Título: Bancos precisam de capital
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 23/10/2008, Opinião, p. A13

Uma vez que o primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, decidiu recapitalizar os bancos locais, os EUA e outros países europeus não tinham alternativa a não ser seguir o mesmo caminho. Isso não significa que o governo federal dos EUA deveria tentar administrar os bancos que se juntarem ao programa de US$ 250 bilhões.

Não participar esteve longe de ser uma opção para as nove grandes instituições cujos executivos-chefes foram chamados a uma sala de reuniões no Departamento do Tesouro para encontrar-se com o secretário da pasta, Henry Paulson, em 13 de outubro. Em resumo, os nove - Citigroup Inc., Goldman Sachs Group Inc., Bank of America, Merrill Lynch & Co., Wells Fargo & Co., JPMorgan Chase & Co., Morgan Stanley, State Street Corp. e Bank of New York Mellon Corp. - foram informados que aceitar os US$ 125 bilhões iniciais de capital do pacote do governo era a coisa patriótica a se fazer.

"Estas são instituições saudáveis e deram esse passo para o bem da economia dos Estados Unidos", disse Paulson. E agora devem cumprir seu dever, usando a maior base de capital para expandir a concessão de empréstimos.

É exatamente do que a economia precisa, embora haja um perigo.

Em editorial, em 14 de outubro, o "The New York Times" defendeu que "o Tesouro deveria também insistir em uma supervisão governamental intensificada para assegurar que uma concessão sólida de empréstimos seja retomada - e que a concessão imprudente de empréstimos não".

"Os reguladores do governo precisam examinar freqüentemente as operações das firmas resgatadas, diariamente se necessário."

O Tesouro deveria elaborar um conjunto de regras para definir "concessão imprudente de créditos"? Boa sorte.

Mesmo ante uma crise econômica, a última coisa que alguém iria querer é centrar-se em evitar todos os riscos ao se conceder créditos. O bom funcionamento do crédito sempre envolve algumas perdas, como quase qualquer economista poderia dizer.

Nenhum regulador do governo deveria tomar decisões de crédito para os bancos, a não ser em termos gerais. No extremo, seria possível imaginar um eleitor ligando a um membro do Congresso para reclamar que um banco com capital do governo estava por cortar sua linha de crédito. Ou, talvez, outro cliente queixando-se de que não consegue um empréstimo para sua empresa e vários empregos estão em jogo.

Talvez seja um exagero, talvez não.

Isso não quer dizer que não deva haver mais supervisão do governo. A falta de regulamentação e supervisão contribuiu para a bagunça na qual o sistema financeiro se encontra. Ambas precisam ser endurecidas, independente de haver dinheiro dos contribuintes em jogo ou não. O plano geral de resgate, de US$ 700 bilhões, que inclui os US$ 250 bilhões em capital novo para os bancos, traz a exigência de que até o fim de abril o Tesouro avalie a eficiência do sistema regulador financeiro e recomende alterações.

Enquanto isso, os proprietários residenciais atrasados nos pagamentos de suas hipotecas devem ganhar um descanso dos bancos que receberam a injeção de capital.

"Esperamos que todos os bancos participantes continuem e fortaleçam os esforços para ajudar os proprietários residenciais em dificuldades que arcam com suas casas a evitar execuções hipotecárias", afirmou Paulson ao anunciar o programa.

Outros US$ 125 bilhões em capital estarão disponíveis a outras instituições dos EUA até 14 de novembro, com os fundo sendo investidos até o fim do ano.

O Tesouro também prossegue com o plano original de Paulson de comprar ativos relacionados a hipotecas problemáticas em mãos dos bancos, como o secretário-assistente de Estabilidade Financeira, Neel Kashkari, explicou em discurso de 13 de outubro. Muitos economistas argumentam que Kashkari deveria ter se concentrado desde o início em injetar capital, em vez de comprar ativos.

Pelo que se viu, simplesmente não houve tempo para colocar o plano de compra de ativos em vigor a tempo, uma vez que o mercado acionário despencou e os empréstimos interbancários e a emissão de commercial papers praticamente ficaram paralisados.

Agora, há dúvidas se o plano é grande o suficiente.

Em termos relativos, o Reino Unido colocou o dobro do capital nos bancos que os EUA. Para saber se os US$ 250 bilhões serão suficientes poderia ser necessário saber o tamanho dos prejuízos com ativos ruins dos bancos nos próximos meses, particularmente agora que a economia dos EUA parece encaminhada a uma grave recessão.

O economista Paul Ashworth, da Capital Economics, em Londres, informou aos clientes, em 14 de outubro, que prevê perdas adicionais de US$ 250 bilhões nos próximos dois anos. Desde o início da crise, no ano passado, as instituições financeiras dos EUA perderam US$ 380 bilhões.

"A conclusão é de que tudo o que o Tesouro conseguirá fazer é compensar as perdas futuras e evitar a queda das taxas de adequação de capital", disse Ashworth. "Do jeito que está, ainda prevemos que os bancos encolherão suas carteiras de crédito em torno a 10% nos próximos dois anos, pressionando ainda mais para baixo nossa atividade econômica."

É claro, o governo tomou outras medidas importantes e adotará outras se for necessário. Todas as instituições seguradas pelo Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC) terão os títulos de dívidas seniores, que dão prioridade aos credores em caso de inadimplência, protegidos pela instituição governamental de garantia de depósitos, assim como o dinheiro nas contas da maior parte das empresas. O Federal Reserve (Fed, autoridade monetária dos EUA) deixou quantias ilimitadas de dinheiro disponíveis para bancos centrais estrangeiros em troca das moedas locais e, a partir de 27 de outubro, começará a comprar commercial papers de três meses de emissores de baixo risco.

Líderes parlamentares democratas pressionam por outro programa de estímulo fiscal. O senador John McCain, candidato presidencial republicano, e seu oponente democrata, senador Barack Obama, anunciaram suas próprias propostas para incentivar a economia.

Tudo será muito caro. Infelizmente, não gastar esses recursos seria ainda mais custoso para a economia.