Título: Mangá ganha espaço fora dos redutos japoneses
Autor: João Luiz Rosa
Fonte: Valor Econômico, 24/02/2005, Empresas &, p. B3

Pergunte a um adulto com idade entre 30 e 40 anos qual a identidade secreta do Superman, o nome da namorada do Mickey ou o que a Mônica usa para bater no Cebolinha e ele dificilmente errará as respostas: Clark Kent, Minnie e o coelhinho Sansão. Mas vá em frente e pergunte algo sobre Kenshin Himura. Kenshin, o quê? Se você também não o conhece, saiba que o errante Kenshin - o protagonista de Samurai X - é parte de um dos mais recentes fenômenos do mercado de histórias em quadrinhos no país: a invasão das revistas japonesas ou mangás, como são conhecidas pelos fãs. Para ter uma idéia da aceitação dos mangás, a editora JBC encerrou a coleção Samurai X, formada por 56 edições, com mais de dois milhões de exemplares vendidos no Brasil, diz Júlio Moreno, diretor geral da empresa. Outro exemplo vem da Conrad, que também disputa o segmento. A editora lançou uma tiragem de 12 mil exemplares da "Enciclopédia Cavaleiros do Zodíaco", a R$ 39. Apesar do preço, em 15 dias precisou fazer uma reimpressão, conta Rogério de Campos, diretor editorial da empresa. O interesse dos adolescentes já justifica até feiras de mangás e animes, os desenhos animados baseados nas revistas. Depois de reunir 8 mil pessoas na versão 2004 da feira Anime Dreams, a Yamato, empresa que organiza quatro eventos anuais sobre o assunto, previa atrair 12 mil visitantes neste ano. A projeção foi superada de longe. Em janeiro, 18 mil pessoas lotaram um colégio em São Paulo, parte delas vestida com fantasias dos seus ídolos pesando até 20 quilos. Agora, a empresa busca um local grande o suficiente para sua principal exposição, a Anime Friends, que ocorre em julho. No ano passado, 27 mil pessoas participaram do evento, o que levou a Yamato a projetar um público entre 32 mil e 35 mil visitantes para a edição deste ano. Diante do resultado da feira de janeiro, porém, o número pode ser muito maior, afirma Ludmilla Paniquar, assessora da companhia. Populares no Japão desde a década de 50, os mangás estão na base de editoras como a JBC. A história da empresa remonta aos anos 40, quando o japonês Mazakazu Shoji imigrou para o Brasil. "Na época, o que permitiu sua integração foram os jornais em japonês que circulavam em São Paulo", conta Moreno. Nos anos 90, de volta a Tóquio, Shoji decidiu fazer o contrário. Com o movimento dos dekassegui - os nipo-brasileiros que emigravam para o Japão -, ele criou um jornal em português para a comunidade brasileira que chegava ao país. Hoje com 12 anos, o semanário "Tudo Bem" tem circulação de 50 mil exemplares. No Brasil, o negócio da JBC ganhou força em 2001, com os quadrinhos. Hoje, a empresa joga nas bancas cerca de 1 milhão de exemplares/mês de 16 títulos de mangás. "Eles representam cerca de 60% da receita total", diz Moreno. É difícil explicar a atração exercida por essas histórias, mas no mercado todos concordam que parte do sucesso se deve à idéia de cruzar mídias e levar os personagens para TV, jogos de videogame, brinquedos etc. É o lema do "leia a revista, jogue o game, compre o brinquedo, assista à TV...", usado em outros gêneros de quadrinhos. Na Panini, que também atua no segmento de mangás com publicações como "Lobo Solitário", a venda das revistas de super-heróis sobe 40% em média sempre que algum personagem Marvel ou DC chega às telas dos cinemas, diz Helcio de Carvalho, diretor editorial da Panini. Nem todas as editoras, porém, apostam no filão. "O 'boom' dos mangás ainda não ocorreu. Os únicos títulos que alcançaram venda relevante tiveram a força da TV por trás, como Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco", diz Sérgio Figueiredo, diretor de infanto-juvenis da Abril. A Editora Globo não tem planos no momento, mas não descarta a idéia de atuar no segmento, diz a editora Arlete Alonso. As editoras de mangás reconhecem que há desafios a superar. "O custo de produção é mais barato, mas os royalties custam caro", diz Carvalho, da Panini. Isso dificulta a composição do preço e afeta a lucratividade. Enquanto um mangá sai por US$ 6 no Japão e por US$ 10 nos EUA, no Brasil ele custa US$ 1,50, compara Moreno, da JBC. Apesar disso, as editoras pretendem investir em mais títulos neste ano. A moda de ler ao contrário parece estar apenas no início. (JLR)