Título: Crédito privado sofre com saques e oscilação de cotas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 22/10/2008, Investimentos, p. D2

A forte alta dos juros dos papéis de crédito privado - CDBs, debêntures e cotas de fundos de recebíveis (FIDCs) - no mercado secundário está provocando grandes oscilações nas cotas de vários fundos de investimentos. Carteiras em que a participação desses papéis é maior precisam ajustar os preços dos ativos - que caem à medida que o juro sobe - à última cotação de mercado e isso provoca perdas. Para ajudar, os saques dessas carteiras - fundos de renda fixa tradicionais ou DI e multimercados de crédito privado - seguem elevados, o que força os gestores a vender os papéis, aumentando as perdas de todos os outros fundos.

Os resgates refletem em parte a oscilação das cotas e em parte o receio dos investidores com a saúde das empresas emissoras. A oscilação fez o setor recentemente aumentar o rigor na marcação a mercado dos papéis.

Nas últimas quatro semanas encerradas dia 17, os fundos DI, renda fixa e multimercados tiveram resgates líquidos de R$ 20 bilhões, segundo dados do site Fortuna. Desse total, 37%, ou R$ 7,5 bilhões, referem-se a resgates de fundos de crédito privado. Só na última semana, quando as categorias perderam R$ 9,355 bilhões, os fundos de crédito privado responderam por R$ 5,172 bilhões da saída. "Os números desses fundos de crédito privado acabam não aparecendo, porque eles ficam perdidos no meio dos outros, já que não há uma categoria específica", diz Marcelo D"Agosto, do Fortuna.

Além disso, há parcelas expressivas de crédito privado em grandes fundos de renda fixa de varejo - que podem ter até 50% da carteira em papéis privados -, o que provoca oscilações nas cotas, como ocorreu com o Itaú na semana passada. O fundo passa a render mais depois da perda, ajustado ao juro mais alto dos papéis, mas o investidor em geral se assusta e sai.

Vários bancos carregavam debêntures e FIDCs em suas tesourarias, financiando-as com dinheiro captado em CDBs, explica Fernando Meibak, da distribuidora Sunrise Investments. Mas, com o aperto de liquidez, o juro do CDB subiu e passou a ser maior que o da debênture, e o banco precisa vendê-la no mercado. Há também bancos que foram vendidos, caso da Lehman Brothers, e os novos donos não querem manter os FIDCs.

Há ainda bancos estrangeiros que simplesmente querem fazer caixa ou sair do risco de crédito, mesmo com prejuízos. "E o juro pago na debênture ou no FIDC, que era de 105%, 108% do CDI, pula para 115% do CDI, 120% do CDI, e aí o administrador precisa ajustar as cotas de todas as carteiras", diz Meibak. Ao mesmo tempo, operações novas são obrigadas a subir as taxas para competir com o que está no mercado secundário, realimentando o processo.

Para Meibak, a marcação a mercado dessas oscilações pode jogar gasolina na fogueira da crise de crédito do mercado, levando fundos de grandes bancos a parar de comprar papéis de bancos menores e empresas por conta dos saques. "O governo já criou condições especiais para quem comprar ativos de fundos, mas deve continuar atento", alerta. Nos EUA, o governo americano anunciou ontem um pacote de US$ 541 bilhões para ajudar os fundos de curto prazo.