Título: Ações contra o PAC crescem 50% em 5 meses
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2008, Brasil, p. A3

O governo decidiu adotar uma nova estratégia para agilizar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e está realizando sessões de conciliação com quem ingressa com ações na Justiça para impedir a continuidade dos empreendimentos.

Essa estratégica tornou-se necessária em função de um grande salto no número de novos processos contra obras do governo. De abril a setembro, houve um aumento de 50% nas ações contra o principal programa do governo Lula, carro-chefe da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Eram 619 ações em abril e chegaram a 923 em setembro.

A maior parte dessas ações se refere a desapropriações realizadas para a construção de rodovias e hidrelétricas. Um dos problemas mais comuns é que, após o anúncio de que a obra fará parte do PAC, tem início uma verdadeira especulação imobiliária na região e os donos de propriedades impõem uma série de dificuldades aos processos de desapropriação, utilizando principalmente a Justiça para tanto.

O governo responde a 561 processos de desapropriação com relação ao PAC, das quais 164 surgiram num intervalo de cinco meses, entre abril e setembro deste ano. Essas ações equivalem a 61% do total de processos na Justiça sobre o programa. Normalmente, são ações movidas contra o Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transporte (DNIT), no caso das rodovias, ou contra concessionárias, no caso da construção de hidrelétricas.

A União é ré em outras 87 ações civis públicas movidas pelo Ministério Público em que são contestados os processos de licenciamento ambiental das obras. O governo também responde por oito ações populares de organizações não-governamentais (ONGs). Além disso, há 177 ações ordinárias, 54 ações possessórias (direito de posse), 18 cautelares e 18 mandados de segurança. Nessas, há todo o tipo de discussão, desde pedidos de indenização a tentativas de impedir as obras.

"Quando se trata do PAC, o nosso trabalho sempre aumenta", afirmou Helia Bettero, diretora da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Advocacia-Geral da União (AGU). Segundo ela, tornou-se cada vez mais constante a prática de convocar representantes do Ibama e do Ministério Público para chegar a acordo e, com isso, permitir a continuidade das obras. "Procuramos convocar esses órgãos para resolver o problema na Câmara de Conciliação da AGU." Pela conciliação, o governo nomeia uma terceira parte para interferir diretamente no conflito, apresentando sugestões para dirimi-lo.

Helia revelou que muitas vezes as próprias empresas interessadas na conclusão das obras oferecem indenizações para quem recorre à Justiça na tentativa de evitar que o empreendimento fique parado no Judiciário.

Apenas para a construção da hidrelétrica de Estreito, no Tocantins, foram necessárias 13 liminares na Justiça para dar o direito de posse da região às concessionárias. A usina faz parte do PAC e será construída na divisa com o Maranhão até 2010. Tratava-se de uma região de baixo valor imobiliário, mas, logo após o anúncio da nova usina, ficou mais difícil desapropriar as terras. O procurador-chefe da União em Tocantins, André Luís Rodrigues de Souza, reconhece que existe o legítimo interesse de pessoas que moram há muitos anos nas áreas atingidas pelos empreendimentos. O problema, para ele, é que as obras também levam especuladores "que só foram para lá depois que a obra foi anunciada pelo governo".

Outra dificuldade é a quantidade de ações que o governo tem que mover para desapropriar algumas áreas. Apenas para dar continuidade às obras ferroviárias em Araraquara, no interior de São Paulo, foram necessários nove processos na Justiça. Em duas dessas ações, a Procuradoria Federal obteve liminar para assegurar a posse de imóveis ao DNIT. Em outras sete foram iniciadas audiências de conciliação para que os proprietários dos imóveis fossem indenizados. O objetivo dessa obra é retirar os trilhos de trem do centro da cidade, o que daria maior agilidade ao escoamento da produção para o porto de Santos, rumo à exportação.

A Câmara de Conciliação foi utilizada para evitar várias pendências que poderiam se estender por anos no porto de Santos. Neste ano, a Agência Nacional de Transportes Aquáticos (Antaq) alegou ao Ministério dos Transportes que havia a necessidade de licitação para o arrendamento de áreas do porto localizadas entre as locomotivas e os navios. Criou-se um impasse e a AGU chamou representantes da Antaq, da ANTT (transportes terrestres), do Ministério dos Transportes e da estatal que administra o porto - a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp). Ao final do encontro, todos concordaram que o transporte de cargas deve passar necessariamente pelo porto e, por isso, não é preciso realizar nova licitação para mover as cargas nessas áreas. Foi uma questão simples, só que poderia se prolongar por anos na Justiça, caso os envolvidos não sentassem à mesa e chegassem a um acordo.