Título: Argentina busca conter corrida ao dólar
Autor: Souza , Marcos de Moura
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2008, Internacional, p. A11

Temores em relação à economia argentina estão levando correntistas a sacar seus recursos nos bancos do país e a comprar dólares. A movimentação tem pressionado o câmbio, que ontem fechou em queda, a 3,39 pesos por dólar. Economistas consideram que a situação é ainda administrável, mas que no médio prazo os efeitos da crise internacional ameaçam pôr o país num quadro de dificuldades.

Entre 26 de setembro e 17 de outubro, os depósitos a prazo em bancos na Argentina encolheram de 66 bilhões de pesos para 64,6 bilhões. "Há fatores externos que fazem com que os argentinos estejam com medo do sistema financeiro, mas também há os fatores internos, em especial a estatização dos fundos de pensão privados [projeto encaminhado pelo governo ao Congresso na semana passada]. Isso está levando a uma saída de capitais, o que tem pressionado o câmbio", afirmou o analista financeiro da consultoria econômica Abeceb Gabriel Martini.

Apesar da queda dos depósitos a prazo (investimentos que imobilizam os recursos por um prazo determinado), o país não tem filas nos bancos, como durante a crise no início da década. Parte dos saques tem sido feito por pequenos correntistas, parte por empresas. Muitos estão trocando seus pesos por dólares, para guardá-los em casa ou nos bancos. É sintomático que um dos serviços bancários mais procurados hoje no país é o aluguel de cofres para o armazenar dinheiro vivo. Algumas grandes empresas também têm empregado seus recursos aplicados no sistema financeiro para pequenos investimentos em vez de recorrerem a empréstimos - cujos juros chegam a 30% em algumas linhas.

As tentativas do Banco Central e dos bancos para deter a tendência de saques não têm mostrado muitos resultados por enquanto. Com uma inflação real na casa dos 20%, de pouco adianta taxas de retorno ao redor de 11% e 12%.

Na avaliação de um executivo do setor financeiro argentino ouvido pelo Valor, o risco é a tendência de saques bancários ganhar corpo, o que certamente forçaria algumas instituições a precisar de ajuda. "Além disso, o aperto no crédito e a provável desaceleração da atividade econômica pode colocar o país numa espiral negativa nos próximos meses", disse ele.

Mas Martini diz que o país está longe da situação da crise de 2001. "Na época, a maior parte dos ativos estava em dólar. Hoje, o BC teria capacidade de, no limite, emitir mais pesos para cobrir as demandas dos depositantes".