Título: Acelera, mas pisa no freio
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 25/02/2010, Cidades, p. 35

Corregedor da Câmara Legislativa pede a abertura de processo contra oito distritais, porém evita juízo de valor sobre as denúncias apresentadas

Eurides Brito está entre os distritais investigados na Caixa de Pandora: corregedor sugere à Comissão de Ética fazer perícias, ouvir testemunhas e até promover acareações

Nem arranjo político nem linchamento público. É entre os dois extremos que se encontra o parecer elaborado pelo distrital Raimundo Ribeiro (PSDB), responsável por opinar no âmbito da Corregedoria da Câmara Legislativo sobre os pedidos de cassação apresentados contra os oito deputados supostamente envolvidos no escândalo de corrupção revelado pela Caixa de Pandora. Corregedor ad hoc, Ribeiro apresentou ontem seu relatório. Pediu a abertura de processo contra todos os citados no inquérito nº 650 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Também acatou a denúncia contra o presidente da Câmara, Cabo Patrício (PT), suspeito de apresentar uma lei que beneficia os negócios do colega Leonardo Prudente relacionados ao lixo. Raimundo Ribeiro, no entanto, evitou fazer qualquer juízo de valor sobre a conduta dos colegas. Remeteu à Comissão de Ética o ônus de avaliar a postura dos distritais suspeitos e diluiu assim um possível desgaste dentro da Casa com outros quatro colegas.

Em seu parecer, Raimundo Ribeiro dá vários sinais de sua estratégia jurídica para lidar com a relatoria dos distritais acusados de corrupção sem deixar de dar uma resposta à opinião pública, mas evitando se expor com os colegas encrencados, que somam um terço da composição da Câmara: Leonardo Prudente (sem partido), Junior Brunelli (PSC), Eurides Brito (PMDB), Benício Tavares (PMDB), Roney Nemer (PMDB), Rogério Ulysses (PSB), Benedito Domingos (PP) e Aylton Gomes (PR). Apesar de ter acatado as denúncias contra os colegas, o relator do processo afirmou em seu parecer que ainda faltam provas cabais capazes de tornar o inquérito do STJ por si só suficiente para justificar a quebra de decoro parlamentar dos distritais.

Por isso, Raimundo opina que, mesmo nos casos mais explícitos, aqueles gravados em vídeo ¿ os de Prudente (com dinheiro nas meias), Eurides Brito (que embolsa os recursos) e Junior Brunelli (o da oração da propina) ¿ é necessária investigação complementar. Para o corregedor, a falta de uma perícia sobre a autenticidade dos vídeos gravados pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa não permite análises conclusivas sobre os episódios narrados no inquérito da Justiça.

Pot-pourri Outro argumento levantado pela Corregedoria em nome da neutralidade foi o impasse criado entre o conteúdo das acusações e a negativa dos acusados. ¿É uma controvérsia que só pode ser resolvida com mais apuração dos fatos¿, disse Raimundo. Ele sugere à Comissão de Ética fazer perícias, ouvir testemunhas e até promover acareações. O corregedor ad hoc considera que foi prejudicado por não ter tido acesso completo ao inquérito que corre no Superior Tribunal de Justiça. Segundo contou, ele esteve mais de uma vez com o ministro do STJ Fernando Gonçalves, mas não conseguiu receber informações complementares sobre a Operação Caixa de Pandora: ¿Com certeza isso atrapalhou o meu trabalho¿.

Raimundo disse que construiu sua opinião sobre o destino dos deputados a partir da consulta a uma série de pessoas, entre as ¿simples, sem formação superior, dotadas de cultura elevada, desembargadores, juízes, ministros, advogados, padres, pastores¿. O resultado desse pot-pourri de opiniões deu o tom do relatório da Corregedoria: ¿Pude notar que a população deseja que eventuais notícias envolvendo pessoas públicas sejam investigadas, mas não deseja que se faça arranjos nem se promova linchamentos¿, diz o corregedor.

Com a conclusão do relatório, o próximo passo será a votação do parecer na Comissão de Ética, formada pelo próprio Ribeiro, Bispo Renato (PR), Batista das Cooperativas (PRP), Érika Kokay. Há uma vaga ainda a preencher, aberta com a saída de Geraldo Naves (DEM), preso há duas semanas em função das denúncias de suborno de testemunha. Ainda não há prazo para a análise do relatório, que se tiver maioria favorável caracterizará formalmente a abertura de processo por quebra de decoro contra os distritais.

