Título: Indústria quer compensações nas negociações com o México
Autor: Góes , Francisco
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2008, Brasil, p. A5

A tentativa do Brasil de ampliar o comércio com o México, processo impulsionado este mês em reunião bilateral, mostra uma divisão entre governo e parte do setor privado sobre a melhor forma de conduzir a negociação. Setores da indústria, entre os quais alumínio e farmoquímico, querem incluir na discussão compensações a que teriam direito por perdas resultantes do maior acesso que os mexicanos deram aos Estados Unidos e ao Canadá via Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta). O governo brasileiro acha que esse não é o caminho.

Para o setor privado, colocar os pedidos de compensações sobre a mesa significaria uma mudança na estratégia negociadora, dadas as dificuldades encontradas até agora para fazer avançar o acordo com o México. "Setores industriais brasileiros devem se preparar para adotar um plano B capaz de tirar a negociação da inércia e permitir melhor acesso de seus produtos ao mercado mexicano", diz Mauro Laviola, consultor de empresas e diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

Para o governo, insistir nessa linha seria estabelecer um contencioso com os mexicanos, diz o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho. Para ele, o caminho ideal é negociar: mostrar que existe potencial para ampliar o comércio bilateral ainda acanhado, considerando a dimensão das duas economias. Enquanto a corrente de comércio Brasil-Argentina é de US$ 30 bilhões, o fluxo comercial Brasil-México é de US$ 7 bilhões a US$ 8 bilhões, diz Ramalho.

As diferenças entre parte do setor privado e o governo começaram a aparecer na preparação para a 4ª Reunião da Comissão de Monitoramento do Comércio Brasil-México, realizada semana passada, na Cidade do México. Um dos temas em pauta no encontro foi a ampliação do chamado Acordo de Complementação Econômica (ACE 53), que inclui reduções tarifárias entre os dois países para um universo de 800 produtos.

Ramalho disse que o governo mexicano se comprometeu a fazer gestões com o setor privado para incluir mais produtos no ACE 53. "O governo brasileiro tem feito propostas aos mexicanos para ampliar, em termos de produtos, e aprofundar, no tocante às reduções tarifárias, o ACE 53", diz Ramalho. Ele reconheceu, porém, que a percepção é de que continuam a existir, no México, resistências à ampliação do acordo.

O consultor Mauro Laviola diz que vários setores da indústria no Brasil poderiam exportar mais para o México se houvesse isonomia de tratamento em relação aos Estados Unidos e Canadá. Segundo ele, a indústria de farmoquímicos (que produz princípios ativos para medicamentos) e a de alumínio fizeram estudos que indicam perdas de comércio no mercado mexicano como resultado das reduções tarifárias concedidas a americanos e canadenses. Esses setores solicitaram ao governo que apresentasse os estudos aos mexicanos.

"O que se sente, no entanto, é que o Brasil está submisso aos interesses do México e, simultaneamente, não dá guarida aos interesses do setor privado que tem créditos (com o México) amparados em arcabouço legal", criticou Laviola. Ele se refere ao Protocolo Interpretativo do artigo 44 do Tratado de Montevidéu 1980, firmado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). Para a indústria, a interpretação do tratado prevê a abertura de negociações bilaterais para discutir compensações equivalentes à perda de comércio como resultado de reduções tarifárias concedidas em outros acordos comerciais.

As negociações devem ser solicitadas de maneira fundamentada pelo país que se sinta afetado. Segundo Laviola, há antecedentes de compensações dadas pelo México ao Chile e à Argentina. Onésimo Pereira, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica (Abiquif), disse que o estudo sobre compensações com base no Tratado Montevidéu 80 foi aprovado pela entidade e enviado ao governo.

Rodney de Oliveira, coordenador da comissão de comércio exterior da Associação Brasileira do Alumínio (Abal), também disse que a entidade pleiteou ao governo compensações nas negociações com os mexicanos com base no Tratado de Montevidéu. "Acreditamos que é uma alternativa para reiniciar as negociações em velocidade maior", disse Oliveira. Os fabricantes brasileiros de alumínio têm interesse não só no mercado mexicano, mas em usar o México como plataforma para acessar os Estados Unidos.

Mauro Laviola, que atua como consultor da Abal, disse que na média 2003-2007 os Estados Unidos exportaram 1.260 vezes mais chapas de duralumínio do que o Brasil para o mercado mexicano. No caso da farmoquímica, os americanos exportaram, no mesmo período, 461 vezes mais heparina, substância anticoagulante, para o México do que o Brasil. Enquanto o produto americano entrou no México com tarifa zero, os fabricantes brasileiros pagaram 8%.