Título: Por uma indústria da saúde forte e inovadora
Autor: Temporão , José Gomes
Fonte: Valor Econômico, 19/11/2008, Opinião, p. A10

Antes da Constituição de 1988, apenas 30 milhões de trabalhadores tinham direito aos serviços públicos de saúde. Esse cenário mudou, o SUS está disponível hoje para 190 milhões de pessoas. Embora a política social tenha avançado muito, o parque industrial da saúde brasileiro não acompanhou no mesmo ritmo da demanda, criando um déficit anual de R$ 6 bilhões. A subordinação às importações, principalmente de tecnologia, torna o Sistema Único de Saúde vulnerável no objetivo de garantir o bem-estar da população.

O governo federal tem trabalhado para reverter essa situação. Primeiramente, reforçou a produção de seus nove laboratórios oficiais em atividade. O investimento saltou de R$ 10 milhões em 2002, para R$ 318 milhões entre 2003 e 2007 (cerca de R$ 63,6 milhões anuais). A iniciativa tem objetivo estratégico de desenvolvimento de tecnologia nacional e produção de medicamentos para abastecer a rede pública.

Um dos grandes resultados desse investimento aconteceu recentemente. O Laboratório Farmanguinhos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) entrou com o pedido de registro para a produção do medicamento Efavirenz, utilizado no coquetel contra a Aids. Fruto de uma Parceria Público Privada, contando com as empresas Globequímica (SP), Cristália (SP) e Nortec (RJ), trata-se de um marco histórico para o Programa Nacional de DST/Aids e demonstra a capacidade de o Brasil produzir conhecimento e atender a demanda nacional. Neste mês, o laboratório também solicitou à agência o registro do medicamento Lamivudina + Zidovudina (30+60) mg comprimidos, um anti-retroviral infantil.

Nas parcerias com as empresas privadas, também é necessário mencionar a transferência de tecnologia da GlaxoSmithKline (GSK) para que a Fiocruz possa produzir a vacina contra o rotavírus, processo que foi iniciado no ano passado.

Além dos incentivos à produção, a aplicação de recursos em inovação e pesquisa vem sendo robustos. Em conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia, desde 2007, o Ministério da Saúde está investindo cerca de R$ 500 milhões com o objetivo de produzir conhecimento em saúde nacional. Em sincronia com a estratégia, em parceria com o Ministério da Educação, estamos aplicando R$ 9 milhões na formação de pesquisadores em cursos de pós-doutorado.

Já para a iniciativa privada, incluímos no Programa Mais Saúde - o PAC do setor - um eixo específico para o complexo industrial da saúde, que contará com R$ 5,1 bilhões até 2011, sendo R$ 3 bilhões do BNDES, para viabilizar o plano. Trata-se de uma linha exclusiva de financiamento para o setor produtivo da saúde.

Com o objetivo de remover os gargalos do setor, foram iniciados os trabalhos do Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde (GECIS), que, coordenado pelo Ministério da Saúde, tem a missão de propor novas regras, legais e tributárias, para elevar a competitividade do mercado nacional.

Para viabilizar o aumento da capacidade produtiva, com a garantia de qualidade dos produtos, temos, a nosso favor, o poder de compra do Estado, maximizado pela característica do SUS de ser um sistema universal. Na área de equipamentos, o governo representa quase 50% do mercado, em vacinas, mais de 90%, em medicamentos, cerca de 25%. Nesse aspecto, um dos desdobramentos mais significativos da política para o desenvolvimento do complexo produtivo foi a publicação da portaria interministerial que permite aos laboratórios oficiais buscar na iniciativa privada parceira para a produção de medicamentos.

Por meio de outra portaria, também foram definidas claramente as áreas de interesse de produção e investimento. Com isso, criamos boas perspectivas para a indústria nacional no mercado farmacêutico brasileiro, um dos dez maiores do mundo, com movimento anual de R$ 28 bilhões.

Se o estímulo à competitividade interna do mercado brasileiro de saúde é importante, as parcerias internacionais não podem ser desprezadas. Na missão à Índia, em julho, firmamos acordo de cooperação para a transferência de tecnologia na produção de medicamento antimalárico para aquele país e trouxemos a garantia de um investimento de US$ 50 milhões nas indústrias brasileiras. Já em Washington, em setembro, apresentamos ao CSIS (Center for Strategic and Internacional Studies) - um importante grupo de empresários e de pesquisa - as oportunidades de investimento no setor saúde do Brasil. Estamos vendendo lá fora o que o Brasil tem de competitivo, buscando investimentos e tecnologia para o país. Com Cuba assinamos outro importante acordo de transferência de tecnologia para a produção no Brasil de medicamento para hepatite C, por meio de técnicas que poucos países possuem.

A inserção da saúde como parte da estratégia de desenvolvimento é o reconhecimento de que o setor contribui para a geração de investimentos, inovações, renda, emprego e receitas para o Estado. O fortalecimento do complexo industrial da saúde vai colaborar para a expansão de um novo padrão de desenvolvimento, cada vez mais comprometido com o bem-estar do cidadão.