Título: Empresas mantêm planos apesar do cenário de crise
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 12/11/2008, Brasil, p. A3

Num momento em que várias empresas adiam investimentos devido ao agravamento da crise global, grandes projetos que contam com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) seguem o seu curso normal. Levantamento do Valor com 10 empresas que fecharam contratos com o banco a partir de abril, totalizando empréstimos de R$ 4,265 bilhões, mostra que o cronograma original de todos eles está mantido, apesar da piora da situação internacional.

Um dos setores em que o dinheiro do BNDES tem bastante importância é o sucroalcooleiro, no qual várias companhias encontram dificuldades para financiar projetos de investimento. O grupo Santa Terezinha já obteve cerca de 20% do valor de R$ 168,5 milhões que deverá ser financiado pelo BNDES para implantar o projeto de co-geração de energia e expansão do parque industrial da unidade de Paranacity, instalada na cidade que leva o mesmo nome no Paraná. Segundo o departamento financeiro da empresa, o grupo solicitou a liberação da segunda parte do financiamento em outubro. "A liberação dos recursos está ocorrendo dentro dos prazos estipulados pelo banco", informou uma fonte da companhia.

Já a usina Iacanga, do grupo Ipiranga,obteve a liberação de 74% do total dos investimentos previstos para expansão da capacidade produtiva da usina de açúcar e álcool e para a implantação do projeto de co-geração de energia a partir do bagaço de cana, de R$ 52,7 milhões. Segundo o departamento financeiro da empresa, não tem ocorrido demora na liberação dos recursos.

O grupo Cosan, que tem nove projetos para co-geração de energia a partir do bagaço de cana, tem dois de seus projetos já financiados pelo BNDES, segundo Pedro Mizutani, vice-presidente geral da companhia. As usinas Costa Pinto e Rafard, ambas em São Paulo, terão financiamento de R$ 225,3 milhões do banco. Deste total, 15% do valor já foi liberado, segundo Mizutani. "Vamos pedir consulta para o financiamento de outros projetos." Se todos os projetos das nove usinas forem implementados, serão investidos cerca de R$ 2 bilhões, informou Mizutani.

Os recursos do BNDES também têm peso na expansão das empresas do setor frigorífico. A injeção de R$ 700 milhões feita pela BNDESPar na Marfrig, por meio de uma subscrição privada de ações, em agosto de 2008, aumentou a musculatura da empresa e acelerou a aquisição de empresas da americana OSI no Brasil e no exterior, segundo Ricardo Florence, diretor de relações com investidores do grupo. Na Europa, a Marfrig assumiu a Moy Pork, além da Kitchen Range Foods (Reino Unido) e da Albert Van Zoonen (Holanda). No Brasil, a empresa ficou com a Braslo, a Penasul e a Agrofrango. Ao todo, o valor da transação foi de - US$ 680 milhões.

No caso da Bertin, a capitalização feita pela BNDESPar neste ano, da ordem de R$ 2,5 bilhões - R$ 1,8 bilhão já aplicados -, permitiu que a empresa fortalecesse sua estrutura societária de capital e sua governança corporativa. O dinheiro está sendo destinado à modernização e expansão de unidades produtivas e aquisição de novas indústrias no Brasil e no exterior.

Primeira empresa a admitir perdas com derivativos decorrentes da alta do dólar, a Sadia obteve junto ao BNDES, em junho de 2008, a liberação de um financiamento de R$ 329,8 milhões destinado a seu projeto agroindustrial de Lucas do Rio Verde, em Mato Grosso. A Sadia informou que o valor equivale a 70% de um investimento que envolve, no total, a construção de novas unidades de abate de aves e de suínos, uma planta de industrialização de carne suína, uma fábrica de rações e um conjunto habitacional para funcionários. Apenas o abatedouro de suínos não foi concluído ainda, o que deve acontecer no máximo até fevereiro de 2009.

Em setembro e outubro, a Vonpar Refrescos recebeu em torno de R$ 38 milhões de um empréstimo do BNDES, no total de R$ 91,5 milhões. O objetivo, segundo o presidente-executivo da Vonpar, Augusto César Parada, é a "expansão das unidades fabris e adequação de sistemas para suportar a operação da Vonpar no período de maior demanda, o verão".

Parada disse que o cronograma não sofreu alterações por causa da crise, "basicamente porque 80% do mesmo se realizou entre o período do 4º trimestre de 2007 e o 1º semestre 2008". Ele destaca que outros projetos da Vonpar também não foram atingidos pela turbulência financeira.

Rede de varejo que apostou na forte expansão dos negócios neste ano, o Magazine Luiza tem um empréstimo de R$ 76,5 milhões com o BNDES, para a abertura de 100 lojas e reforma de outras 30, além da aquisição de equipamentos para o centro de distribuição de Louveira, em São Paulo. A empresa informa que a crise não alterou nenhum plano de investimento da empresa. "Todas as ações previstas estão sendo realizadas como havíamos planejado."

A Droga Raia também tomou um empréstimo do BNDES para financiar a abertura de novas lojas, no valor de R$ 90 milhões, que já estão sendo usados. "A rede está em ritmo de crescimento acelerado e o aporte de R$ 90 milhões ajudou neste momento", informou a Droga Raia. A empresa relatou que ainda não sentiu o impacto da crise, "Atuamos num setor privilegiado, oferecendo itens e serviços de primeira necessidade".

Na Duratex, o cronograma de implementação de uma unidade industrial em Agudos, em São Paulo. também não foi alterado. O projeto começou no fim do primeiro semestre, com recursos da própria empresa, diz o diretor de Relações com Investidores da Duratex, Alvaro Penteado de Castro. O dinheiro do BNDES - R$ 30,8 milhões, cerca de metade do valor total - deverá ser liberado em breve, assim que for feita a comprovação para o BNDES do que já foi feito. Segundo Castro, o cronograma está mantido porque se trata de um projeto estratégico, ligado ao acabamento para a construção civil, para o qual há a expectativa de que as vendas continuarão positivas.

Castro disse, porém, que a empresa adiou por seis meses investimentos de cerca de R$ 1 bilhão, de um total de R$ 1,9 bilhão, a serem realizados nos próximos cinco anos. "A decisão tem a ver com a mudança brusca de cenário causada pela crise, que provocou incerteza em relação à demanda futura", afirmou Castro.