Título: Pedido de licença em pauta
Autor: Campos, Ana Maria ; Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2010, Cidades, p. 27

Advogado revela que governador afastado promete não voltar ao cargo, caso seja solto pelo Supremo na semana que vem

Machado informou que Arruda pretende assinar um documento se afastando do comando do GDF

Monique Renne/CB/D.A Press - 17/2/10 Marco Aurélio disse que para a proposta ser apreciada pelo STF os advogados precisam apresentá-la formalmente

Numa estratégia para tentar se livrar da cadeia, o governador afastado José Roberto Arruda (sem partido) promete não voltar ao cargo enquanto durar a investigação da Operação Caixa de Pandora. Trata-se de uma tentativa de convencer os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que vão apreciar na próxima semana o habeas corpus a seu favor, da existência de fato novo capaz de alterar a motivação da prisão preventiva decretada há 15 dias. O advogado Nélio Machado, que representa Arruda no caso, informou ontem que ele se dispôs a assinar um documento com o compromisso de se manter afastado do comando do Executivo.

O ministro Marco Aurélio Mello, relator do habeas corpus, disse ontem ao Correio que o assunto será avaliado se houver um pedido formal da defesa de Arruda aditado ao processo. Nesse caso, ele vai deliberar sobre o assunto e submeterá a proposta aos demais ministros no plenário no dia do julgamento, que deverá ocorrer na próxima quinta-feira. O ministro, no entanto, sustenta que a licença do governo não é garantia de liberdade. ¿Ele (Arruda) não foi preso por estar no governo e sim porque teria extravasado, tentando obstaculizar o funcionamento da Justiça e das instituições¿, afirma Marco Aurélio. Na visão do ministro, a tentativa de um acordo para facilitar a liberação do governador do DF é uma medida inusitada, sem precedentes.

O compromisso de licença do cargo é uma jogada pensada pelos advogados para tentar reverter uma tendência de derrota da defesa no julgamento do habeas corpus. No fim da tarde de quarta-feira, véspera do julgamento do habeas corpus, Nélio Machado pediu a retirada do processo de pauta e o adiamento para outra sessão. Ele apresentou uma nova petição, com argumentos jurídicos semelhantes, como forma de reforçar o pedido de liberdade de Arruda. No documento, Machado incluiu as posições favoráveis ao governador sustentadas no plenário do Superior Tribunal de Justiça (STJ) durante a sessão da Corte Especial em que por 12 votos a dois houve a decretação da prisão preventiva de Arruda e de outras cinco pessoas ligadas a ele que estariam envolvidas no suposto episódio do suborno ao jornalista Edson Sombra.

Nada de renúncia No dia da prisão, Marco Aurélio negou liminar em habeas corpus e manteve a decisão do STJ. Se ao apreciar o mérito, o STF decidir mantê-lo preso, Arruda poderá passar uma longa temporada na cadeia. Não há prazo para prisão preventiva. Dessa forma, o governador afastado poderá permanecer preso até que a sentença, em caso de condenação, transite em julgado, ou seja, não haja mais possibilidade de recursos. O secretário de Transportes, Alberto Fraga, que tem visitado Arruda na sala da Superintendência da Polícia Federal (PF), conta que ele não admite a hipótese de renúncia. Ele já passou por isso em 2001, quando abriu mão do mandato no Senado para escapar de um processo de cassação por quebra de decoro parlamentar, no episódio da violação do painel do Senado.

Neste momento, a renúncia significaria um ônus ainda maior. Como o conselheiro Domingos Lamoglia, do Tribunal de Contas do DF, é alvo do inquérito da Caixa de Pandora, Arruda manteria o foro no STJ. Mas ele perderia o benefício de ficar detido sozinho numa sala da PF, no Setor Policial Sul. Ao deixar de ser governador, ele seria transferido para o pavilhão federal do Complexo Penitenciário da Papuda, onde estão presos o ex-chefe da Agência de Comunicação Weligton Moraes, o ex-secretário particular Rodrigo Arantes, o ex-diretor da Companhia Energética de Brasília (CEB) Haroaldo Brasil, o ex-conselheiro do Metrô-DF Antônio Bento e o suplente de deputado distrital Geraldo Naves (DEM).

Nélio Machado esteve ontem com Arruda e constatou que ele está abatido. Segundo o advogado, uma das razões para entrar com um pedido de licença são as condições em que Arruda está na PF. ¿O governador não está preocupado com o cargo, mas com sua família e seu legado¿, afirmou Nélio. O advogado ressaltou que não há mais motivo para que seu cliente continue detido. Para exemplificar a situação de Arruda, Nélio citou a disputa pela Taça Guanabara, no último domingo: ¿Ele é botafoguense e nem pôde assistir à final¿. Arruda não pode ver televisão no local em que se encontra.

Ele (Arruda) não foi preso por estar no governo e sim porque teria extravasado, tentando obstaculizar o funcionamento da Justiça e das instituições¿

Marco Aurélio Mello, ministro do STF

Recibos dos panetones

Único integrante do governo que tem visitado José Roberto Arruda (sem partido) na prisão na Superintendência da Polícia Federal (PF), o secretário de Transportes, Alberto Fraga, será testemunha do Ministério Público Federal na ação penal sobre a suposta falsificação de recibos para justificar a compra de panetones, mote da defesa do governador afastado. Fraga participou da reunião em que se discutiu a confecção dos documentos na residência oficial de Águas Claras, em outubro do ano passado.

