Título: Múltis investem US$ 492 bi em inovação
Autor: Rosa, João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 21/10/2008, Tecnologia & Telecomunicações, p. B3

O tipo de produto varia: pode ser um carro novo, um medicamento mais eficaz ou um software que dá novos usos ao computador. Independentemente da área de atuação, porém, as maiores companhias do mundo continuam a investir fortemente em inovação. Carol Carquejeiro / Valor Letícia Costa, vice-presidente da Booz & Company: além de atrair recursos na área, é preciso saber exportá-los

Um estudo inédito da consultoria Booz & Company, batizado de Innovation 1000, mostra que no ano passado as mil empresas que mais investem em pesquisa e desenvolvimento (P&D) gastaram US$ 492 bilhões para renovar seus produtos, o equivalente a um crescimento de 10% em relação a 2006.

A lista, na qual só entram empresas de capital aberto, é liderada pela Toyota, que investiu US$ 8,4 bilhões em inovação em 2007. Na relação das 10 mais também estão General Motors, Pfizer, Nokia, Johnson & Johnson, Ford, Microsoft, Roche, Samsung e GlaxoSmithKline. Na posição de número mil, encerrando o ranking geral, está a coreana Dongbu Hiteck, com um investimento de US$ 53,4 milhões.

Três indústrias concentram praticamente dois terços dos investimentos globais em P&D: a de computadores e eletrônicos (29% de participação) a de saúde (22%) e de automóveis (16%).

O Brasil tem quatro representantes na lista das mil empresas: a mais bem posicionada é a Petrobras, que aparece em 117º lugar, com um investimento anual de US$ 810 milhões. As demais são Vale (140º posição), Embraer (314º ) e Copel (985º ).

"Um crescimento de 10% de um ano para outro é um resultado forte, mas é preciso lembrar que até pouco tempo atrás havia muita liquidez e a economia mundial crescia rapidamente", diz Letícia Costa, vice-presidente da Booz & Company no Brasil.

A boa fase da economia também explica, em parte, porque os orçamentos de P&D caíram em relação ao faturamento das companhias. Em 2002, a média de investimentos na área era de 4,4% da receita. No ano passado, esse número era de 3,7%. "Nos últimos três a quatro anos, as vendas cresceram muito rápido e, nesse cenário, é normal que a média diminua", explica Letícia.

O estudo ajuda a desfazer um mito: o de que as empresas que investem mais em P&D também são mais lucrativas. "Do ponto de vista estatístico, não conseguimos encontrar nenhuma correlação entre os gastos em inovação e os resultados financeiros", diz Letícia. "Isso significa que tem gente que gasta bem e gente que gasta mal."

O levantamento mostra, no entanto, um outro tipo de interdependência: as empresas que investiram mais de 60% de seu orçamento de P&D fora de seus países de origem apresentaram desempenho superior em vários itens, incluindo retorno ao acionista, margem operacional, crescimento do valor de mercado e retorno sobre os ativos. "A pesquisa mostra que o cenário da globalização mudou muito nos últimos anos", diz a executiva da Booz & Company.

Sob esse novo desenho, com fronteiras cada vez mais flexíveis, a conclusão da Booz & Company é de que o Brasil tem pela frente uma série de oportunidades de investimento externo, até porque algumas das principais vantagens oferecidas por outros países começam a enfraquecer.

É o caso do custo baixo do pessoal especializado, como engenheiros e técnicos, que ajudou a Índia a se transformar em um centro global de serviços de software. Em 2005, o salário médio de um engenheiro indiano representava 53% do valor pago a um profissional americano. Neste ano, a relação já é bem menor, por volta de 65%, compara Letícia. "O diferencial de mão-de-obra tende a diminuir", afirma a executiva. "Custo baixo, hoje, não é necessariamente o principal fator de investimento."

Uma prova disso, retirada de um levantamento feito com 184 empresas que participaram do estudo, é que os Estados Unidos receberam US$ 42,6 bilhões em investimentos de companhias sediadas em outros países. É surpreendente, mas isso significa que 40% do dinheiro gasto em pesquisa e desenvolvimento nos EUA em 2007 veio de fora do país.

A razão, explica a vice-presidente da Booz & Company, é que as companhias que têm aspirações globais perceberam que precisam ficar perto de seus mercados consumidores na hora de desenvolver um produto. E sob essa visão, é praticamente impossível ignorar o mercado americano.

A lição que se tira disso é que a saúde da inovação não depende só de quanto um país recebe em investimentos internacionais em P&D, mas se suas próprias empresas já começaram a fazer o caminho inverso. Esse termômetro é expresso pelo chamado saldo líquido da inovação: o resultado de quanto se recebe do exterior menos o que se investiu lá fora.

No Brasil, esse saldo em 2007, segundo a pesquisa, foi de US$ 2,3 bilhões. Para comparar com outros países emergentes, na Índia o saldo foi de US$ 12,9 bilhões e na China, de US$ 24,7 bilhões.

O estudo dá indicações de que quanto maior é esse saldo, mais atrativo é o ambiente do país para as ações de pesquisa e desenvolvimento. Tome-se o caso da indústria automobilística. Por uma série de motivos - como a longa tradição do setor no Brasil, o mercado interno atraente e as qualificações dos engenheiros brasileiros -, o país recebe 1% de todo o investimento mundial da indústria de automóveis.

O número, semelhante ao do México, é relevante, mas está abaixo dos de seus principais concorrentes internacionais na atração de recursos: a Índia recebeu 2% dos investimentos em inovação das montadoras em 2007 e na China, esse percentual alcançou 4%, revela a pesquisa.