Título: Crise se aprofunda na Ásia e expõe vulnerabilidade de bancos do Japão
Autor: Hayashi, Yuka; Ramstad, Evan
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2008, The Wall Street Journal Americas, p. C4

Os grandes bancos japoneses, considerados um bastião de estabilidade em meio à turbulência financeira mundial, estão de repente parecendo vulneráveis por causa da exposição às fortes quedas nas bolsas do país.

Duas semanas depois de investir US$ 9 bilhões por uma participação de 20% no americano Morgan Stanley, o Mitsubishi UFJ Financial Group, maior banco do Japão, informou ontem que vai captar até 990 bilhões de ienes (US$ 10,47 bilhões) por meio de uma emissão de ações preferenciais e ordinárias no próximo ano. Analistas esperam que o Sumitomo Mitsui Financial Group e o Mizuho Financial Group sigam o exemplo, embora os dois bancos tenham afirmado não ter tais planos.

As ações do Mitsubishi UFJ e do Mizuho caíram 15% ontem, enquanto as do Sumitomo Mitsui baixaram 11%. Isso ajudou a fazer com que o índice Nikkei de 225 ações atingisse o nível mais baixo em 26 anos, de 7.162,90 pontos, com uma perda de 6,4%.

A crise mundial está agora infligindo danos severos a partes da Ásia que pareciam até há pouco relativamente imunes. Na Coréia do Sul, onde os bancos estão sob pressão ainda maior que os japoneses por causa da alta alavancagem, o banco central anunciou ontem um corte dos juros de dimensão sem precedentes, baixando a taxa principal de 5% para 4,25%. Na Assembléia Nacional, o presidente do Banco da Coréia, Lee Seogtae, deu indicações de que outro corte pode ser feito no mês que vem, segundo noticiário local. A notícia fez com que a bolsa sul-coreana fechasse com modesta alta.

Em outros mercados da região, o pessimismo prevaleceu, ressaltando o crescente nervosismo dos investidores em relação às vulnerabilidades de uma região que agora sofre, principalmente, por causa da dependência de exportações às frágeis economias americana e européia. Em Hong Kong, a bolsa caiu 12,7%; em Manila, nas Filipinas, 12,3%; em Bancoc, Tailândia, 10,5%. Em Xangai a queda foi de 6,3%.

"A falsa premissa que havia era a de que a Ásia podia se descasar" das economias ocidentais, diz Stephen Roach, presidente do Morgan Stanley na Ásia. "Acho que estamos vendo que numa recessão global não há descasamento dos poderosos laços transnacionais de fluxos de comércio, fluxos de capital, fluxos de mão-de-obra e fluxos de informação."

Além de preocupações com as exportações, outros temores afligiram os mercados asiáticos este mês. Perdas com posições cambiais alavancadas anunciadas pela Citic Pacific Ltd., um conglomerado registrado em Hong Kong com participação do governo chinês, deixou investidores nervosos com a possibilidade de outros passivos parecidos que não tenham sido anunciados nos balanços das empresas.

Além disso, a decisão de presidente da Argentina, Cristina Fernández Kirchner, de estatizar os fundos de pensão do país suscitou temores de que outros países pequenos sob pressão da crise financeira possam recorrer a medidas extremas para cumprir suas obrigações. "Pela primeira vez em muito tempo começamos a ouvir as pessoas falar de "contágio de mercado emergente"", diz Steve Diggle, sócio do fundo de hedge Artradis Fund Management, de Cingapura, que administra US$ 4 bilhões.

No Japão, a queda das bolsas chamou atenção para uma área de fraqueza dos bancos: a forte dependência de investimentos acionários como componente de seu capital de risco. Essas aplicações, que representam cerca de 3% do valor do mercado acionário japonês, são um legado da prática dos bancos de possuir "participações cruzadas", nas quais as instituições financeiras e seus financiados tinham fatias no capital uns dos outros.

Em junho, o Mitsubishi UFJ tinha uma carteira de ações japonesas avaliada em 6,1 trilhões de ienes, com ganhos não realizados de 1,8 trilhão. Com a queda de 40% do mercado desde então, estima-se que o portfólio tenha encolhido para menos de 3,7 trilhões de ienes, com uma perda contábil de 630 bilhões, segundo Kristine Li, uma analista de bancos da KBC Securities em Tóquio. Parte da perda precisa ser deduzida do patrimônio do banco.

"É um grande golpe na confiança dos investidores no Japão e em outros países, porque eles antes presumiam que os bancos japoneses eram relativamente seguros e não tinham necessidade imediata de aumentar o capital", diz Li.

Preocupado com a deterioração das condições no mercado financeiro, o primeiro-ministro japonês, Taro Aso, determinou que seu gabinete elaborasse imediatamente medidas adicionais para estabilizar os mercados e fortalecer o sistema financeiro, como parte de um amplo plano econômico a ser anunciado esta semana. O governo já tem um plano de injetar 2 trilhões de ienes para fortalecer o capital de instituições financeiras menores, e o ministro econômico Karou Yosano disse no domingo que a quantia pode ser aumentada para 10 trilhões de ienes. Não está claro se os recursos serão alocados também para os maiores bancos.

Banqueiros e autoridades do governo dizem que as condições financeiras dos grandes bancos japoneses continuam sólidas e que a busca de capital adicional é uma medida de precaução, contra uma maior deterioração dos mercados financeiros. Diferentemente de muitos bancos ocidentais que tiveram de repor capital reduzido por enormes perdas com créditos de alto risco, nenhum dos grandes bancos japoneses deve registrar prejuízos líquidos no atual ano fiscal, que termina em 31 de março.

Na Coréia do Sul, a decisão de baixar os juros ocorreu um dia depois que o presidente Lee Myung-bak realizou uma reunião de autoridades econômicas para organizar medidas que impeçam que a crise financeira mundial provoque uma paralisação abrupta da economia do país. Os líderes do banco central apareceram com autoridades do governo em entrevistas coletivas ontem para descrever o corte dos juros como um primeiro passo.

Lee disse que vai propor um pacote de estímulo fiscal que envolve tanto cortes de impostos como novos gastos públicos. Em discurso no parlamento, ele disse que as medidas vão "expandir os gastos de maneira mais ousada e revitalizar o consumo interno".

O esforço é um reconhecimento tardio do impacto que a crise mundial pode ter no país. Durante semanas, autoridades do governo culparam analistas estrangeiros e a mídia por adotarem uma visão pessimista dos fundamentos econômicos da Coréia do Sul, dizendo que eles são muito mais fortes do que na crise financeira de 1997 e 1998.

Investidores e economistas concentraram-se na forte tomada de empréstimos por parte dos bancos sul-coreanos como um indicador principal da vulnerabilidade do país. A pressão sobre a liquidez dos bancos ficou mais aparente depois que o Banco da Coréia cortou sua principal taxa de juros em 9 de outubro, de 5,25% para 5%, mas os bancos tiveram de aumentar os rendimentos dos depósitos para atrair recursos e sustentar o crescimento do crédito.

(Colaboraram Peter Stein e Laura Santini, de Hong Kong)