Fraga disse ao Correio que vai contar ¿apenas a verdade¿ do que ocorreu naquele dia. Segundo o secretário de Transportes, além dele e do próprio Arruda, estavam presentes na residência oficial o então secretário de Relações Institucionais do DF, Durval Barbosa, o policial civil aposentado Marcelo Toledo e o então chefe da Agência de Comunicação, Weligton Moraes. Naquela altura, Durval já agia como colaborador da Justiça e do Ministério Público. Ao deixar a residência oficial, ele se dirigiu à Polícia Federal e entregou uma cópia dos recibos assinados por Arruda que seriam uma comprovação do recebimento de dinheiro para compra de panetones. A intenção, segundo o governador afastado, seria distribuí-los a famílias carentes no período de Natal, o que teria ocorrido em 2004, 2005 e 2006.

Na sexta-feira passada, a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge denunciou Arruda por falsidade ideológica, crime com pena de um a três anos de prisão. Na ação, ela sustenta que os recibos foram fraudados para encobrir uma operação ilegal: o recebimento de dinheiro com origem ilícita. Em dezembro, Arruda disse ao Correio que decidiu entregar os recibos a Durval porque ouviu rumores de que ele teria filmado a entrega do dinheiro e a imagem poderia ser divulgada. Ele afirmou que embora a data da elaboração do recibo seja posterior, os recursos tiveram a finalidade declarada nos recibos. No vídeo, Arruda chega ao gabinete de Durval, então presidente da Codeplan, senta, conversa e recebe maços de dinheiro que totalizariam R$ 50 mil.

Nas imagens, registradas em 2005, Arruda, então deputado federal, demonstra desconforto em transportar o dinheiro e o entrega ao secretário particular, Rodrigo Arantes, que também está preso sob a acusação de participar do suborno ao jornalista Edson Sombra. Rodrigo teria entregado o dinheiro a Antônio Bento, conselheiro do Metrô-DF, para que fosse levado ao jornalista.

Delação premiada Marcelo Toledo também aparece num dos vídeos gravados por Durval que fazem parte do inquérito nº 650, em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na imagem, ele entrega dinheiro ao então assessor de imprensa de Arruda, Omézio Pontes, e cobra recursos para o ex-vice-governador Paulo Octávio. Toledo foi procurado por Durval com a proposta de que se juntasse a ele na colaboração com a Justiça. Mas até o momento não há acordo para delação premiada.

O advogado de Toledo, Raul Livino, disse ontem que todas as possibilidade de defesa serão avaliadas, inclusive esta. Mas não haveria ainda nenhum pedido formalizado. Ele negou que Toledo tenha participado da reunião em Águas Claras. Ao ser convocado para prestar depoimento na Polícia Federal, em janeiro, Toledo conseguiu um habeas corpus, que lhe garantiu o direito de ficar calado. (AMC)

Arruda está abatido e angustiado

Mara Puljiz Breno Fortes/CB/D.A Press - 9/5/06 Durval Barbosa foi um dos cinco que participaram da reunião na residência oficial de Águas Claras

Preso há duas semanas e recebendo diariamente a visita de advogados e da mulher, Flávia Arruda, o governador afastado José Roberto Arruda começa a apresentar problemas de saúde, de acordo com o advogado Thiago Bouza. Ele contou que na noite passada Arruda sofreu queda de pressão. ¿Tentamos levar o médico particular dele, mas a direção (da Polícia Federal) não deixou¿, reclamou. Em uma rápida conversa, Bouza disse que Arruda tem um histórico na família de pressão alta e diabetes. Segundo o advogado, o governador afastado está abatido.

A assessoria da PF informou que Arruda recebe visita diária de médicos que medem a pressão e verificam se ele necessita de algum cuidado especial, mas não confirmou se ele passou mal de fato. De qualquer forma, a assessoria garantiu que em caso de mal-estar, o serviço médico é acionado imediatamente. Ao contrário do que afirmou Bouza, o advogado José Gerardo Grossi disse que Arruda, apesar de abatido, passa bem. ¿Hoje (ontem), quando eu cheguei, ele estava tomando banho de sol. A saúde dele está boa¿, disse. Caso um preso esteja mal, a defesa pode entrar com pedido de prisão domiciliar, mas de acordo com Grossi, essa hipótese não é cogitada, por enquanto. Durante visita ao governador afastado, Grossi comentou que ele não gostou de esperar mais uma semana para o julgamento do pedido de habeas corpus. ¿Ele reagiu de modo ruim e tem o direito de imaginar que vai ser solto. Ver um adiamento assim de mais uma semana o deixou angustiado¿, afirmou.

Quem também visitou Arruda foi a primeira-dama Flávia Arruda. Ela chegou por volta de 12h30 e saiu 45 minutos depois, mas desta vez não se preocupou em esconder o rosto como fez nos últimos dias. Ao passar pela portaria, Flávia deitava no banco de trás para não ser fotografada. Como de costume, não falou com a imprensa ao deixar a Superintendência da PF.

TROCA DE RELATOR Relator do inquérito judicial que culminou na prisão de José Roberto Arruda e afastamento dele do cargo de governador, o ministro Fernando Gonçalves adiantou o pedido de aposentadoria do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele deixa a cadeira em 20 de março, um mês antes de completar 70 anos, o que leva à aposentadoria compulsória. Com isso, o magistrado não pode receber mais nenhum novo processo e o inquérito do governador afastado será encaminhado a outro ministro. Até 19 de março, Fernando Gonçalves será o responsável pelo inquérito. A partir do dia 20, o inquérito seguirá para o ministro João Otávio de Noronha. Ele receberá esse e todos os outros casos do STJ que tratam de Arruda. Noronha já foi escolhido relator da mais recente ação penal contra o governador afastado, protocolada na última sexta-feira. Com o número 624 e baseada em denúncia do Ministério Público Federal (MPF), ela acusa o governador de adulterar documentos entregues à Justiça para explicar os maços de dinheiro recebidos de Durval Barbosa.