Título: Dados sobre emprego são sinal de alerta sobre crise
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2008, Opinião, p. A10
O estrangulamento do crédito bancário, resultado direto da crise financeira global, já começou a fazer vítimas no mercado de trabalho brasileiro. E as perspectivas são de uma piora considerável nesse cenário em 2009.
Ao divulgar, na semana passada, os dados mais recentes referentes à criação de empregos com carteira assinada, o Ministério do Trabalho mostrou que a indústria de transformação registrou no mês passado o pior desempenho dos últimos dez anos, pelo menos, para os meses de outubro. O saldo entre admissões e demissões resultou em apenas 8.730 novos postos de trabalho, o menor para este período desde 1999, último ano com dados disponíveis no site do Ministério do Trabalho. O resultado - pior do que o registrado em anos de fraco crescimento - é o primeiro indicador que sinaliza o tamanho da precaução que tomou conta do setor industrial diante da crise econômica. Como resultado da parada na indústria, quatro setores encerraram o mês com corte efetivo de vagas formais: calçados, o complexo que reúne borracha, fumo e couros, e material de transporte e mecânica, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Em outubro do ano passado, num ambiente macroeconômico completamente diferente, a indústria tinha criado pouco mais de 60 mil empregos formais.
Houve, na verdade, forte desaceleração na criação de empregos com carteira assinada em toda a economia. O saldo entre contratações e demissões foi de apenas 61.401 postos. Esse volume de novas vagas foi 70% menor que o do mesmo mês de 2007. No acumulado de janeiro a outubro o saldo é de 2,147 milhões de empregos, que representam um crescimento de 18,52% sobre o total de vagas abertas no mesmo período no ano passado. Antes deste outubro, o ano com menor número de novas vagas abertas nesta época do ano foi 2002, com 36 mil empregos novos - 16 mil deles na indústria.
Mantida essa tendência, e não há razões fortes o suficiente para interromper o ciclo de desaceleração do emprego, a crise vai se aprofundar. Em entrevista ao jornal "Folha de S. Paulo" de domingo, o presidente das Lojas Renner, José Galló, foi bastante enfático ao dizer que sua empresa já sente uma redução nas vendas e previu que o consumo deve se retrair ainda mais no começo de 2009. Para ele, uma melhoria no varejo só virá no segundo semestre de 2010. "A crise já chegou ao consumidor brasileiro", disse. Para ele, os primeiros afetados foram pessoas das classes A e B, com relação mais direta com o mercado financeiro. Os próximos a sentir a força da crise serão os consumidores das classes D e E, através do desemprego, que Galló espera que ganhe força em fevereiro de 2009.
Até agora, de forma geral, o comércio não começou a dispensar seus funcionários - o que seria altamente dramático porque os meses de novembro e dezembro são os melhores em termos de faturamento para o setor varejista dado o aumento do consumo por conta das festas de fim de ano. Segundo o Ministério do Trabalho, no que se refere ao emprego, o comércio foi o setor mais dinâmico de outubro, quando criou 54.590 vagas - número um pouco inferior às 63 mil vagas abertas no segmento no mesmo mês do ano passado. Em seguida estão as empresas de serviços, com saldo de 36.142 postos, destacando-se as atividades de transportes e comunicações, administração de imóveis, alojamento e alimentação. A agricultura, por motivos típicos da época, perdeu, em outubro, 38.442 empregos com carteira assinada. O fenômeno está relacionado à entressafra na região Centro-Sul.
A reação governamental aos dados sobre desaceleração na criação de empregos foi olhar para o passado. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que com a desaceleração da atividade econômica, que também ocorre no Brasil, é "natural" que o país deixe de gerar mais de 200 mil empregos por mês e passe a um patamar menor, mas preferiu ressaltar que em 2008 será batido o recorde do Caged, ultrapassando-se a marca dos dois milhões de empregos. "O importante é continuar criando novos empregos, ao contrário do que acontece nos países avançados", afirmou. O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, comparou as situações no Brasil e nos Estados Unidos. Entre janeiro e outubro deste ano, 1,2 milhão de americanos perderam seus empregos.