá mais R$ 2,5 bi e financiamento imobiliário, R$ 4 bi
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 21/10/2008, Finanças, p. C2

Aumentar a oferta de crédito rural em R$ 2,5 bilhões e usar de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões para a estimular a construção civil são as mais novas iniciativas do governo para combater os efeitos da crise financeira internacional sobre a atividade econômica brasileira.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, anunciaram ontem, em São Paulo, o aumento de 65% para 75% do direcionamento dos recursos depositados em poupança rural para crédito para o setor agrícola.

Outra medida, que deverá ser definida nos próximos dias, é um programa de apoio do governo ao setor de construção.

Segundo disse o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, no início da noite, ao participar de evento do setor da construção, os recursos serão repassados via financiamento do BNDES e Caixa Econômica Federal.

Adicionalmente, Mantega e Meirelles anunciaram que Banco do Brasil e Caixa serão estimulados a aumentar a oferta de crédito ao consumo e capital de giro para as empresas.

O diagnóstico do governo é que a crise internacional reduziu as alternativas de financiamento para empresas de construção civil, afetando principalmente o capital de giro para tocar os empreendimentos já iniciados.

Até 2007, o mercado de capitais viveu uma onda de venda de ações pelas incorporadoras. Boa parte dos recursos levantados nessas operações foi direcionada à aquisição de terrenos para o lançamento de empreendimentos. A expectativa das empresas era, num segundo momento, fazer novas ofertas de ações para financiar as obras.

A crise internacional afetou o setor de construção civil, fazendo com que algumas empresas perdessem mais de 90% de seu valor de mercado. Para o governo, mesmo num cenário mais adverso, a maior parte das empresas vai continuar a operar. Mas, existe um grupo reduzido, algo entre quatro ou seis incorporadoras, que pode enfrentar problemas de caixa para para terminar os empreendimentos já iniciados.

As dificuldades vividas por essa parcela do mercado, na visão de especialistas na área, em tese não teria força para virar uma crise sistêmica. Mas poderia estimular a desconfiança do público em relação a empresas sólidas do setor, reduzindo o ritmo de expansão da construção civil. Para evitar o contágio, diz a fonte, seria bom o governo ter um plano de ação definido, para agir com rapidez caso o pior cenário se concretize.

Um especialista diz que a crise levou a uma atitude mais cautelosa dos bancos privados na concessão de empréstimos. Mas é improvável que isso leve a um corte nos financiamentos dos empreendimentos já em andamento. Não faria sentido do ponto de vista jurídico porque os contratos prevêem a liberação dos recursos ao longo da construção. E, do ponto de vista econômico, faria menos sentido ainda, porque uma forma de mitigar riscos no setor de construção civil é justamente terminar as obras. Quando a obra termina, os bancos concedem financiamentos aos mutuários finais e recebem das incorporadoras.

A visão desse especialista é que, no pior dos cenários, a crise internacional não levaria a uma suspensão dos financiamentos aos mutuários, mas apenas a uma postura mais defensiva. Os bancos, por exemplo, poderiam passar a oferecer financiamentos que cobrem 80% dos imóveis e não 100%.

Nesse cenário, a Caixa Econômica Federal continuaria emprestando, com a força de uma instituição que responde por cerca de um terço dos empréstimos com recursos da poupança, ou 50% dos empréstimos totais, incluindo o FGTS. A intenção da Caixa é expandir entre 20% e 25% sua carteira de empréstimos em 2009 em relação aos R$ 23 bilhões aplicados neste ano. O mercado também seria puxado pela competição do Banco do Brasil, que inaugurou recentemente sua operação no crédito imobiliário e pretende ter uma carteira de R$ 3 bilhões até o fim de 2009.

Segundo Bernadete Pinheiro Coury, superintendente nacional de Habitação da Caixa Econômica Federal, a entidade não elevará os juros, nem alterará os prazos do financiamento imobiliário. "Não vamos reduzir as taxas do crédito que usa os recursos do FGTS e nem o da poupança", afirmou ontem em evento sobre o setor de construção em São Paulo. A CEF já foi responsável por 90% da concessão de crédito no setor. Com a atuação crescente dos outros bancos, hoje responde por 50% do volume total, mas ainda continua sendo o principal agente de fomento do setor.

Bernadete classifica como positiva a atitude de cautela que vem sendo adotada pelo setor, como a redução de lançamentos. "Seria até irresponsável não imaginar uma redução da velocidade da oferta e da demanda." As taxas de financiamento à produção - concedida às empresas - também não devem ser alteradas.

José Manoel Lopes, superintendente de crédito imobiliário do banco Santander, também disse que o grupo, incluindo o banco Real, manterá as taxas do crédito imobiliário. "Esse é o grande mercado de crédito e ganhou importância estratégica no banco, com reporte direto à presidência", afirmou. Na opinião de Lopes, o mercado de crédito imobiliário no Brasil está só começando e não será afetado por uma eventual crise do setor. "Só quatro de cada dez apartamentos lançados são financiados. Há espaço para o crédito imobiliário crescer sem que haja crescimento do setor", completa. Lopes afirma que a captação da poupança continua crescendo e que não há previsão de falta de funding para o setor no curto e médio prazo, como chegou a se falar. *Do Valor Online