Título: Lula critica aposta em derivativos
Autor: Adachi, Vanessa
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2008, Finanças, p. C3

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que o governo não pretende estatizar bancos, mas que poderá, sim, ficar com ações de instituições privadas como garantia, caso precise socorrer financeiramente alguma delas. Logo depois de votar ontem pela manhã na cidade de São Bernardo do Campo, Lula criticou duramente empresas e bancos brasileiros que, segundo suas palavras, transformaram a economia real em jogatina e quiseram ganhar dinheiro sem produzir um botão ou cabeça de alfinete. O presidente se referia a empresas e bancos que fizeram operações com derivativos antes da forte alta do dólar e que agora têm sofrido prejuízos milionários ou até bilionários, trazendo de vez a crise de crédito para o terreno doméstico.

Já de saída do Escola Estadual Doutor João Firmino Correia, onde votou, Lula comentou a edição, na semana passada, da Medida Provisória que, entre outras coisas, autoriza o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal a comprar bancos privados sem necessidade de leilão. "Ninguém pretende estatizar banco, agora, ninguém vai dar dinheiro pra banco", afirmou ele.

Citando o exemplo da Inglaterra e a sugestão dada pelo presidente francês Nicolas Sarcozy, Lula disse que, em vez de emprestar dinheiro a bancos sem garantia, o governo poderá comprar ações de bancos em dificuldades por causa da crise financeira. "Na hora em que aquele banco se recuperar, você vende as ações do mesmo banco", disse, para depois completar: "o que não dá é pra gente dar dinheiro para bancos ou para empresas que apostaram em ganhar dinheiro fácil."

Depois, o presidente tentou contrabalançar o discurso afirmando que o governo sabe da importância do sistema financeiro e que, por essa razão, o irrigará com linhas de crédito a fim de manter a economia em crescimento.

Lula disse que o governo não esperava que os efeitos da crise de crédito internacional pegassem tão fortemente o país, porque foi surpreendido pelas operações com derivativos. "Nós não sabíamos que empresas nossas [nacionais] estavam praticando investimento em derivativos, ou seja, coisas que muitas vezes são feitas no balcão e que não passavam sequer pelo Banco Central. Portanto, agora nós estamos disponibilizando crédito que entendemos que falta no Brasil."

Ele disse que hoje irá se reunir com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para mapear quais os setores que mais sofrem com a escassez de crédito e direcionar melhor a ajuda. Demonstrou especial preocupação com o setor da construção civil e indústrias de pequeno porte. Lula afirmou ainda que a falta de liquidez não levará o governo a parar obras de infra-estrutura previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

O presidente afirmou que o governo admite que a provável recessão mundial afetará as exportações do Brasil, como as do resto do mundo. Mas defendeu que o país sofrerá menos que a média por ter diversificado seus parceiros comerciais nos últimos anos. "Não dependemos de um país. Temos apenas 15% das nossas relações comerciais com os Estados Unidos", disse.