Título: Empresas buscam alternativas para evitar que a falta de crédito paralise as operações
Autor: Mandl, Carolina; Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2008, Brasil, p. A3

Para empresas de diferentes segmentos, a contração do crédito é o principal problema enfrentado em outubro, e diferentes alternativas estão sendo buscadas para evitar que a falta de capital de giro paralise a produção. As indústrias não relatam cancelamentos de pedidos ou redução de encomendas, mas algumas já revisam as projeções de crescimento para o ano.

Para contornar a falta de crédito, algumas indústrias estão mudando o destino do dinheiro que têm em caixa. Os recursos que serviriam para investimento estão se transformando em capital de giro. É o caso da fabricante de polpas Niagro. A matriz japonesa cortou a linhas de financiamento que conseguia no exterior e repassava à filial em Petrolina (PE). "Agora, vamos fazer o mínimo necessário para a expansão da atividade porque o crédito para a operação está caro e escasso", diz Hugo Torres, diretor financeiro da Niagro.

Por outro lado, a empresa não sentiu mudança na demanda da clientela no exterior, quase toda formada por japoneses. Com isso, a empresa deve ter um ganho inicial com a depreciação do real em relação ao dólar. "A preocupação é com o futuro sem crédito." A fabricante de vinhos Botticelli também adiou os planos de investimento para ampliar a produção em 20%. "Vamos reverter tudo para o capital de giro porque estamos há um mês sem crédito", diz José Gualberto de Almeida, sócio da Botticelli, que anda não sentido a redução da demanda.

Para se ajustar à escassez de crédito, uma indústria de material de transporte no Rio Grande do Sul recorreu ao alongamento dos prazos de pagamento aos fornecedores desde o fim de setembro. Com isso, o fluxo de fornecimento de matérias-primas e componentes também foi prejudicado e as entregas dos produtos acabados aos clientes estão sendo postergadas em uma semana, em média, contou um diretor da companhia.

De acordo com o executivo, os equipamentos vendidos pela empresa são financiados pelo Finame, do BNDES. Como as liberações desses créditos costumam levar de 60 a 90 dias, a indústria recorria aos bancos para antecipar o recebimento das faturas, mas agora essas fontes secaram.

A alternativa foi "casar" os pagamentos das matérias-primas com as liberações do Finame, que normalmente ocorrem nos dias 5 e 25 de cada mês. Com isso, os fornecedores passaram a receber com uma semana a 20 dias de atraso. "Entre 70% e 80% deles toparam, mas alguns já haviam descontado os títulos em factorings e esses nós precisamos pagar no vencimento", disse o diretor. Com o aperto no crédito, a empresa já prevê para o ano uma queda de 20% na receita em relação à projeção inicial.

Por enquanto os fornecedores não estão exigindo o pagamento de juros para alongar os prazos, informou o executivo. "Todo mundo está no mesmo barco", comentou.

Sem a oferta de crédito, uma indústria exportadora de alimentos do Nordeste reduziu seu quadro de funcionários em cerca de 5%, demitindo 70 pessoas ligadas à área de vendas externas. "Se não fosse a falta de crédito, era para neste momento os exportadores estarem vibrando com o câmbio", diz o presidente da companhia. Como não consegue colocar muitos produtos em outros países, a fabricante tem direcionado 40% do volume exportado para o mercado interno.