Título: Varejo e alta renda sacam R$ 17,3 bi só em outubro
Autor: Cotias , Adriana
Fonte: Valor Econômico, 29/10/2008, EU & Investimentos, p. D2

A variação esquizofrênica dos ativos em meio à crise internacional já provocou uma fuga maciça de recursos dos fundos de varejo de alta renda para opções mais conservadoras, especialmente os Certificados de Depósitos Bancários (CDB). O lado bom é que o dinheiro permanece no Sistema Financeiro Nacional (SFN), o que reitera a confiança dos investidores nas instituições que operam no Brasil. Mas a face perversa desse fenômeno é que a migração tem potencializado os efeitos da crise global no setor. Para atender a demanda de saques dos cotistas, muitos gestores - notadamente os que não adotam prazos de carência - têm sido obrigados a se desfazer de papéis com prejuízos, trazendo a conta para dentro do portfólio e realimentando novos resgates, conforme destaca o relatório semanal do site financeiro Fortuna.

Só em outubro, as carteiras mapeadas pela empresa registraram saídas líquidas de R$ 18,5 bilhões, dos quais R$ 17,3 bilhões (ou 94%) referiam-se a recursos de fundos direcionados ao varejo e à alta renda, incluindo aqueles distribuídos por bancos comerciais, boutiques e bancos de investimentos, além de gestores independentes. Nessa estatística estão fundos de curto prazo, renda fixa, DI, multimercados e ações. Até o dia 24, o patrimônio desses portfólios encolheu 9,2% e o mês ainda nem acabou.

"Muitos investidores, acostumados aos tempos de bonança e que estavam aplicados em multimercados, simplesmente não enxergavam o risco que o produto trazia", exemplifica o vice-presidente da SulAmérica Investimentos, Marcelo Mello. O resultado, continua, é que quem não tinha estômago para agüentar tanta oscilação acabou migrando para opções mais conservadoras como fundos DI, títulos públicos ou papéis de crédito privado de primeira linha, como os CDB emitidos por grandes bancos. Ele frisa que o aplicador com cabeça de curto prazo não pode assumir o risco de um portfólio misto, que investe nos mercados à vista e futuro de juros, dólar e bolsa. "O gestor precisa de mais tempo para ver suas apostas, baseadas em fundamentos, maturarem e, de fato, entregar retornos diferenciados."

Neste ano, até o dia 24, os multimercados perderam R$ 40,749 bilhões, mas ainda reúnem um patrimônio de R$ 153,441 bilhões ou 13,03% do total do setor. A rentabilidade, em 3,91% na média, perde feio para o CDI, em 9,77%. Dos portfólios de renda fixa, com um retorno de 9,05%, saíram outros R$ 33,903 bilhões. Nesse caso o investidor trocou o custo da taxa de administração e as oscilações nas cotas por retornos bem mais atraentes no CDB e sem qualquer variação visível. Vale lembrar que só na semana passada, os renda fixa tiveram dois dias de cota negativa na média: no dia 22 perderam 0,07% e no dia 24, 0,05%. Na semana, ainda ganharam 0,03%, de acordo com os dados do Fortuna.

Mais seletivos na hora de emprestar, enquanto não direcionam os recursos captados via CDB para os tomadores, os bancos comerciais mantêm o dinheiro em títulos de curto prazo. Por seu lado, os fundos, que vinham privilegiando ativos longos, agora fazem o caminho inverso, privilegiando liquidez e operações mais curtas de menor risco. Mas em tempos de alta instabilidade não há como evitar as agruras da marcação a mercado. Com novos prejuízos, novos saques. Quem tem reequilibrado essa balança, no mercado de renda fixa pelo menos, são as fundações, conta Mello. Com metas atuariais de INPC mais 6% ao ano, esses institucionais, com passivos de longo prazo, estão aproveitando para incorporar às suas carteiras papéis indexados ao IPCA, com juro real na casa dos 10% ao ano.

Na conta do ano, o que surpreende são os fundos de ações, que ainda exibem captação de R$ 3,510 bilhões até o dia 24, apesar da desvalorização de quase 49% das cotas no período. Já os fundos de privatização, com ações da Vale e da Petrobras, e vendidos pelos bancos de varejo, perdem R$ 1,217 bilhão. "O investidor de ações tem enxergado esse movimento todo como ajuste e sabe que se sair agora vai realizar o prejuízo", diz Mello. "Passada a situação de pânico, ele sabe que os fundamentos prevalecem."