Título: Para suavizar crise, governo alonga prazo de impostos
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Fonte: Valor Econômico, 11/11/2008, Opinião, p. A10

A mais recente etapa do pacote de medidas governamentais para enfrentar a crise financeira mundial, anunciada na semana passada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, ganhou ares de novidade com a decisão de alongamento do prazo de recolhimento de tributos, como o Imposto sobre Produção Industrial, o Imposto sobre a Renda e a contribuição previdenciária das empresas. Desde que, em meados do mês de setembro, os problemas no segmento financeiro americano abalaram todo o sistema bancário e de crédito do mundo, esta foi a primeira decisão de Brasília que procurou ajudar as empresas diretamente, sem passar pela intermediação de bancos e outras instituições.

Cálculos do ministro da Fazenda mostram que o adiamento de dez dias na transferência de recursos do setor privado como pagamento de impostos representa um fôlego de capital de giro equivalente a R$ 21 bilhões. Os empresários queriam prazos ainda mais dilatados e não se deve esperar uma reversão das expectativas negativas, mas não se pode negar que foi um passo importante para o setor privado.

Por ser uma medida universal, que beneficia todas as empresas independentemente do setor em que atuam, ela pode servir, de fato, como um alento para a economia brasileira, que começa a apresentar os primeiros sinais de que a paralisação do crédito está afetando os negócios. Os principais indicadores do nível de atividade econômica, consolidados mensalmente pelo IBGE, ainda não mostraram os estragos causados pela crise financeira global, mas informações repassadas pelas empresas e pelas entidades representativas do comércio e da indústria confirmam que há, sim, grandes motivos para preocupação com o ritmo da economia brasileira nos próximos meses.

A preocupação com os efeitos da crise já levou empresas de diferentes setores a reverem a programação de férias e até a cortar pessoal. O setor de autopeças antecipou as férias coletivas ajustando-se ao calendário das montadoras. A situação mais dramática está nos segmentos da construção civil e de papel e celulose, nos quais empresas já iniciaram o processo de demissões. No setor varejista, a contratação de temporários para as vendas de fim de ano - que só em São Paulo gera 300 mil novos postos de trabalho nessa época - está em suspenso, conforme retratado pela edição de sexta-feira do Valor.

No setor da construção civil de São Paulo, a média de homologações, que era de 40 pessoas por dia, aumentou para 150 pessoas ao dia desde a semana passada, informou o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de São Paulo, sendo que esse incremento não é comum nesse período. As construtoras estariam com dificuldades de obter crédito para dar início a projetos e preferem dispensar parte dos funcionários, enquanto não têm uma definição sobre 2009. A maior parte das demissões seria de engenheiros e mestres de obras.

No setor de papel, houve demissões em empresas que têm atividades ligadas à Aracruz, que reviu seus projetos de investimento após prejuízo com derivativos. Em Belo Horizonte, o grupo Plantar (que produz eucaliptos) anunciou a demissão de 750 dos 1 mil trabalhadores. No segmento metalúrgico, a GM anunciou na quarta-feira a abertura do programa de demissões voluntárias na fábrica de São José dos Campos (SP), que possui 9,4 mil trabalhadores, mas sem meta de homologações. Em Campinas, além das férias coletivas, há um crescente número de demissões comunicadas ao Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e Região: o setor de autopeças efetuou desde a última quinzena de outubro entre 250 e 300 demissões.

Além de adiar o pagamento de impostos, foi anunciado na semana passada que governo federal está liberando mais R$ 10 bilhões para o BNDES emprestar para pequenas e médias empresas e empresas exportadoras. Os recursos do BNDES serão obtidos por meio de emissão de títulos do Tesouro Nacional que seriam comprados pelo BNDES ou pela autorização para que o banco emita CDIs para bancos privados e se capitalize. Com isso, o BNDES poderá financiar capital de giro para pequenos empresários, operações de pré-embarque de exportações e empréstimos-ponte. Em relação ao setor agrícola, ficou decidido que o governo comprará os produtos pelo preço mínimo, garantido o estoque, ou pagará a diferença entre o preço mínimo e o preço de mercado.