Título: Copom tende a manter Selic, na mais difícil reunião de seus 12 anos
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2008, Finanças, p. C2

Na reunião que está sendo considerada de antemão a mais difícil, controversa e longa dos seus 12 anos de existência, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central irá interromper depois de amanhã o movimento de alta da taxa Selic iniciado em abril, acredita a grande maioria dos economistas ouvidos pelo Valor. Em suas últimas quatro reuniões, o juro básico foi elevado de 11,25% para 13,75%. A crise externa, que já atingiu em cheio o Brasil, impedirá o BC de prosseguir apertando a política monetária, a despeito dos possíveis efeitos da alta do dólar sobre a inflação.

Dos 17 analistas pesquisados, quatro ainda mantêm a crença de que o Copom respeitará a sinalização de alta emitida tanto pela última ata quanto pelo Relatório de Inflação. Mas a maior parte dos analistas acredita que a providência monetária capaz de guardar coerência com as recentes decisões do BC de ampliar a liquidez do sistema bancário por meio da redução do compulsório seria cessar a alta do juro e sinalizar a disposição de futuro recuo na hipótese da expectativa de desaceleração da economia neutralizar o impacto do câmbio sobre os preços ao consumidor. Outra ala, minoritária, diz justamente o contrário: o BC escolheu o caminho da ampliação da liquidez, como forma de desbloquear o canal do crédito, para preservar a integridade e a eficiência antiinflacionária do instrumento monetário chamado taxa de juros.

O diretor da Virtú Capital - Gestão de Investimentos, José Romeu Del Moro Robazzi, não acredita que o BC fará o que deveria fazer: reduzir a Selic. O economista observa que o Brasil é o único país na história da economia mundial que sofreu um empoçamento de liquidez com juro na casa de 13,75% e desvalorização cambial que melhorou a posição fiscal do Tesouro. Ao contrário das crise ocorridas em 1999 e 2002, a atual está sendo caracterizada por um choque de oferta, já que o dólar se valorizou abruptamente contra todas as moedas mundiais nas últimas semanas. Pelo raciocínio de Robazzi, se a cartilha do sistema de metas de inflação for seguida à risca, já que o canal de crédito foi bloqueado, o choque de oferta deve ser assimilado, e o juro deve ser cortado. "Eu cortaria para 13% imediatamente, indicando mais cortes futuros", recomenda ele. Mas o que o BC vai fazer?

Vai dissociar o fornecimento da liquidez necessária ao restabelecimento da confiança do sistema da luta contra a inflação. Tal posicionamento pode resultar tanto numa interrupção do ciclo de arrocho quanto na aplicação de mais uma alta, apenas simbólica, de 0,25 ponto, indicando o fim do movimento.

Para fechar a sua previsão para o Copom, o economista-chefe da SLW Asset, Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, analisa os recados contidos nos textos, comunicados, discursos e entrevistas de dirigentes do BC. E toda a comunicação mostra a intenção de reduzir o ritmo de alta da Selic, não de parar. As declarações recentes do presidente do BC, Henrique Meirelles, foram muito claras. E foram entendidas no sentido de que ele "muda o ritmo, mas não muda a direção". E por isso que Thadeu de Freitas prevê Selic de 14% na noite de quarta-feira.

Luiz Rogê Ferreira, da consultoria InvestCerto, diz que não há alternativa ao Copom a não ser a parada técnica. Subir a Selic agora, uma atitude incoerente com as decisões de liberação de compulsório, significaria jogar mais lenha na fogueira da crise. Não se tem muito o que fazer: se o câmbio empurrar a inflação para cima terá de acomodar a mudança de preços relativos via política fiscal, não monetária.

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Rodrigo Vale, prevê pausa monetária em 13,75%, embora, pelo retrospecto dos posicionamentos adotados pelo BC, se poderia esperar mais uma alta. Isso porque as expectativas de inflação para 2009 ainda estão acima da meta, variando pouco acima de 5%. A questão a saber é se o BC irá pagar ou não para ver o impacto do câmbio sobre a inflação ou se agirá por antecipação.

"Todas as medidas de liquidez que o BC tem feito para ajudar a destravar o crédito não implicam em neutralização da política monetária. Uma coisa é ajudar a liquidez, outra é controlar demanda via aumento de juros para conter a inflação. Vale lembrar que o Fed fez isso até a crise piorar muito em outubro. Seu argumento principal era que a inflação ainda era preocupante e por isso não baixaria além de 2%", compara Vale.

Para André Modenesi, professor de economia do Ibmec, apesar de "cultuar a reputação de ultraconservador", o Copom deve manter a Selic em sua próxima reunião. "O estouro da bolha de commodities, as incertezas quanto ao futuro da economia internacional e a forte restrição global de crédito demandam maior cautela na condução da política monetária", alerta o professor. As medidas de flexibilização do compulsório também apontam para a interrupção do ciclo de alta, apesar do gerenciamento da liquidez do sistema bancário se dissociar, ao menos parcialmente, da busca pela meta de inflação. "De fato, a taxa de câmbio tem sido o principal canal de transmissão da política monetária. Entretanto, a queda no preço das commodities e a expectativa de forte desaceleração da economia mundial - com reflexos na atividade doméstica, já desestimulada pelo elevado nível da Selic - reduz o potencial de repasse cambial", diz Modenesi. Além do que ainda não se sabe em que patamar o câmbio irá se estabilizar. A tendência de alta do dólar pode tanto se acentuar quanto se interromper repentinamente. Por todas essas razões, o varejo tem conseguido evitar maiores reajustes de preço. Até o momento, a desvalorização cambial ainda não se mostra tão excessivamente preocupante.

O tesoureiro do banco Banif, Rodrigo Trotta, acredita que o Copom deverá subir novamente a taxa básica, por dois motivos. O aumento da liquidez é, na verdade, um argumento a mais para a alta. As medidas que provocaram este aumento, visam a melhor a distribuição da liquidez dentro do mercado. Mas ao mesmo tempo em que ajudam o mercado, por intermédio de estímulo ao crédito, produzem efeito perverso sobre a inflação. "Há, portanto, a necessidade de se contrabalançar esse efeito", diz Trotta

O segundo é que taxa de câmbio mostra uma mudança de patamar. Mesmo depois da seguidas intervenções do BC, o dolar ainda oscila sempre acima de R$ 2,00. "O efeito inflacionário desta alta é inegável, mesmo com alguma desaceleração em 2009", diz o tesoureiro.