Título: Reversão de apostas cambiais torna difícil conter alta do iene
Autor: Slater, Joanna; Stein, Yuka Hayashie Peter
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2008, The Wall Street Journal Americas, p. C4

A alta do iene, que parece implacável, está aumentando a possibilidade do o governo japonês intervir no mercado pela primeira vez em anos, para conter a ascensão de sua moeda.

Ministros econômicos dos sete maiores países industrializados, o grupo conhecido como G-7, do qual o Japão faz parte, vieram à tona para avalizar tal intervenção, num raro comunicado. O documento divulgado ontem diz que "volatilidade excessiva" no iene ameaça a estabilidade econômica e financeira.

Mas membros do G-7 pareciam evitar uma iniciativa coordenada, com a ministra da Economia da França, Christine Lagarde, dizendo que uma potencial intervenção seria "puramente japonesa".

O governo do Japão enfrenta um grande desafio: a liquidação de um dos investimentos mais praticados no mercado está chacoalhando o sistema financeiro e sobrevalorizando o iene, o que prejudica as exportações japonesas. Ontem, o iene saltou para seu patamar mais alto ante o dólar em 13 anos.

No fim do dia em Nova York, um dólar comprava 93,58 ienes, uma queda de 12% este mês. Sexta-feira, a cotação era de 94,6 ienes por dólar.

O iene, assim como o dólar, tem se beneficiado por ser uma aposta segura num momento em que investidores abandonam todos os tipos de ativos que preferiam, particularmente em países em desenvolvimento. Um grande fator na alta do iene é que os investidores estão desfazendo uma prática bastante apreciada até recentemente, que implica aproveitar os baixíssimos juros do Japão para tomar dinheiro emprestado e investir em ativos mais arriscados, e de maior rendimento, em outros países.

Essa prática, apelidada "carry trade", pode ser encontrada em várias mutações por todo o mundo, onde quer que investidores tentem aproveitar diferenças internacionais de taxa de juros. Ela pode dar lucros contínuos por muito tempo, contanto que as moedas envolvidas permaneçam estáveis.

Mas a volatilidade tem crescido e investidores estão ficando preocupados, e desfazendo essas operações. Para tanto, estão comprando de volta ienes, a moeda em que tomaram emprestado. Isso tem ajudado a produzir fortes altas no valor da divisa japonesa.

"Há muitas, muitas, muitas pessoas diferentes nessa operação", diz John Taylor, diretor do FX Concepts, um fundo de hedge cambial de Nova York. "Sempre foi um tal de ganhar dinheiro e então correr como um louco e tentar sair do caminho."

Fundos de hedge, empresas e pessoas físicas praticam manobras de "carry trade", que são difíceis de mensurar. Isso também complica as possíveis intervenções do governo japonês: ninguém sabe quando ainda falta para ser desfeito, e o Japão pode se ver enfrentando desalavancagem ainda poderosa por parte de investidores. O governo estaria vendendo ienes, para reduzir o valor da moeda, ao mesmo tempo em que investidores estão comprando a moeda para fechar empréstimos expressos em iene.

Ainda assim, alguns operadores alertaram contra descontar a intervenção de governos. A Austrália, cuja moeda tem sido surrada nas últimas semanas, entrou na briga, confirmando que comprou dólares australianos sexta e ontem para tentar estabiliza a moeda.

"Os bancos centrais falaram e está na hora de ouvir", escreveu Bent Donnelly, um operador de câmbio da Barclays Capital em Nova York, numa nota para clientes ontem, recomendando que considerassem comprar dólares australianos e vender ienes.

O Japão interveio pela última vez no câmbio em fins de 2003 e início de 2004, quando vendeu grandes quantidades de iene, o que acabou conseguindo enfraquecer a moeda.

Operadores estão tendo um papel importante na atual tendência de reversão do "carry trade". No Japão, operações cambiais feitas por pessoas físicas, muitas vezes bastante alavancadas, dispararam nos últimos anos como alternativa para a negociação de ações online. Entre as operações mais comuns estava tomar emprestado ienes para comprar euros, libras, dólares australianos e dólares neo-zelandeses.

Agora esses investidores estão correndo no sentido oposto. Desde o fim de agosto, apostas contra o iene na Bolsa Financeira de Tóquio - um bom indicador do varejo cambial - caíram 80% para a menor posição, de maneira geral, em dois anos, diz Derek Halpenny, um alto estrategista de câmbio do Banco de Tokyo-Mitsubishi UFJ em Londres.

De maneira geral, os investidores, que costumam agir rápido, já desfizeram seus "carry trades" envolvendo o iene, provavelmente em arroubos anteriores de aversão ao risco quando a crise de crédito começou a se aprofundar, em fins de 2007 e começo deste ano.

Mas nem todo mundo que usou o iene para comprar ativos de alto rendimento em outros países era um operador de curto prazo, diz Patrick Bennett, estrategista de câmbio e juros do Société Générale em Hong Kong. Alguns têm títulos de longo prazo que rendem 5% ou 6% por vários anos, o que lhes dá "um bom colchão" antes de sentirem necessidade de vender.