Título: Acordo modelo é o dos fiscais de renda
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Fonte: Valor Econômico, 17/11/2008, Política, p. A10

Desde sua posse, em janeiro de 2007, o governador de São Paulo, José Serra, enviou à Assembléia Legislativa 45 projetos que estabelecem ganhos para os servidores. Deste total, onze estão em tramitação e 34 já foram votados pelos deputados estaduais. O quadragésimo-sexto deverá chegar aos deputados estaduais amanhã, antecipando para agosto de 2009 a segunda parcela do reajuste dos policiais civis, um dos pontos do acordo que pôs fim à paralisação.

Essa extensa pauta de projetos não impediu que o Estado se mantivesse, até os últimos dados oficiais de agosto, R$ 6 bilhões abaixo do limite prudencial de gastos com o funcionalismo estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso porque nos primeiros oito meses deste ano, as despesas com pessoal cresceram 1,7% acima da inflação, enquanto a arrecadação saltou 13,5%.

Os 46 projetos compõem um conjunto heterogêneo, que envolve a criação de cargos nas universidades e na secretaria de Cultura, aumentos de vencimentos para policiais, funcionários das secretarias de Saúde, Agricultura, Educação e Desenvolvimento, criação de bonificações por desempenho nas secretarias da Fazenda e da Educação, entre outras.

A proposta de maior peso passou quase desapercebida ao ser encaminhada aos deputados no dia 17 de outubro. Um dia antes, um violento confronto entre manifestantes da Polícia Civil e policiais militares no acesso à sede do governo estadual monopolizou as atenções. O projeto cria um plano de cargos e salários para as atividades-meio da máquina estadual, alterando os vencimentos de 135 mil profissionais.

Segundo o líder do governo na Assembléia Legislativa, Barros Munhoz, a proposta implicará em gastos adicionais com pessoal de pelo menos R$ 700 milhões. O projeto segue três estratégias - incorporar algumas gratificações existentes aos salários, simplificar a estrutura de vencimentos e consagrar a avaliação de desempenho como critério para permitir avanços na carreira.

A proposta reduziu 25 classes (conjunto de cargos e funções de mesma natureza) para uma única entre os funcionários com nível elementar de ensino. Baixou as 56 classes de nível intermediário para apenas três e as de nível universitário de 33 classes também para três. Sindicalistas vêem o projeto com desconfiança, sobretudo em razão dos critérios para a avaliação de desempenho. A proposta chegou à Assembléia sem regime de urgência e deve ter tramitação longa. "É um projeto complexo que vai exigir muita negociação", disse Barros Munhoz.

Diante da dificuldade de diálogo do governo com seus empregados, a Assembléia tem servido como mediadora. O exemplo mais recente foi o da paralisação policial. Somente após Serra mandar um pacote de propostas legislativas é que retomou-se o diálogo entre os grevistas e a esfera governamental, tendo os deputados como intermediários.

Os governistas atribuem a intransigência aos sindicalistas, a quem imputam motivação política. "Construir a imagem de um governador algoz do servidor é uma saída possível para desgastar uma candidatura à Presidência da República", opinou o líder do governo na Casa.

O parlamentar apontou como modelo de êxito negociador da Assembléia o projeto que beneficiou os fiscais de renda, aprovado em abril deste ano. O conflito começou no final do ano passado, quando parte da própria base governista tentou aprovar um projeto que aumentava o salário do governador, que é o teto do funcionalismo. Se o salário de Serra crescesse, isto permitiria a recomposição das faixas salariais mais altas dentro da máquina estadual, dentre elas a dos fiscais de renda. Mas os deputados estaduais rejeitaram a proposta.

Depois de quatro meses de negociação, foi aprovado, por unanimidade entre os deputados, um projeto que reestruturou a carreira e instituiu participação nos resultados.

Geralmente as modificações nas propostas feitas pelo Executivo são feitas pelo próprio governo estadual, que manda aditivos aos projetos. "Existem mudanças que são prerrogativas do Executivo, como aumento de cargos e despesas, portanto, a capacidade de acatar emendas é limitada", disse o líder do PSDB na Casa, Samuel Moreira.

A ampla maioria governista na Assembléia, onde Serra conta com o apoio de 71 dos 94 deputados, é outro limitador para as negociações. No projeto que institui a bonificação por resultados na educação, proposta da qual Moreira é relator, a Apeoesp sequer procurou o parlamentar antes que ele apresentasse seu parecer, pela aprovação da matéria. Preferiu apoiar em plenário um substitutivo do líder do PT, Roberto Felício, com escassas possibilidades de aprovação.

Os projetos de Serra que beneficiam o funcionalismo se sucedem a um início de governo marcado por extremo rigor. No seu segundo dia no cargo, Serra baixou um decreto vedando contratações em toda administração direta e indireta, a não ser com a sua anuência pessoal. A recomposição do quadro de funcionários foi sendo feita posteriormente, de maneira gradual. (CF)