Título: Prazo para pagar tributos pode ser ampliado
Autor: Galvão , Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2008, Brasil, p. A3

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou ontem que o governo cogita uma ampliação do prazo de recolhimento de tributos como medida de preservação do capital de giro das empresas, mas ponderou que, antes de realizar essa mudança, tem de ser avaliado o impacto da crise na arrecadação. Ele teme que os tributos sobre o lucro, líderes da receita, sejam afetados.

O comentário foi uma resposta ao pedido feito pelo presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE) durante debate realizado no Encontro Nacional da Indústria. Mantega, nesse encontro, apresentou nítido tom mais pessimista ao avaliar a profundidade da crise financeira.

Para ele, a crise é séria, longa, de magnitude inédita e com forte impacto na economia real. Ele disse ser "impressionante" como o travamento do crédito prejudica a economia. Para ele, a liquidez do crédito não está resolvida nos Estados Unidos e em outros países. Esse cenário, segundo Mantega, elevou muito os spreads, levando-os, talvez, aos maiores níveis da história.

O ministro ainda afirmou ontem que a crise de confiança dos agentes do mercado financeiro mundial desmontou as operações de "carry-trade", o que provocou um refluxo de recursos para os países desenvolvidos. Ao comentar as queixas das empresas do setor produtivo contra o "empoçamento" de recursos depois de várias medidas para aumentar a liquidez, Mantega disse que "é natural que os bancos fiquem mais comedidos", mas isso não significa que foi travado o mercado interbancário, o que ocorreu nos Estados Unidos.

A proposta que dá mais prazo para as empresas pagarem tributos, de acordo com os argumentos do presidente da CNI, elevaria imediatamente a liquidez, o que não ocorreu ainda, por exemplo, com a redução dos depósitos compulsórios dos bancos, cujos efeitos na oferta de crédito ainda não são sentidos. "Ampliar o prazo do pagamento dos impostos é uma decisão sábia e não significa renúncia fiscal. Tem caráter extraordinário e efeito horizontal, beneficiando todas as empresas", comentou Monteiro Neto.

De acordo com a CNI, as empresas, normalmente, recebem em 120 dias e pagam impostos e contribuições em 30 dias. Esse descompasso, em plena crise de liquidez, vai elevar a inadimplência tributária. Monteiro Neto disse que o ideal é dilatar o prazo de pagamento dos impostos para 120 dias.

O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que também participou do debate ontem no Encontro Nacional da Indústria, disse que o governo vem agindo bem na crise financeira global, mas erra na comunicação, ao menosprezar os impactos da crise em comissão do Congresso e, um dia depois, publicar a medida provisória 443, que ampliou os poderes do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. O ministro da Fazenda disse que, talvez, seja correta a crítica sobre a comunicação.

Para o senador da oposição, o capitalismo exige confiança para investir e o governo dá sinais contraditórios com a MP 443 e quando se ouve que vivemos o fim do capitalismo. Ele ainda ressaltou que o governo Lula "teimou em desmoralizar" as agências reguladoras. Para o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), todos têm de sair do palanque porque o Brasil precisa de diálogo neste momento.

No debate, os empresários insistiram que a falta de reformas estruturais pode prejudicar o Brasil na retomada do crescimento, depois de passada a crise mundial. Jorge Gerdau Johannpeter defendeu a necessidade de uma reforma previdenciária. Mercadante respondeu que esse tipo de mudança não é fácil, mas disse ser inegável a necessidade de cortar gastos públicos para aumentar o investimento. Ele chegou a convidar o empresário gaúcho para assumir o cargo de ministro da Previdência. Gerdau disse que tem mais a contribuir se ficar fora do governo. Tasso disse que a oposição apóia o convite, principalmente porque, dessa maneira, deixa o cargo José Pimentel, "petista e cearense".

O economista e ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni argumentou no debate promovido pela CNI que, no atual momento de crise, é preciso resistir à atração fatal da heterodoxia. "Não podemos cair no populismo fiscal, como fizeram muitos países vizinhos", afirmou.

Nesse cenário, Langoni disse que a participação do Estado tem ser positiva, principalmente na definição de um marco regulatório no setor da infra-estrutura e que não vê a exploração dos recursos da camada pré-sal sem intensa participação do setor privado. Monteiro Neto já tinha advertido para o fato de que a busca de saídas para a crise não é senha para ações contra o empreendedorismo.