Título: Estatização deve gerar batalhas política e judicial
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Fonte: Valor Econômico, 23/10/2008, Internacional, p. A11

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, deverá enfrentar uma batalha política e judicial para aprovar a estatização dos fundos de pensão do país.

O polêmico projeto de lei encaminhado ao Congresso que prevê a estatização dos fundos privados deve encontrar resistência no Congresso. E promete também produzir uma lista de queixas na Justiça por parte dos segurados dos planos privados e das administradoras de fundos que venham a se sentir prejudicados com a medida.

No primeiro semestre, a decisão do governo de elevar as taxas de exportação de grãos desencadeou uma sucessão de protestos e bloqueios de estradas realizados por ruralistas argentinos. Depois de meses de impasse, Cristina decidiu levar a disputa ao Congresso e acabou sendo derrotada no Senado.

"O governo tem maioria nas duas casas, mas a votação do novo projeto será bastante dura", prevê Dante Sica, diretor geral da consultoria Abeceb, de Buenos Aires.

No campo jurídico, o presidente da União de Administradoras de Fundos de Aposentadorias e Pensões (UAFJP, na sigla em espanhol), Sebastián Palla, disse ontem que a entidade tomará "todas as medidas necessárias para proteger os afiliados e não descartou recorrer a ações legais na Argentina e em tribunais internacionais. A entidade congrega as dez administradoras de fundos de pensão do país.

A medida, no entanto, agrada as centrais sindicais, governistas e até alguns setores da oposição que dizem que a privatização parcial do sistema de previdência, feita em 1994, afetou as contas públicas e teve seu funcionamento marcado por problemas de regulação.

Ontem deputados da oposição previam que na Câmara o texto deverá ser aprovada. A estratégia oposicionista seria, porém, apostar na aprovação de uma regra que proíba o governo de empregar os recursos dos fundos de pensão privados para pagar dívida.

Analistas, entre eles Sica, que foi secretário da Indústria do governo Eduardo Duhalde, se dizem convencidos de que a intenção do governo ao propor a estatização é usar os US$ 29 bilhões dos fundos privados para reforçar seu caixa.

As especulações em torno do projeto derrubaram a Bolsa de Buenos Aires pelo segundo dia seguido. Na terça, as perdas foram de 11%; ontem a queda chegou 18%.

O governo sustenta que a intenção com a estatização dos fundos é proteger os argentinos que optaram por contribuir para o sistema privado de aposentadoria. Desde 1994, o país tem os dois modelos - o público e o privado - de contribuição compulsória para aposentadoria. O argumento da presidente Cristina Kirchner ao apresentar o projeto foi que os fundos privados estavam acumulando perdas significativas e pondo em risco o pagamento futuro dos benefícios.

A proposta deixa ainda algumas questões abertas: não está claro, por exemplo, se o novo sistema público de previdência, que incorporará os dois modelos atuais, poderá investir na bolsa argentina, como vinham fazendo os fundos privados até agora. Não está claro tampouco qual será o mecanismo de compensação dos fundos que passarão para as mãos do Estado.

(Com agências internacionais)