Título: Liberdade e mandato na pauta da semana
Autor: Medeiros, Luisa ; Bernardes, Adriana
Fonte: Correio Braziliense, 01/03/2010, Cidades, p. 19

Momentos decisivos para Arruda: nos próximos dias irão a votação, na Câmara e no Supremo, a abertura oficial do processo de impeachment e o mérito do pedido de habeas corpus do governador afastado

Sede da Câmara: são necessários 13 deputados presentes na sessão de amanhã à tarde e sete votos favoráveis para que o processo de impeachment abra oficialmente

Monique Renne/CB/D.A Press Ministro Marco Aurélio: análise ¿da defesa com muito critério¿

Em 72 horas, o governador afastado José Roberto Arruda (sem partido) conquista a liberdade ou amarga mais uma derrota no Superior Tribunal de Justiça (STF). O ministro Marco Aurélio Mello já concluiu o relatório do pedido de habeas corpus e liberou o processo para votação em plenário. Até a tarde de ontem, ele não constava na pauta de julgamentos, mas Mello assegurou que a votação será nesta quinta-feira. E amanhã, os deputados distritais votam o prosseguimento dos pedidos de impeachment contra Arruda. A abertura do processo foi aprovada por unanimidade na sexta-feira pela Comissão Especial, mas precisa ser referendada em plenário.

O ministro Marco Aurélio Mello nem sequer mencionou se os novos argumentos da defesa de Arruda modificaram o seu relatório inicial. ¿Analisei o aditamento da defesa com muito critério, formei a minha convicção e liberei o processo para julgamento.¿

Marco Aurélio, porém, faz mistério sobre o voto. O fato de ele ter negado a liminar que pedia a liberdade do governador afastado, que está preso desde o último dia 11 no Complexo da Polícia Federal, não pode ser interpretado como uma tendência. O ministro fez questão de lembrar que, em vários julgamentos de mérito, já puxou voto contrário ao que tinha dado em caráter liminar, assim como em outros manteve o posicionamento inicial.

O julgamento do habeas corpus ocorreria na última quinta-feira, mas foi adiado a pedido dos advogados do governador afastado que protocoloram petição com fatos novos relacionados à prisão de Arruda. O ministro encaminhou o pedido à Procuradoria-Geral da República (PGR) para elaborar um parecer.

No que depender da PGR, Arruda continuará preso até o fim da investigação das denúncias de suposta rede de pagamento de propina no Distrito Federal. Ainda na sexta-feira, a vice-procuradora-geral da República Deborah Duprat recomendou a manutenção da prisão preventiva do governador afastado. Depois disso, os advogados de Arruda garantiram que ele não volta ao comando do Executivo local caso seja solto pela Suprema Corte. Mas continuam a dizer que o cliente não pretende renunciar.

Quórum

A votação da abertura do processo de impedimento governador afastado está marcada para amanhã à tarde, na Câmara Legislativa. É preciso quórum mínimo de 13 deputados e sete votos favoráveis para aprovar o prosseguimento dos pedidos que podem resultar na perda do mandato e na inelegibilidade de Arruda por oito anos. Caso seja aprovada, a Comissão Especial que analisa os processos terá 48 horas para notificar o governador afastado. A partir de então, ele deverá entregar sua defesa em até 20 dias.

Nos bastidores, comenta-se que há um movimento entre os aliados para convencer o governador afastado a renunciar. Desde que ele foi preso, sua base está esfacelada na Casa ¿ prova disso é que três dos cinco integrantes da Comissão Especial que faziam parte da bancada de apoio de Arruda aprovaram o relatório do petista Chico Leite pela abertura do processo de impeachment. No fim das contas, o desgaste de se manter ao lado de Arruda é, no momento, pouco atrativo para quem busca votos e quer evitar a qualquer custo uma possível intervenção federal no DF.

Impasse

Mas, para que a votação realmente ocorra amanhã, os distritais precisam resolver antes o impasse sobre a convocação dos suplentes. Sete deputados distritais estão impedidos pela Justiça de atuar em qualquer fase do processo de impeachment contra Arruda. Os substitutos foram convocados em janeiro, mas até agora não tomaram posse do cargo.

