Título: ONS reduz a quase zero risco de faltar energia
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2008, Brasil, p. A4

Projeções recém-compiladas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) demonstram um risco de déficit de energia - mesmo que seja de um único megawatt - inferior a 5%, nos próximos cinco anos, para todas as regiões do país. Esse índice está de acordo com as normas de segurança para matrizes baseadas em fonte hídrica, como a brasileira, mais sujeitas ao regime de chuvas. No caso de déficits maiores do que 1% de toda a carga - equivalente a uma demanda em torno de 1.000 MW maior do que a oferta -, o risco cai para níveis inferiores a 3%, segundo o ONS.

As informações foram dadas ao Valor pelo diretor-geral do órgão, Hermes Chipp, que considera "praticamente nulas" as chances de problemas no abastecimento de energia. Os cálculos feitos pelo ONS já levam em conta os últimos leilões promovidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), incluindo a contratação de energia de reserva gerada a partir do bagaço da cana-de-açúcar e a revisão das estimativas para a carga nacional.

Chipp espera chegar ao dia 30 de novembro, quando as chuvas tendem a se intensificar, tendo cumprido o nível-meta dos reservatórios. O objetivo é chegar aos 53% de armazenamento nos reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste e aos 35% no Nordeste. Se alcançar esse volume de água estocada, o ONS garante que não haverá nenhuma chance de racionamento em 2009, mesmo na ocorrência da pior seca da história no Nordeste e na segunda pior do Sudeste/Centro-Oeste.

Ainda que atingir esses níveis requeira esforço do operador ao longo de novembro, trata-se de uma mudança significativa em relação ao quadro preocupante do início de 2008, quando o atraso nas chuvas levantou novamente os fantasmas de um apagão. Chipp afirma que os níveis-meta serão alcançados se chover 100% da média histórica no Sudeste. Exceto pela região Norte, o estoque de água armazenada nos demais reservatórios é um pouco mais confortável do que na mesma época do ano passado. A diferença agora é, além da perspectiva de chuvas sem atraso, o elevado volume das represas no Sul.

Em outubro, choveu 160% da média histórica no Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. E os reservatórios da região estão com quase 90% de sua capacidade máxima. Com isso, o ONS decidiu montar uma estratégia de transferir mais de 3 mil MW médios do Sul para o Sudeste, a fim de poupar água dessa região. Essa transferência deve ocorrer até o fim de novembro, diz Chipp.

"Em dezembro, janeiro e fevereiro não devemos usar térmicas", afirma o diretor-geral. Segundo ele, o período de transição da estiagem para as chuvas está ocorrendo "dentro da normalidade" e o país teve uma "mudança radical em termos de segurança (do abastecimento)".

Os críticos da estratégia adotada ao longo de 2008 pelo ONS reconhecem o cenário de baixo risco, mas dizem que essa segurança só foi obtida devido ao uso indiscriminado e pouco racional das térmicas movidas a óleo, mais caras do que outras fontes. Elas geram energia por até R$ 800 cada megawatt-hora (MWh) - no caso de hidrelétricas, o custo costuma ser inferior a R$ 120. Chipp rebate as críticas. "Não tenho dúvidas de que valeu a pena. O custo mais alto da energia é daquela que não existe", afirma o diretor.

Para o presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales, que representa investidores privados no setor elétrico, essa alegação deve ser vista "com senso crítico". "No curto prazo, o risco de racionamento caiu para níveis aceitáveis, mas cabe dar transparência a esse custo", ressalta o executivo.

Sales lembra, citando números da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que o pagamento de Encargo de Serviços do Sistema (ESS) superou R$ 1,5 bilhão de janeiro a julho de 2008. No mesmo período do ano passado, eram menos de R$ 100 milhões. A ESS é um encargo cobrado de todos os consumidores do sistema interligado sempre que as termelétricas são acionadas por motivos emergenciais. Neste ano, isso ocorreu até maio. "Qualquer custo é menor do que o da falta de luz. Mas o que se espera de um bom planejamento é evitar o problema sem gastos tão elevados", argumenta.