Título: Instabilidade marcou a campanha de Marta Suplicy
Autor: Felício, César; Agostine, Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2008, Política, p. A9

A campanha de Marta Suplicy (PT) mudou de rumo duas vezes em dez dias de segundo turno. O tom propositivo do primeiro turno tornou-se agressivo no segundo, quando a candidata entrou na disputa em desvantagem. Sob influência do Planalto, a propaganda abriu o confronto com o prefeito e candidato à reeleição, Gilberto Kassab (DEM), e insistiu na estratégia de divulgar o passado político do prefeito, secretário de Planejamento do ex-prefeito Celso Pitta.

O ápice da estratégia agressiva foi uma propaganda televisiva que questionava a vida pessoal de Kassab, indagando se o prefeito era casado e tinha filhos. Kassab, solteiro e sem filhos, foi constrangido a declarar em entrevista que não é homossexual. Era uma tática para desestabilizar o prefeito às vésperas do primeiro debate na televisão. A estratégia reverteu-se contra a candidatura do PT, que sofreu duras críticas dentro do partido. Com o aprofundamento da desvantagem para Kassab nas pesquisas, Marta procurou voltar a seus públicos tradicionais. A candidata priorizou em sua agenda eventos em áreas onde conta com grande votação - como Vila Formosa, onde chorou ao ser impedida de visitar uma obra da prefeitura - e reforçou sua presença em categorias próximas do PT, como a dos motoristas de vans. Dirigentes partidários foram paulatinamente deixando de ser vistos em suas atividades de rua.

O discurso da candidata abandonou os acenos para a classe média - cortejada sem sucesso ao longo do primeiro turno - e ajustou-se ao perfil de esquerda que marca o partido. Em sabatina sobre educação no grupo Abril, disse, ao responder a uma pergunta do empresário Roberto Civita, que as classes com menor renda e instrução devem receber atenção privilegiada do poder público, ainda que não constituam a maioria da população.

Na televisão, o marqueteiro João Santana, um dos responsáveis pela vitoriosa campanha de Lula no segundo turno em 2006, foi criticado dentro do partido. Para aliados de Marta, o marqueteiro não soube captar o "espírito e a linguagem" dos paulistanos.

Já a campanha de Kassab, dizem os martistas, acertou ao explorar uma linguagem popular, driblando a falta de carisma. Sob responsabilidade de Luiz Gonzalez, a propaganda do DEM buscou um tom emocional e de despolitização do debate. Não houve ataques ao PT e muito menos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ganhou espaço o "kassabinho", um bonequinho que reproduz a imagem do prefeito com traços infantilizados, que aparecia no vídeo cantando e dançando.

Os apoios que recebeu no segundo turno tiveram participação discreta. O governador José Serra (PSDB), que por constrangimentos da lei eleitoral não apoiou explicitamente Kassab no primeiro turno, teve pequena presença. Também sem destaque foi a participação de candidatos derrotados no primeiro turno, como Geraldo Alckmin (PSDB) e Soninha (PPS).

Sempre contando com ampla vantagem nas pesquisas, Kassab limitou-se a evitar deslizes. A situação de maior constrangimento que enfrentou foi ao participar de um evento administrativo ao lado do governador, quando exibiu um cheque com o valor de uma verba estadual para um investimento metroviário. O PT tentou cassar a candidatura do prefeito, acusando-o de uso de máquina, mas a Justiça Eleitoral limitou-se a aplicar uma multa ao candidato. (CA e CF)