Título: Impasse no Senado abala Temer na Câmara
Autor: Costa , Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 14/11/2008, Política, p. A8
Aparentemente consolidada, a candidatura do deputado Michel Temer (PMDB-SP) a presidente da Câmara, que tem o apoio do PMDB, do PT e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está sob bombardeio: aliados decidiram lançar outros candidatos ao cargo, o que divide o eleitorado, ressurgiram antigas denúncias contra o deputado e o PMDB do Senado resolveu que vai fazer valer sua maior da bancada para assegurar a presidência da Casa e do Congresso, que tem sido quase um monopólio do partido, desde a redemocratização, em 1985. Ruy Baron/Valor - 11/3/2008 Sarney: senador preferiria um aliado na presidência do Senado mas é o único nome do PMDB que não teria o veto de Lula
A força de Temer reside no apoio do PT, a segunda maior bancada, depois do PMDB. É a retribuição dos petistas ao apoio pemedebista à eleição de Arlindo Chinaglia (SP), em 2007. De início, o PT deu sinais de que recuaria no acordo, na hipótese de o PMDB não retribuir no Senado em favor do senador Tião Viana (AC), onde a bancada petista é apenas a terceira. Agora, a bancada do PT resolveu afirmar que não há "vinculação" entre as duas eleições e que vai cumprir sua parte no acordo.
É o que o PMDB do Senado defende desde o início - e de fato, o acordo de 2007 restringia-se à Câmara. A declaração do PT aparentemente dissipou as desconfianças e consolidou a candidatura de Temer. Na realidade, agravou-lhe os problemas: em reuniões previstas para esta semana com o presidente Lula, os senadores devem reafirmar a intenção de eleger o sucessor de Garibaldi Alves, e a conquista das duas presidências pelo PMDB é algo que alarma Lula e os outros partidos aliados.
A primeira reação formal foi o lançamento da candidatura do deputado Milton Monti (PR-SP), estimulada pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e pelo Bloco de Esquerda, o chamado "bloquinho" - com Monti, somam três os candidatos na Câmara. O outro é o deputado Ciro Nogueira (PP-PI), visto como uma espécie de reedição do ex-deputado Severino Cavalcanti (PP-PI), mas, de fato, um político afinado com os interesses da corporação, o que explica em grande parte sua força, embora integre uma bancada pequena. Há quem defenda o lançamento de Aldo Rebelo, que já presidiu a Casa. Desses mesmos aliados teria vazado a notícia de que Temer é processado pela prática de crime ambiental.
Além do PT, Michel Temer articula o apoio do PSDB e do Democratas, além de investir separadamente nos partidos que integram o "bloquinho". A conversa do deputado com os tucanos vai bem, com a perspectiva de o PSDB ficar com a 1ª vice-presidência (a 1ª secretaria, um dos cargos mais cobiçados, ficaria com o PT). Mas a negociação com o DEM ainda não deslanchou - os demistas ainda analisam a conveniência de se aliar a um projeto que, no fundo, é petista.
Está em jogo, nas eleições do Congresso, a aliança PT-PMDB para a sucessão de 2010, declarada prioritária por Lula. No PT e no Planalto teme-se que desagradar o PMDB agora pode levar a uma instabilidade congressual nos dois últimos anos do governo Lula, além de colocar sob ameaça a aliança eleitoral. Por isso os pemedebistas do Senado acreditam que Lula não fará mais que um "apelo ao consenso", nas conversas previstas para esta semana.
Outros setores da base aliada, no entanto, estão convencidos de que Lula fará um esforço maior em favor da candidatura de Tião Viana no Senado, embora esse não seja o estilo do presidente, mas nada que leve Sarney a se indispor com o governo - o senador pelo Amapá é considerado um aliado certo não só para 2010, como para conduzir o Congresso nesse fim de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Por outro lado, Lula não quer se tornar um refém do PMDB no Congresso e já disporia até de um Plano B para o caso de a candidatura Michel Temer fazer água: José Múcio Monteiro (PTB-PE), o ministro das Relações Institucionais.
Trata-se de uma saída extrema, improvável, mas que pelo simples fato de ser mencionada demonstra como são amplas as alternativas em discussão numa negociação que está apenas se iniciando. E a dificuldade que é a eleição para a Presidência da Câmara, geralmente decidida por margem pequena de votos - na primeira vez que se elegeu para o cargo, Temer ganhou por apenas um voto de diferença.
Bem mais próximo de Lula do que há dois anos, quando apoiou o candidato do Democratas, Michel Temer e seu grupo têm argumentos para levar a Lula: a eleito, o deputado teria condições de trabalhar na reorganização da base de sustentação do governo, assim como Chinaglia fez há dois anos, quando foi fiador - junto com Marco Aurélio Garcia, assessor de assuntos internacionais de Lula - da conquista de três ministérios pelo PMDB da Câmara. O novo presidente da Câmara apoiaria, assim, a indicação de Arlindo Chinaglia para o Ministério da Saúde, cargo também na alça de mira também de Tião Viana.
No Senado, enquanto o concorrente considerado mais forte, José Sarney (PMDB-AP), se diz fora do jogo, seus aliados trabalham nos bastidores. Sarney até preferiria ter um aliado no cargo, mas tem compromissos com a bancada e é o único nome do PMDB que Lula não tem condições de vetar. Depois, os pemedebistas podem até emplacar outro senador. Para eles, não vale nada o argumento de que não têm um grande nome. "Quem era o Garibaldi antes de presidir o Senado"?, pergunta um senador pemedebista.
O único concorrente declarado, que trabalha de sol a sol na busca de votos é Tião Viana. O senador pelo Acre tenta avançar sobre o PSDB, partido que ainda não tomou posição na disputa, já que o DEM, aliado dos tucanos na oposição, pende majoritariamente para José Sarney.
Lula declarou apoio a Viana, em um jantar com senadores do PMDB, mas tanto Sarney quanto o ex-presidente Renan Calheiros o advertiram de que a bancada quer preservar um lugar que considera seu e fora do acordo feito na Câmara entre PT e PMDB. Segundo os pemedebistas, Lula teria sido mal informado pelos petistas sobre o acerto da Câmara. Mas no Palácio do Planalto diz-se que o presidente prefere, mesmo, uma divisão de poderes no Congresso que dê equilíbrio à relação entre os dois partidos aliados.
Viana é o único em campanha aberta, mas sua eleição seria uma solução heterodoxa, já que o PT tem apenas a quarta bancada de senadores (12). Embora Viana tenha bom trânsito na Casa, inclusive na oposição - tem ótimo relacionamento com o governador José Serra, um dos presidenciáveis do PSDB -, sua eleição significaria, para o PMDB, dar de bandeja ao partido de Lula um poder que o PT não conquistou nas urnas.