Título: Para preservar a autonomia
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2010, Cidades, p. 29

Quatro partidos de oposição a Arruda e a Roriz iniciam movimento para cobrar mais ação e transparência do Executivo em meio à crise política. Iniciativa pode reduzir a pressão sobre uma possível intervenção no DF, cujo pedido será analisado pelo STF

Waldemir Barreto/Agência Senado

Os partidos de oposição a José Roberto Arruda (sem partido) e a Joaquim Roriz (PSC) deflagraram ontem um movimento no sentido de preservar a autonomia política do Distrito Federal, abalada pela crise política e pelo suposto esquema de corrupção desmantelado pela Operação Caixa de Pandora. PT, PDT, PSB e PCdoB esperam, juntos, agir em três frentes: emergencial, programática e eleitoral. Com ainda não têm consenso e nem acordo sobre as eleições, se fixaram nas medidas emergenciais.

Uma das ideias discutidas ontem, num primeiro encontro, foi o acompanhamento de todas as ações do governador em exercício, deputado Wilson Lima (PR), cobrando diretamente a inclusão de todos os pagamentos na internet para consulta do cidadão, conforme determina a Lei de Transparência aprovada na Câmara Federal. O prazo para essa divulgação é o fim deste ano, mas a intenção dos políticos de oposição é que essa medida seja antecipada, como forma de garantir que a própria população possa acompanhar as ações do GDF.

Participaram do encontro, além de líderes regionais dos quatro partidos, o ex-governador Cristovam Buarque, senador pelo PDT e ex-ministro da Educação, e o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg. Cristovam, que passou o recesso de janeiro à margem da crise e apenas em conversas de bastidores, voltou a carga com uma série de sugestões para essa ação emergencial, não só dos partidos políticos, mas de representantes da sociedade civil.

Cristovam propôs, de imediato, a criação de um conselho social de gestão do DF, em que representantes de órgãos da sociedade civil, sem receber qualquer remuneração por isso, iriam acompanhar e fiscalizar as licitações e pagamentos feitos pelo GDF. Esse colegiado faria uma revisão dos critérios de licitação, para tornar tudo mais transparente e de fácil acompanhamento pelo contribuinte. Além disso, procuraria as empresas responsáveis pelas obras em andamento para pedir uma redução nos preços. ¿Teremos que buscar um deságio nos contratos, uma vez que há evidências de superfaturamento¿, disse o senador, em discurso na tribuna do Senado ontem.

Contrário As ideias, se adotadas, podem ajudar a reduzir a pressão pela possível intervenção federal(1) no DF. O senador Cristovam, por exemplo, é contra essa medida. No primeiro discurso que fez essa semana na tribuna do Senado, foi direto: ¿A intervenção representa, sem dúvida alguma, o fracasso da política¿, afirmou. E alertou que, se essa for a saída, todos são responsáveis: ¿Significaria o fracasso dos políticos que estão ao lado do governo, que provocaram isso, e dos da oposição que, por omissão, podem ter colaborado. Ou não só por omissão. O governador Arruda foi eleito no primeiro turno, por mais da metade dos votos. Faço questão de lembrar que meu partido participou do governo. Teve um encarregado da implantação do horário integral (nas escolas), outro do emprego dos jovens¿, disse ele.

¿Temos que entender que, nós, eleitores brasilienses, nós, líderes de Brasília, do governo, da oposição, da posição ambígua que ficaram alguns partidos, temos que pensar o que fazer e como carregar, nas próximas semanas, esse calvário que está sobre nós; como atravessar o deserto que está sob nossos pés, como fazer para, daqui a alguns meses, possamos sair disso engrandecidos diante da opinião pública brasileira¿, disse o senador.

A sugestão de Cristovam é que as personalidades de Brasília consigam, juntas, resolver seus problemas e apresentem, desde já, alguns parâmetros para as eleições de outubro, como, por exemplo, a implantação do projeto que só permite a candidatura de pessoas que tenham a ficha limpa. ¿A palavra mensalão não foi inventada no Distrito Federal. A prisão de governantes e ex-governantes não é privilégio do Distrito Federal¿, disse Cristovam.

A ideia dos presentes ao encontro é fazer reuniões semanais para acompanhamento da crise e cobrança de ações. Estão todos cientes de que só um movimento conjunto terá efeito e poderá limpar a política local. ¿Diante de nós, temos essas duas alternativas: perdermos, outra vez, a autonomia ou seremos exemplo para o Brasil inteiro¿, resumiu o senador do PDT.

1 - Sem data O pedido de intervenção federal no DF foi feito pelo Ministério Público Federal e será analisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda não tem prazo para essa análise.

A intervenção representa, sem dúvida alguma, o fracasso da política. Significaria o fracasso dos políticos que estão ao lado do governo, que provocaram isso, e dos da oposição que, por omissão, podem ter colaborado¿

¿A palavra mensalão não foi inventada no Distrito Federal. A prisão de governantes e ex-governantes não é privilégio do DF¿

Cristovam Buarque, senador do PDT/DF, ex-governador do Distrito Federal e ex-ministro da Educação

Sem consenso para uma aliança

Os quatro partidos começaram ainda a tratar da proposta de uma ampla aliança para apresentar os eleitores do DF na campanha para o Governo do Distrito Federal este ano. Mas a ideia engasgou na largada. O presidente do PT/DF, Roberto Policarpo, lembrou que só pode cuidar desse assunto depois do congresso regional do partido, no próximo dia 21.

O PDT está dividido. Quando o presidente do partido, Ezequiel Nascimento, soube que o assunto aliança foi mencionado no encontro soltou logo uma nota desautorizando Cristovam Buarque. ¿Como político, respeitado nacionalmente, ele foi convidado para contribuir com sua experiência e visão política¿, diz o texto, referindo-se ao encontro como apenas a troca de ideias sobre como enfrentar a crise. ¿Vale ressaltar que a responsabilidade de negociar alianças políticas no governo local cabe ao atual presidente, Ezequiel Nascimento.¿

Por enquanto, apenas PCdoB e PSB ¿ que já fechou o nome de Rodrigo Rollemberg como candidato ao Senado ¿ estão mais engajados no projeto de uma chapa ampla, com toda a esquerda do Distrito Federal. O PT, antes de resolver a crise interna e a disputa entre Agnelo Queiroz e Geraldo Magela, está de mãos atadas. Enquanto os nós não forem desfeitos em cada partido, o que une a esquerda é o resgate da crise. O resto vai ficar mesmo para depois. Afinal, se Brasília não se reerguer nenhum deles terá condições de desfilar lépido e fagueiro no horário eleitoral. (DR)