Título: Antes de anúncio oficial, construção já reclama de medidas
Autor: D"Ambrosio, Daniela; Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 23/10/2008, Brasil, p. A5

O setor de construção viveu ontem um dia de indefinição e de muita especulação. Sem uma confirmação oficial do governo sobre as medidas que serão adotadas para o segmento, representantes da indústria imobiliária analisavam o que pode vir a ser o pacote de ajuda ao setor, com base nas afirmações feitas pelo ministro da Fazenda Guido Mantega pela manhã. Apesar das incertezas, porém, houve um consenso: o discurso do governo não agradou e vai na contramão das reivindicações do setor.

Segundo o ministro Mantega, a Caixa Econômica Federal irá vai criar um banco de investimentos, que terá uma subsidiária exclusiva para comprar participações de empresas de construção civil, a Caixa Participações (CaixaPar). "A Caixa poderá ter ações de construtoras, que se capitalizaram no ano passado, mas podem estar passando por problemas de liquidez", disse o ministro. ""É uma resposta para garantir a continuidade dos projetos imobiliários em curso." O ministro explicou que esse é um dos instrumentos criados pela medida provisória 443, divulgada ontem, com medidas para minimizar os efeitos da crise financeira sobre os bancos e setores da economia real brasileira.

Reunidos no Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic), em São Luís (MA), representantes do setor aguardavam, ontem, a presença do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, para elucidar as medidas para o setor. Coutinho, porém, não pôde comparecer à abertura do evento. Segundo o BNDES informou, as medidas para a área de construção ainda não estão prontas.

Nos corredores do evento, a repercussão das medidas era negativa. O setor reivindica garantia de crédito -com as atuais taxas - tanto para o consumidor final, através da poupança e do Sistema Financeiro de Habitação, quanto para financiar a produção. "Se for isso que já apresentaram é totalmente insensato. As empresas não querem ser sócias do governo", disse João Crestana, presidente do Secovi-SP. "Queremos que a confiança no setor continue firme e que haja crédito para as 100 mil empresas do setor e não que o governo favoreça poucas que foram para a bolsa e não fizeram a lição de casa."

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (CBIC), Paulo Simão, foi na mesma linha. "Nada disso foi discutido conosco, queremos soluções de mercado, nada que envolva o governo", criticou ele. Simão disse que o papel ideal do governo nesse momento seria dar liquidez para o setor da construção civil. "Se as empresas com melhor saúde financeira decidissem, com esse capital, comprar outras empresas em dificuldade, tudo bem, seria uma solução de mercado. Eu assumiria esse risco", explicou Simão.

O presidente da CBIC disse que a Caixa Econômica Federal tem todo o direito de criar uma subsidiária - A CaixaPar, como definido na MP 443. "Mas a Caixa tem que ter em mente que ela não é um banco de fomento, como o BNDES. São funções distintas", disse Simão. Ele reconhece que a CEF é um parceiro fundamental nesse bom momento vivido pelo setor imobiliário brasileiro. Juntamente com outras instituições, a CEF tornou possível o crescimento nominal de 26,7% de operações de crédito para o setor de habitação.

Uma das principais queixas é a proposta de a CEF Par, em casos de necessidade, comprar ativos de empresas que tenham ações na Bolsa. "Isso vai beneficiar o setor? Não. Vai beneficiar meia dúzia de empresas. Não é uma solução estrutural."

O executivo de uma empresa do setor com ações em bolsa avalia que as medidas anunciadas por Mantega não são ruins, mas não são essenciais. "Parece mais vontade de fazer barulho sem conhecer as necessidades reais do segmento." Na sua opinião, o setor precisa de garantia de crédito, de manutenção do nível de FGTS e da desburocratização e maior eficiência da Caixa Econômica Federal, por exemplo. Ele afirma que poderia usar uma linha de crédito para comprar projeto de empresas em dificuldades desde que fosse um dinheiro barato.

Para Rogério Chor, da Associação dos Dirigentes de Empresas do Setor Imobiliário (Ademi) do Rio de Janeiro, o governo está atacando o lado errado da questão. "Precisam assegurar que o comprador continue no mercado". Para ele, o setor não está numa situação tão negativa quanto se diz. "Não se pode esquecer que foram três anos de enorme expansão." (Com Valor Online