Título: Siderurgia da região teme avanço do aço chinês
Autor: Ribeiro, Ivo
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2008, Empresas & Tecnologia, p. B1

Preocupados com o aprofundamento da crise financeira mundial, os produtores latino-americanos de aço estão se movimentando para evitar uma enxurrada de produtos siderúrgicos e manufaturados de aço de origem chinesa e do Leste Europeu em seus mercados. Em seu encontro anual de Cancún, México, que vai até hoje, o clima geral é de apreensão com os efeitos da retração da demanda, em especial nos países desenvolvidos. Como esses países já têm mecanismos de proteção e deverão reforçá-los, o argumento é que os fluxos comerciais de bens chineses, russos e ucranianos tendem a se voltar com força para a América Latina.

A partir de agosto, conforme dados obtidos pelo Valor, as importações oriundas da China já ganharam novo ímpeto. Dados do World Steel Association, mostram que nos oito meses deste ano os volumes de aço vindos da China tiveram aumentos expressivos para o mercado latino-americano, variando de país para país. No Brasil, na casa de 25% de alta. Em outros países, como Colômbia, Chile e Equador, atingiram de 60% a quase 100%.

A média de entrada de produtos na América Latina, de acordo com os dados que serão detalhados hoje no evento do Ilafa, entidade dos produtores da região, é mais que o triplo do índice verificado em todo o mundo em igual período.

Com a crise e o acréscimo de capacidade da ordem de 200 milhões de toneladas previstos para China e Leste Europeu até 2010, comparado com 2007, a previsão é que a entrada de produtos dessas regiões no mercado latino-americano se intensifique ainda mais. No ano passado, China e Leste Europeu tiveram exportações líquidas de mais de 100 milhões de toneladas. Proteger seu mercado é a frase do dia ouvida entre os principais representantes de usinas de aço presentes em Cancún.

Segundo apurou o Valor, o temor não se limita a chapas, bobinas e tarugos de aço. Inclui bens fabricados como autopeças, máquinas e outros itens feitos em aço. De janeiro a agosto, conforme o Worldsteel, as importações a partir da China subiram acima de 20% na Argentina e México, chegando a 80% no Peru. No Brasil, o aumento de ingresso de material chinês passa de 60%. A média da região fica em 40%, mais que o dobro do volume verificado em todo o mundo. Em valor, a entrada de bens supera a marca mensal de US$ 2 bilhões.

Pedido para avaliar esses indicadores, Marco Pólo de Melo Lopes, vice-presidente executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), disse que eles mostram um preocupante sinal de alerta no Brasil. "Se vemos aumento do protecionismo nos EUA e Europa, na medida em que seus mercados se enfraquecem, isso pode agravar ainda mais o nível de penetração de aço e produtos da cadeia metal-mecânica em nosso mercado."

Melo Lopes afirmou que "é uma atitude inocente, no momento em que o mundo se protege, o Brasil manter uma lista de dez produtos com alíquota zero". Ou seja, a siderurgia volta à carga em sua reivindicação de suspensão desse mecanismo, que teria sido adotado, em 2005, pelo Ministério da Fazenda e Camex como lista de exceção à TEC (sistema tarifário comum) por conta de aumentos de preço e falta de produtos que, segundo ele, não ocorreram. "Se foi de exceção, porque ainda estamos enquadrados?", questionou. "Não podemos, agora, deixar as portas abertas."

Ele disse que o nível de preocupação sobe mais ao se considerar que no país há projetos de grupos para elevar a capacidade em diversos estágios. Fazem parte de um programa grande de investimentos que previa, antes da crise, mais de US$ 40 bilhões até 2013. Com isso, o Brasil ampliaria sua produção de 41 milhões de toneladas para mais de 60 milhões de aço bruto em cinco anos. O setor ainda não admite, mas alguns desses projetos já estão engavetados. Outros, como os de Votorantim, ThyssenKrupp e CSN (aços longos) vão ser inaugurados no decorrer de 2009/2010. Não podem parar mais. No Norte do país, a Sinobras acaba de inaugurar uma usina de 400 mil toneladas em Marabá (PA).

Especialistas prevêem que o consumo de aço na China em 2009 crescerá "anêmicos" 5% a 6%, para cerca de 470 milhões de toneladas, comparado com 16% no ano passado (sobre 2006) e por volta de 7% neste ano. No mundo, estima-se queda acima de 3% na demanda de aço bruto.