Além do gasto extra de manter mais sete deputados na Casa, falta consenso sobre em que fase do processo os suplentes deveriam ser convocados. Uma ala defende que a convocação seja imediata. Outra corrente entende que a despesa só vale para o julgamento final de Arruda, quando ¿ para a aprovação do impedimento ¿ serão necessários os votos de, no mínimo,16 deputados.

Pelo menos dois suplentes estão garantidos para assumir logo. Pedro do Ovo (PRP) ocupará a vaga de Wilson Lima (PR) e Raad Massouh (DEM), a de Leonardo Prudente, que renunciou para não ser cassado. Ele não resistiu às imagens em que aparece colocando dinheiro nas meias. O substituto de Júnior Brunelli (PSC) também deve tomar posse, já que a renúnica do mentor da oração da propina é dada como certa. A distrital Eurides Brito, outra das flagradas em vídeo recebendo verba para caixa 2, bate o pé e não dispensa o mandato.

DEU NA ECONOMIST O suposto esquema de pagamento de propina envolvendo o GDF e a base aliada são citados em reportagem da revista britânica The Economist. A matéria afirma que os altos custos das campanhas políticas no Brasil e as regras de financiamentos eleitorais ¿irrealistas¿ são a origem de muitas das denúncias de corrupção. De acordo com a publicação, ¿no Brasil, quando dinheiro, política e escândalos se encontram, há geralmente uma câmera em algum lugar para fazer com que futuras declarações de inocência se esvaziem¿. A revista frisa que, no DF, o ¿filme tem final surpreendente¿, ao mencionar a prisão de Arruda.

Agenda

Hoje O deputado Júnior Brunelli (PSC) ¿ flagrado em vídeo recebendo dinheiro de Durval Barbosa durante a campanha eleitoral de 2006 ¿ deve entregar a carta de renúncia. A Procuradoria da Câmara Legislativa apresenta parecer sobre o prazo que o governador afastado José Roberto Arruda (sem partido) tem para renunciar, evitando a continuidade do processo de impeachment.

Amanhã Os deputados distritais votam, em plenário, se abrem ou não o processo de impeachment contra o governador afastado. A deputada Eurides Brito (PMDB), filmada guardando pacotes de dinheiro na bolsa, deve assinar a notificação de abertura de processo por quebra de decoro parlamentar. A partir daí, passa a contar o prazo para que ela entregue sua defesa.

Quinta-feira O Supremo Tribunal Federal (STF) julga o mérito do pedido de liberdade de Arruda. Ele está preso desde 11 de fevereiro e teve negado o pedido de soltura em caráter liminar. A Procuradoria-Geral da República já emitiu dois pareceres favoráveis à manutenção da prisão de Arruda.

Enquanto isso, na PF

O governador afastado José Roberto Arruda, preso preventivamente desde 11 de fevereiro, recebeu ontem as visitas da mulher, Flávia Arruda, e de um de seus advogados, Tiago Bouza. Nenhum dos dois deu entrevista ao sair do Complexo da Polícia Federal, no Setor Policial Sul, onde Arruda está detido. Os dias do chefe afastado do Executivo seguem sem grandes mudanças na rotina, embora cheguem à portaria da PF diversas pessoas na expectativa de conseguir ir à sala transformada em cárcere. Na tarde de ontem, o procurador Luciano Barreto Bezerra e o aposentado Jurandir Mello passaram alguns minutos na PF, mas não puderam falar com Arruda. Melo, que afirmou ter estudado com o governador licenciado do cargo, levou uma carta de apoio.

Também à tarde, a dentista Alessandra Duarte, 28 anos, procurou a PF para entregar uma caixa com um conteúdo inusitado. Ainda no sábado, ela recebeu em casa uma encomenda da empresa Posthaus, de Blumenau (SC), com quase mil comprovantes de rendimentos pagos e de retenção do Imposto de Renda de funcionários do GDF lotados em Taguatinga, Samambaia e Sobradinho. ¿Não tenho ideia de que documentos são esses e por que chegaram à minha casa. Não sou funcionária pública, meu marido é professor da Secretaria de Educação, mas não existe nada no nome de nenhum de nós dois¿, explicou. A caixa estava acompanhada por uma nota fiscal de R$ 150,63, com data de 14 de julho de 2009. ¿A nota é da única compra que fiz por essa empresa¿, disse.

A dentista tentou deixar os documentos com os policiais federais, mas eles a aconselharam a repassar o material para a Polícia Civil do DF.