Título: Lula discute linhas de crédito com montadoras
Autor: Olmos , Marli
Fonte: Valor Econômico, 29/10/2008, Empresas, p. B10

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reunirá com os presidentes das montadoras hoje à tarde, pouco antes da abertura do 25º salão do automóvel. O crédito está na pauta do encontro. A indústria deverá jogar pesado para que Lula anuncie medidas para melhorar os financiamentos de carros. O presidente da General Motors, Jaime Ardila, disse ontem que se o problema do crédito não for resolvido nos últimos dois meses do ano, a indústria automobilística entrará em 2009 em recessão.

Há uma grande expectativa de que Lula anuncie a participação dos bancos estaduais no sistema de financiamento dos veículos para evitar que as fábricas continuem parando. A partir de amanhã a Fiat Automóveis paralisará a produção no Brasil durante três dias. O presidente da companhia, Cledorvino Belini, disse, no entanto, que trata-se de uma "parada técnica". A empresa já havia dado férias de dez dias a 13% do efetivo. Mas não é só a Fiat. Honda, General Motors e Volkswagen anteciparam férias coletivas para este mês ou o próximo.

Depois de dois dias tentando amenizar os efeitos da crise em declarações à imprensa na apresentação do salão do automóvel, ontem os presidentes das montadoras traçaram um cenário mais pessimista durante um seminário promovido pela revista "Autodata".

Ardila, da GM, traçou três cenários para 2009 e disse que o pessimista vai acontecer no caso de a questão do crédito não ser solucionada em menos de três meses. Nesse caso, o mercado interno, que ele estima em 2,95 milhões este ano, cairia para 2,6 milhões em 2009. Consequentemente, o ritmo de produção sairia dos estimados 3,57 milhões em 2008 para 3,18 milhões, no próximo ano.

O executivo teme também por demissões no setor no caso de a questão do crédito não ser resolvida. "A oportunidade de normalizar essa situação e evitar que as empresas comecem a demitir é agora, nesses três meses."

No mesmo seminário, o presidente da Renault, Jérôme Stoll, também traçou três diferentes mercados de veículos em 2009: 2,9 milhões no cenário "rosa", 2,7 milhões no "azul" e 2,4 milhões no "preto". "A crise na liquidez e a reversão de um quadro com juros baixos e prazos longos, que foram os fatores que possibilitaram o crescimento rápido do mercado, hoje representam o maior obstáculo e podem provocar um desabamento", disse o presidente da operação brasileira do grupo francês PSA Peugeot Citroen, Vincent Ranbaud.

Ranbaud aproveitou ontem a presença de inúmeros representantes da indústria de autopeças no seminário para fazer um apelo. Ele pediu para que os fornecedores não reajustem preços. O executivo prevê que a desvaloriação do real provocará um impacto na inflação de custos industriais. "Se não conseguirmos controlar os custos não poderemos controlar os preços e os clientes não poderão comprar os carros", disse aos fornecedores.

A decisão dos dirigentes da indústria automobilística de afinar o discurso num tom menos pessimista, durante a festa de apresentação do salão do automóvel aos jornalistas, pode ter sido uma maneira de o setor, em que o crédito é tão importante, ajudar o governo a resguardar a imagem da saúde financeira do país. E, dessa forma, garantir um anúncio da ajuda governamental mais tranqüilo. Mas, diante da queda de vendas, aumento dos estoques e a proximidade do momento em que podem pressionar o governo a irrigar o crédito, o posicionamento dos executivos ficou mais claro.

Há quem acredite, no setor, que algumas empresas se anteciparam com medidas para conter o ritmo de produção. Mas não há outra saída diante de um mercado em que a falta de recursos para financiamento afeta, sobretudo, as linhas de produção de carros mais simples. Por isso a antecipação de férias coletivas para outubro e novembro se concentra nas fábricas dos carros mais simples.

As montadoras que operam no Brasil têm de ficar de olho no que acontece nas suas matrizes, também atingidas pela crise. Segundo o presidente da Volkswagen do Brasil, Thomas Schmall, o grupo alemão fará uma reunião mundial em novembro para avaliar a situação econômica global.