O parecer

Nos três casos considerados mais explícitos (Leonardo Prudente, Eurides Brito e Junior Brunelli) sobre suposta participação no esquema de pagamento de mesada, Raimundo Ribeiro alega que não teve acesso à perícia dos vídeos, o que torna necessária a investigação no âmbito da Comissão de Ética;

Raimundo Ribeiro afirma que apesar de ter pedido ao ministro Fernando Gonçalves do STJ acesso ao teor completo do inquérito nº 650, não foi atendido. Para o corregedor ad hoc, a falta das informações adicionais comprometeu seu trabalho;

Para o corregedor, os vídeos, as conversas e os depoimentos contidos no inquérito judicial não são provas cabais contra os distritais citados no escândalo. Na visão dele, cabe à Comissão de Ética complementar as investigações com depoimentos, perícias, acareações;

Segundo entendimento da Corregedoria, o impasse criado pelos distritais ao negarem as acusações que pesam contra eles só pode ser desfeito na chamada fase de investigação remetida à Comissão de Ética.

Votação do impeachment na Câmara

ANA MARIA CAMPOS Araújo marcou a votação do relatório para a manhã desta sexta-feira

O deputado distrital Cristiano Araújo (PTB) marcou para amanhã a votação do relatório sobre a admissibilidade dos pedidos de impeachment contra o governador afastado José Roberto Arruda (sem partido) na Comissão Especial criada na Câmara Legislativa para apreciar o assunto. O deputado Chico Leite (PT), relator do caso, vai defender a abertura de processo por crime de responsabilidade contra Arruda. A expectativa é de que, como ocorreu na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), essa posição seja aprovada por unanimidade.

Há, no entanto, uma divergência. Cristiano Araújo avalia que o processo será aberto assim que Arruda for notificado da decisão da Comissão de Ética. Isso significa que o prazo para Arruda tomar uma decisão que interrompa o andamento do caso e a consequente pena de inelegibilidade por oito anos em caso de condenação é curto. Terminaria na próxima segunda-feira. Chico Leite avalia que o prazo é mais elástico. O processo só seria iniciado após a apresentação de defesa prévia de Arruda, antes da votação de um novo relatório sobre o mérito no plenário da Câmara, o que deverá ocorrer em até 45 dias. ¿Para dirimir essa divergência, proponho levar a dúvida ao procurador-geral da Câmara¿, afirma Chico Leite, que integra carreira jurídica, como procurador de Justiça licenciado do Ministério Público do DF.

Além de Cristiano e Chico Leite, José Antônio Reguffe (PDT), Batista das Cooperativas (PRP) e Paulo Roriz (DEM) integram a Comissão Especial. Antes do aprofundamento da crise provocada pelas denúncias levantadas na Operação Caixa de Pandora, seriam considerados certos votos pró-Arruda de Cristiano, Batista e Paulo Roriz, aliados do governador que está afastado do cargo desde a decretação de sua prisão preventiva há duas semanas. A base de Arruda, no entanto, está esfacelada. Ele tem poucos aliados na Casa entre os deputados que até agora não sofreram acusações de participação no suposto esquema de desvio de recursos de contratos de prestação de serviços para pagamentos de mesadas a secretários e a deputados distritais.

Vídeo Segundo denúncia do ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa, o próprio Arruda e o ex-vice-governador Paulo Octávio também seriam beneficiários. Eles sustentam que são vítimas de uma armação política engendrada por Durval. Pesa ainda contra Arruda um vídeo em que ele aparece recebendo R$ 50 mil das mãos de Durval, em 2005, quando ele era presidente da Companhia de Planejamento (Codeplan). Em sua defesa, Arruda disse que o dinheiro foi usado como doação anual para compra de panetones destinados a famílias carentes.

Essa defesa, no entanto, é contestada pelo Ministério Público Federal. Na última sexta-feira, a subprocuradora-geral da República Raquel Dodge protocolou denúncia contra Arruda por falsificação de documentos. Afirma que os recibos foram produzidos posteriormente apenas para maquiar o recebimento do dinheiro de origem ilegal. O governador afastado disse em entrevista ao Correio, em dezembro, que os recibos foram assinados por Durval em outubro do ano passado, mas que as doações seriam legais.