Título: Kassab teve a competência de exibir bem os repasses de Lula, diz Carvalho
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Fonte: Valor Econômico, 29/10/2008, Política, p. A7

Chefe de gabinete pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilberto Carvalho sempre foi um dos dirigentes petistas mais próximos do presidente. Este mês, afastou-se de Brasília por dez dias para participar da reta final da campanha de Marta Suplicy à Prefeitura de São Paulo, no segundo turno. O gesto foi interpretado por aliados e adversários da ex-ministra como um sinal de que Carvalho está escalado pelo próprio presidente para concorrer à presidência nacional do PT em novembro do próximo ano, assumindo assim a coordenação das alianças do partido para 2010. E, pela sua identificação com Lula, entraria na disputa com uma gama de apoios muito maior do que a corrente do antigo Campo Majoritário, desde 2005 denominado "Construindo um Novo Brasil". Lula Marques/Folha Imagem

Para Gilberto Carvalho, chefe de gabinete pessoal de Lula, Marta mantém-se forte:" Politicamente, passei a admirá-la mais"

Carvalho não afasta a possibilidade de concorrer, mas frisa em entrevista por telefone ao Valorque as articulações pelo seu nome não partem do Palácio do Planalto. O chefe de gabinete pessoal de Lula lembra que transita dentro do partido uma proposta para que o mandato da atual Executiva nacional, chefiada pelo deputado Ricardo Berzoini (SP), seja prorrogado até 2011.

Natural de Londrina, Carvalho foi seminarista na juventude e teve no Paraná a sua única experiência eleitoral, ao concorrer sem sucesso à Câmara dos Deputados em 1986. Do time de primeiro escalão escolhido pelo presidente da República em 2003, para gravitar em torno de seu gabinete, Carvalho é o único que se mantém no Planalto.

A seguir, a entrevista ao Valor:

Valor: O senhor é citado por diversas alas do PT como um nome que poderia ser quase consensual para assumir a presidência do partido em 2009. Pode haver, pela 1ª vez, uma escolha sem disputa?

Gilberto Carvalho: Fui consultado por um grupo de deputados sobre a possibilidade de ser candidato. Tenho um compromisso com o presidente da República até o final de 2010. Esta história de presidir o partido surgiu agora e eu teria que deixar o governo, o que não está na minha perspectiva. Preciso falar com aquele rapaz que me paga o salário. Preciso levar o assunto ao presidente. Não vou postular a vaga, não é meu projeto. Agora, sou um filho do PT e não posso me furtar a contribuir com o partido.

Valor: Mas o nome do senhor seria uma forma de evitar disputas?

Carvalho: Seria arrogância de minha parte colocar que só aceitaria ser candidato se unisse o partido, isto é muito pretensioso. No PT nunca existiu unanimidade, o que é uma virtude do partido.

Valor: Alguns colocam que a adesão a seu nome decorre de o senhor ser o dirigente mais identificado com o presidente. Confere?

Carvalho: Ser próximo do presidente, como de fato sou, não é uma condição importante para ser presidente do PT, não credencia só por si. Pelo contrário: o eleito, quem quer que seja, tem que exercer uma autonomia em relação ao governo para representar o pensamento médio dentro do partido. E neste sentido entra às vezes em contradição com o presidente da República. O PT tem que ser a consciência crítica do governo. Presidir o PT neste sentido é honra enorme e dificuldade extraordinária.

Valor: Como o senhor avalia a derrota da candidata Marta Suplicy em São Paulo?

Carvalho: Atendi a uma demanda da coordenação de campanha da Marta no segundo turno, em um quadro que já era de muita dificuldade, em função do resultado no primeiro turno. Tirei dez dias de férias e o presidente assentiu, mas ninguém esperava que com minha vinda o quadro se revertesse. Todos tínhamos exata consciência da gravidade. O Kassab construiu este resultado com muita antecedência ao processo eleitoral. Deslocaram para ele a estrutura de marketing do José Serra e trabalharam bem os elementos que davam a ele rejeição alta, procurando melhorar a sua avaliação de governo. Ainda por cima houve uma onda de reeleição dos atuais prefeitos em todo o País. Ironicamente, o governo federal ajudou na eleição de Kassab.

Valor: Por que?

Carvalho: Porque o presidente não discriminou São Paulo, repassou muitos recursos e o Kassab teve competência de exibir bem a aplicação destes recursos. O cidadão em todo Brasil não vota por ideologia, vota pelas motivações de seu dia a dia. Mas no caso paulistana houve uma união de forças políticas em torno do prefeito. Eu sempre lembro que em 2006 o Lula perdeu em São Paulo para o Alckmin no primeiro e no segundo turno. A direita tem um enraizamento muito forte na cidade.

Valor: A rejeição à Marta e ao PT não colaborou para o resultado?

Carvalho: Esta rejeição foi construída há muitos anos, e trabalhada agora com habilidade pelos adversários e alguns erros nossos. A imagem negativa da Marta é trabalhada desde a separação dela de Eduardo Suplicy, em 2001. Quando chegou agora eles não precisaram abordar este tema nem subliminarmente, porque não era mais necessário. Mas não deixaram de realizar uma campanha negativa muito agressiva, com os comerciais no rádio sobre a "Dona Marta em Paris". A campanha deles para aumentar a rejeição de Marta foi muito dura. Por todos estes fatores eu acho que a Marta teve um desempenho muito bom. Politicamente, passei a admirá-la mais.

Valor: O senhor não acha que ela sai enfraquecida no PT, em função das sucessivas derrotas?

Carvalho: Não. Cada eleição tem uma circunstância. Derrotas sucessivas não acontecem pela mesma razão. A Marta sai bastante forte no PT pela campanha que fez e vamos ver agora qual será o cenário para 2010. É bastante prematuro procurar imaginar qual será o papel que Marta jogará. Mas construir um quadro político e eleitoral não é fácil. Precisamos preservar o patrimônio que já temos.

Valor: É preciso pensar duas vezes antes de lançar nome novo em disputa majoritária?

Carvalho: Sem dúvida alguma. Duas vezes e mais duas. A construção de uma liderança eleitoral é difícil, é complexa.

Valor: O PT sofreu derrota surpreendente em Santo André, depois de ter quase vencido no primeiro turno. Como se explica este resultado?

Carvalho: Por um lado, houve fadiga de material. Com uma interrupção, o PT está no poder na cidade desde 1988. Do outro, evidentemente, as prévias que foram disputadas no ano passado, pelo seu grau de dureza, deixaram marcas. O secretariado do prefeito João Avamileno entregou os cargos. O partido se unificou depois, mas muitos foram para São Bernardo do Campo, trabalhar na eleição de Luiz Marinho. Figuras centrais para o partido na cidade, como Miriam Belchior, ficaram em Brasília. Além disso, o adversário Aidan Ravin (PTB) foi competente em conseguir apoio do governo de São Paulo, por meio do deputado estadual Campos Machado, e deu uma arrancada extraordinária na campanha, passando do terceiro lugar nas pesquisas para a vitória no segundo turno. Agora, é verdade que o Vanderlei Siraque praticamente ganhou no primeiro turno e a derrota deve-se, portanto, a acontecimentos da própria campanha e não a razões de fundo. Esta derrota em Santo André é um aprendizado que precisamos fazer.