Título: Governo perde aliado na liderança do PMDB
Autor: Henrique Gomes Batista e Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 24/02/2005, Política, p. A14

Em mais um lance da disputa interna entre as alas oposicionista e governista do PMDB, o deputado Saraiva Felipe (MG) foi eleito ontem líder da bancada na Câmara, impondo outra derrota ao governo, que pretendia manter o aliado José Borba (PR) na posição de líder. Apenas 48 dos 85 deputados da bancada estiveram presentes e Borba promete ir à Justiça questionar a legitimidade da reunião. Entre os 48 presentes, Saraiva recebeu 43 votos. O mineiro contou com o apoio da ala oposicionista do PMDB, sob a influência do ex-governador e atual secretário de Governo do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho. Saraiva prometeu, contudo, ajudar na governabilidade do país. "Votei em Lula no primeiro e no segundo turno de 2002. Não serei um líder de oposição", disse. Os deputados pemedebistas, observou, não são de oposição, mas têm queixas do governo, sobretudo em relação ao atendimento de ministros. Ele afirmou ainda que sua primeira missão será unificar o partido. A reunião refletiu o clima tenso na bancada. A eleição foi secreta e Borba não reconheceu o resultado. "Há uma série de impugnações de filiações de deputados. Mesmo levando-se em conta apenas os 85 deputados, a situação é de empate. Nenhum dos lados pode cantar vitória ou assumir derrota", afirmou o ex-líder. Um dia antes da eleição, os dois grupos trocaram insultos e quase agrediram-se fisicamente no gabinete do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti. Saraiva não vê espaço para a contestação do resultado. "Fui escolhido líder duas vezes. Uma por lista e outra por eleição. O assunto está liqüidado e agora vamos reunificar o partido", disse. O principal objetivo do grupo oposicionista é fazer com que a bancada siga a posição de independência ao governo Lula e pela candidatura própria para a presidência da República em 2006. Saraiva é muito ligado ao ex-presidente Itamar Franco, que deverá ter o apoio do PT nas eleições de 2006 se concorrer ao Senado. Esse vínculo será utilizado pelo Planalto para amenizar o discurso de Saraiva contra o governo. Deputados petistas avaliaram, a partir das declarações do novo líder, que haverá receptividade na tentativa de aproximação do governo com Saraiva. Borba reluta como pode. Seu grupo fez uma série de filiações ao PMDB, que chegou a contar com 94 deputados, para garantir maioria na bancada, mas as filiações foram impugnadas pelo partido. Borba e Saraiva apresentaram sucessivas listas com assinaturas de apoio. "Não consigo prever em quanto tempo a situação do partido estará definida. Acredito que prosseguiremos com essa disputa até o limite do bom senso", advertiu. Preocupados com o impacto que a divisão do PMDB pode ter na reforma ministerial, dirigentes do partido tentam uma pacificação interna para dirimir a força do grupo oposicionista ligado a Garotinho. O líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), considera que o partido comete um erro crasso ao dividir-se num momento delicado para o governo, com a eleição de Severino. "Se eu fosse o presidente Lula, estaria pensando assim: por que dar força a alguém que está dividido?", disse o pemedebista. Ao lado do presidente do Senado, Renan Calheiros, Suassuna tem ligado para governadores do PMDB. Ontem, Calheiros conversou longamente com Garotinho e o governador do Paraná, Roberto Requião. O líder pemedebista ficou encarregado de conversar com o governador de Santa Catarina, Luiz Henrique. Para aproximar o PMDB do Executivo, Suassuna decidiu marcar encontros semanais da bancada de senadores com ministros. Hoje será realizada a primeira reunião, com o ministro das Cidades, Olívio Dutra. O gaúcho petista é apontado pelos parlamentares como um dos mais inacessíveis integrantes do primeiro escalão. Na próxima semana, os pemedebistas conversam com o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. A avaliação de dirigentes pemedebistas é que o foco da disputa interna é 2006. Isso explica a posição de Garotinho, que quer disputar a presidência, e a forte oposição do ex-governador Orestes Quércia, presidente do PMDB de São Paulo, ao governo federal. Quércia já confidenciou a correligionários que pode haver um vácuo na disputa do governo paulista. Se o governador Geraldo Alckmin disputa a presidência da República e o PT se fragiliza com os embates internos durante a escolha do candidato ao governo, há espaço para o crescimento de uma candidatura do PMDB, na visão de Quércia. A confusão no PMDB é tanta que já há até parlamentares desistindo da filiação. "A Câmara virou uma trincheira. Criamos a liderança pipoca. Cada dia, o líder é um. O PMDB só é forte unido. No Senado, a bancada está consolidada e elegemos Renan", analisou Suassuna.